SÃO PAULO (Reuters) - O governo Lula reforçou nesta segunda-feira que quer um papel mais ativo do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para acelerar a economia, por meio da concessão de empréstimos mais baratos para pequenas e médias empresas.
Na cerimônia de posse do novo presidente do banco de fomento, Aloizio Mercadante, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que a instituição "pode contribuir para a queda da taxa de juros".
Os comentários, entrecortados por renovadas críticas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Banco Central --que na semana passada manteve a taxa básica em 13,75%, maior nível em seis anos-- remonta à atuação do BNDES e outros bancos estatais até cerca de uma década atrás, de pulverizar crédito farto e barato como antídoto para os efeitos recessivos de crises econômicas.
Segundo executivos do mercado, em que pese os arrepios que esse discurso causem na indústria bancária devido às lembranças de práticas durante governos do PT, quando os bancos federais foram turbinados com recursos do Tesouro Nacional para tentar forçar a queda dos juros bancários, algumas lições foram aprendidas e o espaço para repetir a mesma cartilha é limitado.
Uma das limitações, segundo o economista Marcelo Allain, do Boston Consulting, é a própria estrutura do BNDES, que não tem uma rede de agências e teria que atuar em parceria com bancos comerciais. Apesar de nos últimos anos já ter ampliado seu foco em PMEs, elas ainda representavam pouco mais de um quinto dos empréstimos concedidos pelo banco no terceiro trimestre de 2022.
Além disso, o banco tem um modo de atuar que prioriza crédito para quem pode oferecer garantias, o que limita bastante o público que pode ser alcançado. Para ter atuação mais ampla, o BNDES precisaria abrir mão de exigir garantias.
"Mas se fizer isso, aí que o crédito não sai mesmo, porque os funcionários poderão ter que responder ao TCU (Tribunal de Contas da União)", disse Allain. "A solução seguinte seria o Tesouro Nacional entrar com a garantia, mas aí teria um impacto fiscal e o governo não deveria fazer isso agora".
Segundo um executivo financeiro, que foi vice-presidente do Banco do Brasil (BVMF:BBAS3), o banco de fomento até tem uma condição de capital mais confortável para acelerar o crédito do que anos atrás, em parte devido ao foco das gestões mais recentes em devolver empréstimos do Tesouro.
Na década compreendida entre 2004 e 2013, entre os governos Lula (2003-10) e Dilma (2011-16), o volume anual de empréstimos concedidos pelo BNDES cresceu cinco vezes, chegando no pico a quase 200 bilhões de reais. Desde então, esse montante veio caindo até se estabilizar na casa dos 63 bilhões por ano.
Com isso, o índice de Basileia, que mede quanto um banco pode se alavancar, estava em setembro 36%, o triplo do mínimo regulatório determinado pelo Banco Central.
Porém, a pressão por empréstimo mais barato vem num momento delicado, com recorde de mais de 6 milhões de empresas com dívidas atrasadas, segundo dados da Serasa Experian (LON:EXPN), cenário que costuma levar os bancos a endurecer na concessão de crédito, o contrário do que Lula está pedindo ao BNDES.
Para o consultor Roberto Luis Troster, ex-economista-chefe da Febraban, o caminho mais acertado para baixar os empréstimos deveria ser sistêmico, com mudanças que permitissem que os bancos privados também participassem, não apenas os estatais.
"Mas isso demanda mudanças mais profundas, que levam mais tempo", disse ele.
Mais tempo parece ser justamente o que o governo não parece disposto a negociar, uma vez que as projeções do mercado são de aumento de apenas 0,8% do PIB brasileiro neste ano e de 1,5% para 2024, segundo o boletim Focus desta segunda-feira.
"Nunca o tempo esteve tão forte contra o governo como agora", disse o ex-executivo do BB, sob condição de anonimato, acrescentando que o governo entende que precisa agir rápido para tentar acelerar a economia. "É uma retórica bem planejada."
Consultadas, a Febraban e a ABBC, entidades que representam o setor bancário no país, não responderam a um pedido de comentário da Reuters.
(Por Aluísio Alves. Edição de Flávia Marreiro)