A Câmara dos Deputados aprovou nesta semana projetos da minirreforma eleitoral. Apesar de ter nome de “mini”, a reforma é ampla e flexibiliza uma série de regras, como o uso do Fundo Eleitoral, a prestação de contas e a cota feminina de 30%.
Especialistas ouvidos pelo Poder360 divergem sobre o texto aprovado pelos deputados. Enquanto há quem critique o projeto e fale em retrocessos, há também quem defenda e diga que o projeto corrige “excessos” da legislação. Deputados dizem que o principal objetivo do texto é reduzir o número de partidos, além de deixar mais clara a lei.
Paulo Henrique Golambiuk, presidente do Instituto Paranaense de Direito Eleitoral, afirmou ao Poder360 que a mudança “mais radical” na sua avaliação foi a alteração da lei da Ficha Limpa no caso da inelegibilidade.
“A mudança mais significativa que percebo da reforma é a unificação do prazo de inelegibilidade, nos casos criminais e nos casos de improbidade administrativa. Hoje você tem o prazo de inelegibilidade contado a partir do cumprimento da pena. Se o pretenso candidato já tem uma decisão colegiada, em 2º grau, ele já fica inelegível nesse período”, declarou.
A lei atual determina o prazo de inelegibilidade nos 8 anos subsequentes ao término do mandato para o qual tenham sido eleitos. A proposta aprovada determina que a contagem do prazo de 8 anos de inelegibilidade seja a partir da data da decisão que decretar a perda do cargo eletivo. Ou seja, não será mais possível um político ficar inelegível por mais de 8 anos.
“Toda a mudança que eles estão fazendo na lei da Ficha Limpa vai no sentido de tentar unificar e padronizar para que elas contém efetivamente 8 anos e não mais”, argumentou Golambiuk.
Outro ponto de preocupação do presidente do Instituto Paranaense de Direito Eleitoral é a liberação de propaganda casada de candidatos de diferentes partidos. Ou seja, que candidatos até opositores possam fazer publicidade juntos.
“Qualquer propaganda, E mais, o texto diz que somente o candidato que pagou precisa prestar conta disso”, afirmou o especialista.
Para o cientista político, advogado e presidente da ONG (Organização Não-Governamental) Transparência Partidária, Marcelo Issa, o único trecho positivo é o que trata sobre a violência política de gênero.
O projeto aprovado amplia o rol de vítimas da violência política contra a mulher pré-candidata e qualquer mulher que sofra esse tipo de violência em razão de atividade política, partidária ou eleitoral.
Issa afirmou ao Poder360 que houve um“retrocesso” em relação à prestação de contas. “Eu vejo um ponto positivo referente a violência política de gênero. Mas o restante todo traz uma série de retrocessos em relação à prestação de contas”, disse.
Ele citou como exemplo o caso da prestação de contas parciais, que hoje vigora, e com o novo projeto deixará de existir. Além disso, a falta de prestação de contas implicará só na suspensão de novas cotas do Fundo Partidário, até que sejam regularizadas. Todo o montante recebido fica mantido com o partido e pode ser movimentado. “Pode receber recursos [sem ser do Fundo], utilizar de modo irregular e não ser obrigado a ressarcir”, argumentou Issa.
O cientista político falou ainda que simplificar é diferente de desregulamentar. Durante a discussão do projeto, diferentes congressistas falaram em simplificação da legislação.
“Uma desregulamentação em que você vai produzir mais confusão e complexidade do que simplificação.Como por exemplo no caso da permissão para que se realize campanha cruzadas sem praticamente nenhum critério”, disse se referindo a propaganda casada de candidatos de diferentes partidos.
O especialista fez uma análise crítica sobre o texto, citando outros pontos, entre eles a flexibilização da cota de gênero na legislação. Pela lei atual, cada partido ou coligação deve preencher o mínimo de 30% para candidaturas femininas.
Na proposta aprovada a cota de candidaturas femininas, no caso das federações partidárias, o percentual mínimo de candidaturas será “aferido globalmente na lista da federação, e não em cada partido integrante”.
Já para o advogado e membro da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político, Ludgero Liberato, a reforma serve “para corrigir excessos”.
“Nem tudo tem que ser visto apenas com preocupação. Grande parte da reforma ainda pode ser chamada de mini que, embora atinja muitos institutos, não mexe em tantas coisas. São muitas questões pontuais e muitas das questões pontuais merecem merecem elogios”, afirmou ao Poder360.
Liberato citou como exemplo a flexibilização na apresentação de documentos, que agora dispensa os produzidos a partir de informações detidas por órgãos do Poder Judiciário. Também falou em evolução da legislação em relação aos gastos da pré-campanha. O projeto estabelece diretrizes para declarar o gasto.
O membro da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político concorda com a afirmação de que a reforma atinge seu principal objetivo de, ao longo dos próximos anos, diminuir o número de partidos no Brasil.
“De modo geral, ela é muito mais uma reforma para corrigir excessos de reformas anteriores e para estimular a diminuição do número de partidos do que para causar um tumulto geral, uma imunidade, como foi alardeado”, declarou.
Apesar de defender o texto aprovado, Liberado reconhece que há pontos de preocupação. Um deles é a proibição da penhora do Fundo Eleitoral e Partidário.
O projeto aprovado pelos depuatados proíbe a penhora e bloqueio de recursos oriundos do Fundo Partidário e do Fundo Eleitoral para o cumprimento de obrigações civis, trabalhistas, penais, tributárias ou de outra natureza. A ressalva é se algo ilegítimo for constatado pela Justiça Eleitoral.
“A maior parte dos partidos políticos a renda que eles possuem é renda proveniente desses Fundos. É quase admitir que ele pode contrair gaStos e não ser obrigado a pagar ninguém”, argumentou o advogado.
São 2 projetos aprovados pelos deputados: um de lei ordinária e um de lei complementar. O projeto de lei (PL 4438 de 2023) que trata das mudanças gerais da reforma foi aprovado na 4ª feira (13.set.2023) por 367 votos favoráveis, 86 contrários e uma abstenção.
Já o projeto de lei complementar (PLP 192 de 2023) sobre as regras relacionadas ao prazo inelegibilidade foi aprovado nesta 5ª feira (14.set) por 345 votos favoráveis, 45 contrários e uma abstenção.
Os projetos foram elaborados no grupo de trabalho presidido pela deputada Dani Cunha (União Brasil-RJ), filha do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha. Além dela, outros 6 deputados estavam no grupo:
- Rubens Pereira Jr. (PT-MA), relator;
- Pedro Campos (PSB-PE);
- Antonio Carlos Rodrigues (PL-SP);
- Antonio Brito (PSD-BA);
- Thiago de Joaldo (PP-SE);
- Renildo Calheiros (PC do B-PE).
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Para valer nas eleições de 2024, as mudanças precisam ser votadas no Congresso e depois sancionadas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) até 6 de outubro.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), sugeriu durante a semana que a minirreforma eleitoral não deve ser votada na Casa Alta em duas semanas.
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