Brasília - O presidente que for eleito no dia 30 assumirá o cargo em janeiro de 2023 com um poder menor do que todos os ocupantes anteriores do Palácio do Planalto. Pela primeira vez, o chefe do Executivo iniciará o mandato sem controlar 40% dos recursos federais destinados a investimentos, que ficarão nas mãos do Congresso por meio de emendas parlamentares.
É uma situação inédita de presidencialismo reduzido. Quando assumiu o mandato, em 2019, o presidente Jair Bolsonaro tinha o poder de manejar 80% dos investimentos. Acuado pelo Centrão, porém, ele entregou a atribuição ao Congresso, por intermédio do orçamento secreto. E a partir do ano que vem esse porcentual cairá para 60%, qualquer que seja o vitorioso no segundo turno.
A cúpula do Legislativo se articula para blindar esse mecanismo, caso o candidato do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, vença as eleições. Embora o governo tenha saído das urnas com uma base maior na Câmara e no Senado, Bolsonaro não deu demonstrações de que pretende impor limites ao orçamento secreto. A prática foi revelada pelo Estadão/Broadcast em uma série de reportagens.
Lula já disse que, se chegar novamente ao Planalto, acabará com esse modelo. Em novembro do ano passado, no entanto, o senador Rogério Carvalho (PT-SE) contrariou a bancada e deu o voto decisivo para aprovar um projeto do Congresso que estipulou regras de execução das emendas de relator, a base do orçamento secreto. À época, a posição de Carvalho foi classificada como "fato grave" pela Executiva do PT. Mesmo assim, sete de 63 parlamentares da sigla, entre deputados e senadores, informaram ao Supremo Tribunal Federal ter recebido essas verbas.
O destino do orçamento no próximo governo dependerá agora da presidente do STF, Rosa Weber. A ministra relata um processo que pode acabar com o orçamento secreto, barrando qualquer liberação de verbas. O julgamento deve ocorrer logo após as eleições. É o Congresso atual, e não o próximo, que votará o Orçamento de 2023.
Uma decisão do STF contra o dispositivo que tem sustentado relações de toma-lá, dá-cá tem potencial de desencadear uma nova crise política. Líderes de partidos ameaçam até mesmo cortar verbas do Supremo e deixar juízes sem o reajuste salarial proposto pelo Judiciário.
Movimentação
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), já começou a abordar parlamentares eleitos para oferecer emendas em troca do apoio à sua reeleição no cargo. "No mundo todo o orçamento é uma peça congressual. O presidente eleito vai ter de conversar com quem aprova o Orçamento. O Brasil não é uma ditadura", disse o presidente da Comissão Mista de Orçamento, Celso Sabino (União-PA), aliado de Lira. "Se o Supremo agir, essa atuação precisa ser bem justificada."
No Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) também tenta preservar a ingerência do Congresso sobre o Orçamento. Candidato a novo mandato à frente da Casa, Pacheco defende o alinhamento das emendas a programas do governo ou até mesmo a redução do seu valor, desde que seja mantida a prerrogativa dos parlamentares para definir o destino dos recursos. No atual sistema, o dinheiro não é investido em políticas públicas, mas despejado em ações sem critérios técnicos, na maioria das vezes em redutos de aliados do governo, deixando de atender ações para municípios mais necessitados.
Poder
A avaliação no Planalto é a de que, se conquistar novo mandato, Bolsonaro manterá o poder da distribuição de verbas com o Congresso. "Vamos ter agora um presidente muito mais forte politicamente, com total identificação com dois terços do Congresso", afirmou nesta segunda-feira, 10, em entrevista à Rádio Bandeirantes o ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, ao mostrar confiança na reeleição de Bolsonaro. "Ele não vai precisar fazer acordos para conquistar essa base de apoio, como no passado."
Relator do Orçamento de 2023, o senador Marcelo Castro (MDB-PI), apoiador de Lula, disse que o Congresso não abrirá mão do que já conquistou. Assim como outros aliados do ex-presidente, porém, ele argumentou ser possível propor um período de transição para o Executivo retomar o controle das verbas.
"Pode ficar uma parte no Parlamento e voltar outra parte para o Executivo. Isso é negociável. Não podemos ignorar que 594 cabeças enxergam melhor o Brasil que uma só", avaliou o deputado Marcelo Ramos (PSD-AM), que não foi reeleito este ano, ao propor o rateio das verbas e a divisão do poder no Orçamento.
Diante do domínio do Centrão no Congresso, integrantes do PT observaram que só a ministra Rosa Weber pode acabar com o orçamento secreto. Essa decisão implica devolver o controle das verbas para o governo, que, tradicionalmente, tem o papel de planejar os programas federais e destinar os recursos dos impostos pagos pelo cidadão.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.