A estreia vitoriosa de Tarcísio de Freitas (Republicanos) nas urnas lhe dará o comando do Estado mais rico do Brasil e, por isso, também um dos mais desiguais e carentes por uma oferta ampliada de serviços públicos de qualidade. Mas, além dos desafios diários de governar para mais de 45 milhões de habitantes, o ex-ministro de infraestrutura terá de decidir se mantém-se fiel ao perfil moderado apresentado aos eleitores ou se assume o bolsonarismo diante da vitória nacional do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Apesar de respaldado também por partidos que não compuseram a base oficial do presidente Jair Bolsonaro (PL) ao longo dos últimos quatro anos, como o PSDB e o PSD, Tarcísio vai ter de ser mais político do que técnico na montagem de seu governo. As pressões já começaram antes mesmo de as urnas serem fechadas, com indicados para manter sua influência ou avançar sobre novas pastas.
Para o cientista político Marco Antonio Carvalho Teixeira, da FGV-SP, o primeiro desafio do ex-ministro é mesmo o político. Carioca, Tarcísio não tem base no Estado e deve delegar a articulação para aliados como o PL, de Valdemar da Costa Neto, além de depender de interlocutores para pautar sua agenda. "O arranjo de governabilidade vai ser crucial. E ele vai precisar aprender fazendo, já que nunca ocupou um cargo político no sentido estrito", aponta Teixeira.
Sem quadros próprios, Tarcísio repetiu ao longo da campanha que iria montar um secretariado técnico, especialmente em áreas que considera sensíveis e nas quais tem mais familiaridade, como Transporte e Logística e Habitação. Além de nomes como de Guilherme Afif, ex-governador de São Paulo que foi assessor especial do ministro da Economia, Paulo Guedes; do médico Eleuses Paiva, que deve assumir a secretaria da Saúde; e de Rafael Benini, que atuou na Agência de Transporte do Estado de São Paulo; Tarcísio já indicou que a diretora executiva do Banco Interamericano de Desenvolvimento, Martha Seillier, pode assumir uma das pastas da área.
O Estadão apurou que o economista Samuel Kinoshita, a engenheira Priscilla Perdicaris e o administrador Marcelo Branco, ligado a Gilberto Kassab, são outros nomes considerados para compor o governo. Após receber o apoio do governador Rodrigo Garcia (PSDB), os tucanos também esperam espaço na máquina que comandaram por quase três décadas.
TRANSIÇÃO
A transição de um governo para o outro vai exigir posicionamentos do novo governador em pautas encampadas por apoiadores do presidente Jair Bolsonaro que Tarcísio recuou ao longo da campanha, como o uso de câmeras corporais, a privatização da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp (BVMF:SBSP3)) e a vacinação de servidores públicos.
Com sua vitória em São Paulo e a derrota de Bolsonaro na disputa nacional, o ex-ministro passa a ser o principal representante do bolsonarismo na chefia de uma estrutura do poder Executivo. O ponto-chave do início de seu governo, apontam especialistas, se baseia na capacidade política de Tarcísio de evitar que o Estado se torne uma ilha bolsonarista.
O cientista político do movimento Voto Consciente, Bruno Silva, argumenta que a aliança com Garcia no segundo turno pode ser fundamental para ocupar o campo que era dos tucanos no Estado.
"Tarcísio é uma liderança que se constituiu no Estado caminhando na rabeira de Bolsonaro, tanto é que nacionalizou (a disputa na campanha). Se fizer uma leitura política mais apurada do que está em suas mãos, pode tentar construir uma base e ocupar um campo que era dos tucanos", afirmou Silva.
O ex-ministro já disse que vai dar continuidade a algumas políticas no Estado, sem intenção de fazer uma "destucanização" na máquina, mas quer promover uma "aceleração" em outras áreas.
Silva cita que as políticas educacionais podem ficar à prova neste contexto. A base evangélica que o apoiou na campanha, e que sustenta o Republicanos, por exemplo, pode criar pressões para pautar temas dentro das escolas ou mesmo pleitear um aumento das escolas cívico-militares.
Teixeira também vê como um desafio para o novo governador conciliar a influência da Igreja Universal com os desafios do governo por área. "Quando você é governo, precisa equilibrar o técnico e o político. Temos um outro problema que tem a ver com esse arranjo do entorno dele, que defende o armamentismo, venda de armas. Vai vir muita coisa nesse segmento."
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.