Por Bernardo Caram e Marcela Ayres
BRASÍLIA (Reuters) - Em articulação para colocar o primeiro brasileiro na presidência do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) desde sua fundação, o governo Jair Bolsonaro (PL) pode enfrentar, além de um cenário geopolítico espinhoso, resistências domésticas no caso de eventual eleição de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que aparece à frente na corrida para o segundo turno.
A equipe de Bolsonaro já iniciou conversas informais com outros países para angariar apoio, tendo como principal cotado o ex-presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn, hoje responsável pelo hemisfério ocidental no Fundo Monetário Internacional (FMI). A indicação, segundo uma fonte do governo, deve ser formalizada nos próximos dias.
Mas dois conselheiros próximos a Lula disseram à Reuters preferir que as eleições para o banco, que investe em projetos na América Latina e o Caribe, ocorram apenas no ano que vem, de modo que a eventual indicação brasileira e a participação do Brasil no processo como um todo possa refletir escolhas de um governo recém-eleito. A votação está atualmente prevista para o dia 20 de novembro.
Uma terceira fonte do PT, ouvida em condição de anonimato, pontuou que o nome de Goldfajn não seria a escolha do governo Lula, com conversas preliminares no entorno do ex-presidente favorecendo a candidatura do economista André Lara Resende, um dos integrantes da equipe econômica que implementou o Plano Real e que declarou seu voto a Lula já no primeiro turno.
Ex-ministro da Fazenda dos governos petistas, Guido Mantega avaliou que as chances de Bolsonaro emplacar um presidente do BID no atual cenário seriam muito baixas, ressaltando que o governo brasileiro não conseguiu apoio para comandar o banco nem mesmo quando Donald Trump, aliado próximo de Bolsonaro, presidia os Estados Unidos.
Trump indicou para o cargo, em 2020, Maurice Claver-Carone, que acabou eleito, quebrando tradição seguida desde a criação do BID de ter um latino-americano no comando da instituição, com os EUA nomeando o número dois.
Uma vitória do ex-presidente Lula nas urnas tornaria o cenário ainda mais adverso para a indicação do atual governo, num momento em que mais países da região estão alinhados à esquerda, o que pode gerar resistências a um nome apresentado por Bolsonaro.
“Se o presidente Lula ganhar a eleição, ele poderá fazer uma pressão junto ao governo americano para postergar essa eleição, já apresentando um outro candidato brasileiro”, disse Mantega, ponderando se tratar de uma avaliação pessoal.
Para o ex-ministro, uma articulação entre Estados Unidos, Brasil e Argentina, que têm juntos 52,7% do capital social e do poder de voto no BID, facilitaria a definição do nome. Para ser eleito, o candidato precisa obter a maioria dos votos proporcionais ao capital social do banco, mas também a maioria entre votos individuais dos governadores de cada país.
Ao argumentar que uma definição de nome pelo PT dependeria de Lula, Mantega disse que Ilan provavelmente não seria o escolhido, embora seja um profissional de alto nível. Para ele, Lara Resende teria mais perfil para o posto.
“O Ilan é um banqueiro central, o Lara Resende já foi presidente do BNDES (no governo Fernando Henrique Cardoso). Administrar um banco central é diferente de administrar um banco de desenvolvimento, um está com o pé no freio, o outro com o pé no acelerador.”
Celso Amorim, ex-ministro das Relações Exteriores e da Defesa das gestões do PT, também avaliou que seria natural que a definição no BID fosse postergada para que um governo brasileiro legitimado pelas urnas participasse do processo --indicando um candidato ou apoiando algum dos postulados.
"O BID tinha que refletir" e postergar a escolha que ocorre em meio à eleição em dos países chave do organismo, diz ele, frisando tratar-se de “uma opinião pessoal, estritamente”. "Sublinha trinta vezes ´pessoal´".
"O Brasil deveria poder opinar, mas opinar com um governo que tenha sido legitimado pelas urnas, qualquer um deles", diz Amorim, argumentando que a eleição para o posto é um elemento fundamental para os quatro próximos anos.
"Se os EUA querem ter uma boa relação com a América Latina, o BID é um instrumento absolutamente fundamental para ajudar, inclusive, a financiar questões de meio ambiente", comentou ainda.
O BID irá eleger seu próximo presidente depois que Claver-Carone foi destituído do cargo após um escândalo envolvendo investigação sobre um relacionamento dele com uma subordinada. Cada país membro, através de seu governador, tem direito a uma nomeação, que pode ser substituída ou retirada até o dia 11 de novembro.
Isso significa que o ministro da Economia, Paulo Guedes, que é o governador do Brasil no órgão, seguirá com a prerrogativa de fazer a indicação independentemente do resultado das eleições brasileiras.
Em defesa da nomeação, uma fonte da pasta afirmou que o governo trabalha para apresentar um nome acima de qualquer espectro ideológico partidário.
“Não estamos buscando um nome que politize a instituição. Pelo contrário, indicaremos um nome técnico, de reputação inquestionável, com larga experiência no setor público e privado”, disse.
O México já anunciou que também pretende apresentar uma candidatura para o BID, de Alicia Barcena, ex-executiva da Comissão Econômica da ONU para a América Latina (Cepal).
(Reportagem adicional de Brad Haynes e Flavia Marreiro; Edição de Isabel Versiani)