Por Cesar Bianconi e Asher Levine
SÃO PAULO (Reuters) - A Kroton Educacional (SA:KROT3) espera atravessar o cenário macroeconômico adverso no Brasil relativamente ilesa, devido à demanda por ensino e diante de uma percepção de que o risco regulatório do setor no Brasil é bem menor do que meses atrás.
Em entrevista à Reuters, o presidente da maior empresa de educação privada do mundo, Rodrigo Galindo, afirmou que as regras anunciadas para o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) para o segundo semestre "dão muito mais sustentabilidade para o programa".
"O risco regulatório hoje é bem menor do que era quatro meses atrás, até porque o processo de comunicação (com o Ministério da Educação) está bem mais saudável", disse Galindo.
"Gostamos muito da postura do ministério de já indicar a quantidade de vagas (do Fies) para 2016, entre 310 mil e 350 mil. Mostra que, mesmo num cenário de ajuste fiscal, o programa é estratégico para o país e será mantido num porte bastante razoável."
Mudanças nas regras do Fies ampliando o controle e restringindo o acesso pegaram de surpresa as instituições privadas de ensino superior em dezembro, derrubando as ações de empresas do setor na Bovespa. Em 2014, quase 40 por cento dos alunos matriculados em cursos de graduação não gratuitos no Brasil foram financiados pelo Fies, indicando a relevância do programa para o setor.
"Passada a tormenta, se olharmos o que aconteceu, saímos de um cenário de 700 mil vagas no ano passado para 310 mil vagas neste ano, simples assim. O programa foi reduzido pela metade. É importante? Claro que é importante, mas não ao ponto de causar essa movimentação no preço da ação tão robusta", disse.
As ações da Kroton caíram quase 25 por cento no ano até o fechamento de 29 de junho, enquanto o Ibovespa teve alta de 6 por cento no período.
Mais do que a desvalorização, a volatilidade das ações foi alta: em cerca de 20 pregões até aqui em 2015, a variação diária de preço da empresa na bolsa superou 5 por cento para cima ou para baixo.
O executivo avalia que levará tempo para o mercado ter a percepção de que o Fies está mais estável, "que as regras e o marco regulatório não vão sofrer novas mudanças".
No caso da Kroton, Galindo disse que a empresa está estruturada para operar com as novas dimensões do Fies, após ter cortado custos e definido investimentos prioritários.
A previsão da companhia em maio era atingir um Ebitda (sigla em inglês para lucro antes de juros, impostos, amortização e depreciação) de 1,93 bilhão de reais em 2015, avanço de 33 por cento sobre 2014, antes de considerar novos contratos de Fies para o segundo semestre.
As 61,5 mil vagas da edição do Fies para a segunda metade do ano, anunciadas pelo governo na sexta-feira, não são suficientes para que a meta de Ebitda da Kroton seja revista para cima, mas podem trazer um "'upside' pequeno", de acordo com Galindo.
RESILIÊNCIA
O presidente da Kroton disse que o grupo ainda não sentiu nos negócios os efeitos do aumento do desemprego, que avançou a 6,7 por cento no Brasil em maio, maior nível em quase cinco anos, em mais um sinal dos efeitos da fragilidade econômica.
"Apesar de sermos cíclicos, somos uma indústria muito mais resiliente a intempéries macroeconômicas... Em educação, o processo é mais lento e acontece com menos intensidade.", disse.
"O que nos preocupa é a tendência: se o desemprego vai se estabilizar, se vai crescer muito até o ano que vem. Analistas entendem que ainda vai ter um crescimento do desemprego até 2016 e depois começa a cair. Talvez esse seja o tempo que a gente tenha de resiliência da nossa indústria, então a gente não deve sofrer tanto."
Ainda conforme Galindo, o Brasil ainda tem uma carência "enorme de formação de mão de obra". "Esse gap não vai deixar de existir por conta da questão macroeconômica", disse.
CRESCIMENTO
Apesar de ter reduzido os investimentos em 2015 de 9 por cento da receita líquida para 7,5 por cento, Galindo afirmou que os planos estratégicos de longo prazo não foram afetados.
O projeto de implantar 100 novos campi em cinco anos, expandindo a base de unidades em cerca de 70 por cento, está mantido, bem como o projeto de credenciamento de 448 novos polos de ensino à distância, alta de 62 por cento ante o número atual.
O plano elaborado no ano passado considera prioritárias as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, as mesmas escolhidas pelo Ministério de Educação como principais destinos das vagas do Fies no segundo semestre.
Em outra frente, a Kroton tem em trâmite pedidos de aval para 800 novos cursos nas unidades existentes, 60 por cento deles nas áreas de engenharia e saúde, também foco do novo Fies.
"São cursos com tíquete mais alto e duração mais longa, onde a demanda está mais alta. Além disso, são cursos importantes para o país e não por acaso o Ministério da Educação tem a mesma percepção", disse Galindo.