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Mercado eleva prêmio de risco fiscal, impulsiona dólar e juros e vê atraso em corte da Selic

Publicado 07.06.2022, 12:49
Atualizado 07.06.2022, 12:50
© Reuters. Moedas de reais
15/10/2010
REUTERS/Bruno Domingos
USD/BRL
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Por José de Castro

SÃO PAULO (Reuters) - A percepção de risco fiscal voltou com força a chacoalhar os ativos brasileiros nesta terça-feira, com os mercados de câmbio e juros sentindo o maior baque, enquanto analistas dizem que os prêmios de risco podem se manter mais elevados conforme aumenta a incerteza sobre novas propostas que podem comprometer a saúde das ainda fragilizadas contas públicas.

Há semanas investidores já vinham citando com mais frequência nas conversas o retorno de dúvidas sobre as ideias do governo para aumentar gastos num momento em que a disputa eleitoral ganha contornos mais nítidos e o presidente Jair Bolsonaro parece ter estacionado nas pesquisas de intenção de voto.

As propostas em torno da tributação dos combustíveis num contexto de forte alta dos preços vinham ocupando o centro dos debates, mas até agora sem grandes repercussões negativas nos preços dos ativos.

Mas na noite de segunda-feira Bolsonaro disse que o governo está disposto a zerar impostos federais cobrados sobre gasolina, gás, etanol e diesel, em troca de uma redução da carga cobrada pelos entes federativos, que seriam ressarcidos pelo governo federal. Acompanhando o presidente no anúncio, o ministro da Economia, Paulo Guedes, disse que os valores serão limitados ao montante de uma arrecadação extraordinária que ainda não foi lançada no Orçamento.

Foi o suficiente para causar uma liquidação no real e nos contratos de juros futuros. "No geral, apesar de esse desenvolvimento adicionar riscos negativos para nossas projeções de inflação no curto prazo, aumenta os riscos fiscais, especialmente considerando a possibilidade de afrouxar novamente a âncora do teto de gastos", disse o Citi em nota.

A estratégia de corte de tributação dos combustíveis, que será estabelecida em uma Proposta de Emenda à Constituiação (PEC), terá um custo de cerca de 40 bilhões de reais por aproximadamente seis meses de vigência, com a maior parte dos recursos ficando fora da contabilidade do teto de gastos, afirmaram fontes do Ministério da Economia à Reuters.

Enquanto lá fora o dólar tinha variações contidas frente a divisas emergentes, aqui a moeda chegou a disparar 2,91%, para 4,9354 reais. A incerteza maior era exposta também pela volatilidade implícita nas opções de taxa de câmbio, cujo vencimento para seis meses (que inclui o mês da eleição) saiu de 19,97% para 20,775%, aproximando-se de máximas desde 2018.

Os juros futuros de longo prazo --uma medida das expectativas para os custos dos empréstimos-- saltavam cerca de 20 pontos-base. A inclinação --uma medida de risco-- subia 17 pontos-base, para o maior patamar desde março, nas taxas entre janeiro 2027 e janeiro 2023.

Atraso em cortes de juros

A pressão no câmbio e os efeitos no mercado de renda fixa aumentam o nível de alerta do Banco Central, que na semana que vem anunciará decisão sobre a Selic horas depois de o principal banco central do mundo (o Fed, dos EUA) provavelmente fazer nova elevação nas taxas, e com risco de adotar postura ainda mais dura.

"A inflação vai ser menor em 2022, mas a de 2023 será potencialmente maior, e isso pode atrasar o momento em que o BC começaria a cortar os juros", disse Ivo Chermont, economista-chefe da Quantitas, que por ora prevê início de redução da Selic em junho de 2023, cenário que pode ser postergado.

"O dólar está pressionado, o que aumenta a pressão para a Petrobras (SA:PETR4) reajustar (preços). E se não reajustar, o que acontece com a percepção do mercado sobre a Petrobras? E se reajustar, (governo) está fazendo tudo isso para enxugar gelo?", pontuou o economista, para quem o que preocupa o mercado é o que pode vir pela frente.

Pelos cálculos do Itaú Unibanco (SA:ITUB4), a inflação pode ficar até 300 pontos-base menor em 2022 com o impacto cheio da proposta. "Mas para 2023 os cortes de juros previstos já estão diminuindo", disse o profissional de uma grande gestora em São Paulo.

Em revisão de cenário divulgada nesta terça, o Bradesco (SA:BBDC4) retirou parte dos cortes previstos anteriormente para a Selic e passou a ver juro básico de 10,5% ao fim de 2023, em vez do número de 9,0% previsto anteriormente, citando persistência da inflação e surpresas com a atividade econômica.

O banco estima o custo fiscal da nova PEC que tratará da tributação de combustíveis em algo próximo de 40 bilhões de reais, sendo 25 bilhões de reais em despesas fora do teto de gastos.

"A princípio, a PEC teria vigência apenas até o final deste ano, portanto o alívio de inflação seria recomposto no início de 2023 trazendo bastante volatilidade para essas projeções", disse o banco.

Para André Perfeito, economista-chefe da gestora Necton, até mesmo o alívio inflacionário previsto pelo governo com a nova iniciativa pode ser comprometido no cenário de dúvidas.

"Para além disso, não há clareza sobre quais Estados vão, de fato, aderir ao acordo, o que tornaria o efeito final menor que o inicialmente estimado na ponta final", comentou.

"O conjunto de incertezas ainda é grande e será digerido ao longo da semana pelos agentes de mercado", completou.

E o receio de que a pressão de preços esteja apenas sendo deslocada para a frente fez disparar as taxas de inflação implícita de médio prazo, que subiram em torno de 10 pontos-base.

"Você está dizendo ao mercado que pretende abrir mão de uma receita de 50 bilhões de reais num país que ainda tem problemas fiscais", comentou Joaquim Kokudai, gestor na JPP Capital, que disse, contudo, ter temido algo como um novo decreto de calamidade pública quando foi informado o evento com Guedes e Bolsonaro ocorrido na noite da véspera.

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