Por David Ljunggren
OTTAWA (Reuters) - A agência de espionagem eletrônica do Canadá tem interceptado e analisado dados de mais de 15 milhões de downloads de arquivos por dia como parte de um programa de vigilância global, que inclui o Brasil, de acordo com uma reportagem publicada nesta quarta-feira.
Além do Brasil, o programa de vigilância, apelidado de Levitation (Levitação), inclui países aliados e parceiros comerciais do Canadá como Estados Unidos, Grã-Bretanha, Alemanha, Espanha e Portugal, disseram a reportagem da CBC News e o jornalista Glenn Greenwald.
A iniciativa de espionagem foi revelada em 2012 em documentos obtidos pelo delator norte-americano Edward Snowden. É a primeira revelação dos documentos de Snowden a mostrar que o Canadá lançou seu próprio programa global de vigilância na Internet.
O Ministério das Relações Exteriores do Brasil lamentou a informação da espionagem canadense e reafirmou a posição do governo de estimular a privacidade digital, lembrando que liderou na Organização das Nações Unidas (ONU) iniciativas aprovadas sobre o tema.
"O Brasil lamenta e repudia todos os episódios de espionagem não autorizada de autoridades estrangeiras por órgãos de inteligência. O Brasil tem procurado atuar, no sistema multilateral, no sentido de estimular o respeito à privacidade nos meios digitais", afirmou o ministério em e-mail enviado à Reuters.
"Também foram aprovadas resoluções, copatrocinadas pelo Brasil, na Assembleia-Geral da ONU, demonstrando o reconhecimento da importância do tema pela comunidade internacional", de acordo com o e-mail.
A CBC News revelou que o programa de vigilância Communications Security Establishment (CSE) detectou para a agência 350 "eventos de download interessantes" a cada mês.
O CSE é um órgão secreto e, assim como a Agência de Segurança Nacional dos EUA (NSA, na sigla em inglês), monitora comunicações eletrônicas e ajuda a proteger redes nacionais de computadores. Não é permitido alvejar canadenses ou empresas do país.
Entre suas principais iniciativas, o programa de espionagem descobriu um vídeo de um refém alemão e um documento que revelou a estratégia de um braço da Al Qaeda no norte da África, disse a CBC News.
A agência não confirmou a reportagem, alegando em comunicado que o "programa CSE provou que a inteligência teve um papel vital na descoberta de tentativas de extremistas baseados no exterior de atrair, radicalizar e treinar indivíduos para promover ataques".
Os documentos de Snowden mostram que a agência analisou de 10 milhões a 15 milhões de uploads por dia de vídeos, músicas e outros arquivos em mais de 102 sites de compartilhamento de arquivos.
O Canadá faz parte da rede de inteligência formada também por EUA, Grã-Bretanha, Austrália e Nova Zelândia.
Em 2013, a presidente Dilma Rousseff exigiu uma explicação do Canadá depois que uma reportagem, também baseada em documentos vazados por Snowden, apontou que o programa de vigilância CSE espionou o Ministério de Minas e Energia.
Os documentos devem gerar mais perguntas sobre o CSE, que enfrentou no passado acusações de interceptar de maneira imprópria ligações e e-mails de cidadãos canadenses.
Em novembro de 2013, a CBC News citou outros documentos de Snowden mostrando que o Canadá permitiu que a NSA conduzisse vigilância abrangente durante a cúpula do G20 em Toronto em 2010.
O CSE não estava imediatamente disponível para comentar.
(Reportagem adicional de Mike de Souza, em Ottawa; e de Anthony Boadle, em Brasília)