SÃO PAULO (Reuters) - Uma das figuras mais emblemáticas do esporte mundial de todos os tempos, o norte-americano Jesse Owens (1913-1980) demoliu a tentativa de Adolf Hitler de transformar a Olimpíada de 1936, em Berlim, num espetáculo de propaganda, comprobatório da superioridade ariana. Para desgosto do líder nazista, o atleta afro-americano Owens ganhou quatro medalhas de ouro naquele evento.
Interpretado pelo ator canadense Stephan James (de “Selma – a Luta pela Igualdade”), o corredor ganha vida e carisma, num filme dirigido por Stephen Hopkins, a partir de um roteiro assinado por Joe Shrapnel e Anna Waterhouse. O foco da história está nos três anos decisivos da preparação de Owens para o grande feito esportivo de sua vida.
Filho de uma família pobre, Owens foi o primeiro do clã a entrar numa universidade, a Estadual de Ohio. Em seus corredores, no início dos anos 1930, ele e os raros outros alunos negros não tinham vida fácil. Mesmo atletas, sofriam discriminação até mesmo para usar os vestiários e chuveiros, sendo obrigados a esperar que os colegas brancos os utilizassem primeiro.
As dificuldades de Jesse não paravam aí. Mesmo jovem, ele já era pai solteiro de uma menina, filho de sua namorada Ruth (Shanice Banton). Assim, tinha que manter alguma atividade remunerada para sustentar a menina, o que tirava tempo para sua dedicação aos treinamentos, de olho na participação em competições para qualificação à Olimpíada.
Dentro da universidade, o jovem corredor ganha um aliado essencial, o treinador Larry Snyder (Jason Sudeikis). Fora dali, outra grande batalha está acontecendo. Como o nazismo em ascensão já iniciava a perseguição a judeus e ciganos, alguns cogitavam um boicote dos EUA à participação nos Jogos na Alemanha. É o caso de Jeremiah Mahoney (William Hurt), presidente da União Atlética Amadora dos EUA, que acha inaceitável que o país feche os olhos aos desmandos nazistas.
Defende posição oposta o industrial Avery Brundage (Jeremy Irons), do Comitê Olímpico Norte-Americano, que finalmente parte numa viagem de reconhecimento a Berlim. A viagem, como se sabe, culminou na defesa de Brundage de que a situação na Alemanha estava dentro da normalidade, o que comprometeu para sempre a imagem do industrial, tendo-se em vista os desdobramentos do nazismo na 2ª Guerra Mundial, especialmente os campos de concentração.
Esse vacilo dos EUA naquele momento inicial do nazismo é evidenciado como um contexto para as façanhas esportivas de Owens – que são mostradas com particular entusiasmo durante a Olimpíada, filmadas pela cineasta Leni Riefenstahl (Carice van Houten, de Game of Thrones). Goebbels (Barnaby Metschurat) também aparece, como símbolo maior da frustração nazista diante do sucesso do jovem negro, já que Hitler desaparece, recusando-se a cumprimentá-lo, aliás, assim como Goebbels.
“Raça” não se esquiva de mostrar que os EUA tinham seu próprio telhado de vidro naquele momento justamente na discriminação de sua população negra – de que é singular testemunho o fato de Owens ser obrigado a entrar com sua mulher por uma entrada de serviço de um hotel de luxo para participar de um banquete em sua homenagem. Mas falta à condução do filme alguma sofisticação dramática e narrativa, bem como evidenciar também a ambiguidade moral da talentosa Leni Riefenstahl em sua estreita colaboração com o nazismo.
(Por Neusa Barbosa, do Cineweb)
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