Por Nafisa Eltahir
(Reuters) - No início de maio, uma forte explosão abalou Shambat, um bairro ao norte de Cartum, capital do Sudão. Moradores correram para apagar as chamas que devoravam uma casa improvisada que, segundo eles, foi incendiada por um ataque aéreo.
Eles chegaram tarde demais. Em meio aos escombros fumegantes, segundo cinco testemunhas, estavam os corpos carbonizados de uma mulher grávida, um homem e cinco crianças. Após o ataque de 7 de maio, a mulher e as crianças foram enterradas no local e o homem em um cemitério próximo, disseram duas das testemunhas.
As sete vítimas do ataque de Shambat têm algo em comum com muitas das mortes na guerra que assola o Sudão desde meados de abril: elas não estão incluídas na contagem oficial de mortos no Estado de Cartum, que registrou a maior parte dos combates entre o Exército sudanês e o principal grupo paramilitar do país, as Forças de Apoio Rápido. Com o conflito destruindo os serviços governamentais e de saúde locais, as entidades que normalmente registravam as vítimas estão em grande parte incapacitadas.
Uma contagem da Reuters de números de mortos registrados por ativistas locais e grupos voluntários indica que o número de civis mortos na região ampliada da capital pode ser mais que o dobro da contagem oficial, o que ressalta o impacto devastador da guerra de mais de 100 dias sobre o povo sudanês.
Um relatório do Ministério da Saúde local distribuído para agências de ajuda e visto pela Reuters colocou o número de mortos no Estado de Cartum em 234 pessoas até 5 de julho. O relatório especifica que os dados são coletados apenas de hospitais civis.
Mas em todo o Estado de Cartum, que inclui a capital e suas cidades irmãs Omdurman e Bahri, grupos de ativistas e voluntários registraram pelo menos 580 mortes de civis até 26 de julho como resultado de ataques aéreos, artilharia e tiros.
A disparidade nos números do Estado de Cartum sugere que o número oficial de mortos em todo o país, que o Ministério da Saúde local estima em 1.136 pessoas em 5 de julho, também pode estar subnotificado.
Um funcionário do Ministério da Saúde do Sudão disse à Reuters que o número oficial era "a ponta do iceberg". Isso porque muitos civis morreram em seus bairros ou em casa -- não no hospital -- então suas mortes não teriam sido registradas, afirmou ele.
A Reuters não conseguiu confirmar de forma independente as mortes registradas pelos grupos, ou as sete mortes em 7 de maio descritas pelas testemunhas oculares.
As Forças de Apoio Rápido acusam o Exército de prejudicar civis por meio do uso de aviões de guerra e artilharia pesada para bombardear o Estado de Cartum. Os militares acusam as Forças de Apoio Rápido de matar civis ao disparar mísseis em áreas residenciais e, em seguida, culpar o Exército pelos ataques e matar pessoas enquanto saqueavam casas e empresas.
A guerra também feriu mais de 12.000 pessoas e deslocou mais de 3,5 milhões, de acordo com a Organização das Nações Unidas, que a qualificou como uma das maiores crises humanitárias do mundo.
Mesmo a contagem não oficial da Reuters provavelmente está subnotificada, porque alguns grupos locais são mais organizados e mais capazes de registrar incidentes do que outros, disse Salah Albashir, membro de um grupo voluntário de resposta a emergências na cidade de Bahri, onde fica o bairro de Shambat. As sete mortes no ataque de Shambat são um exemplo da subcontagem. O incidente de 7 de maio não havia sido relatado anteriormente. As mortes não fazem parte da contagem do governo e também não estão registradas nos números divulgados por grupos de voluntários locais.