Por Andrew Osborn
MOSCOU (Reuters) - O presidente da Rússia, Vladimir Putin, manteve distância dos eventos de comemoração do centenário da Revolução Russa nesta terça-feira, um acontecimento que mudou o mundo, mas que desperta associações delicadas para o ex-agente da KGB, que foi treinado para conter a dissidência, e não celebrá-la.
Na era soviética, lançadores de mísseis desfilavam pela Praça Vermelha todo dia 7 de novembro, líderes soviéticos assistiam do alto do mausoléu de Vladimir Lenin --o pai da Revolução Bolchevique-- e o aniversário do levante era um feriado nacional.
A Praça Vermelha de fato sediou um desfile militar nesta terça-feira, mas se tratou sobretudo de uma reencenação estilizada de um evento de 1941 da Segunda Guerra Mundial que só mencionou brevemente a famosa revolta. Ele não foi exibido ao vivo pela televisão estatal e só contou com um pequeno segmento da revolução de 1917 com soldados do Exército Vermelho.
O centenário, disse o porta-voz de Putin, foi um dia de trabalho normal para o presidente russo, que tinha várias reuniões no Kremlin.
Acusado pela oposição de ter se transformado em uma mistura entre um autocrata de estilo soviético e um czar, e de olho em uma possível reeleição no ano que vem, o líder russo de 65 anos passou anos pregando a estabilidade e ao mesmo tempo denunciando rebeliões na antiga União Soviética e no Oriente Médio.
O batalhão de choque da polícia reprimiu uma série de protestos antigoverno neste ano, realizando detenções em massa. Alexei Navalny, líder opositor e crítico ferrenho de Putin, foi preso três vezes por violar regras sobre manifestações públicas.
Putin, que busca moldar uma identidade nacional orgulhosa, selecionou a dedo partes do passado soviético, como sua vitória na Segunda Guerra e seu sucesso na corrida espacial. Embora não enfatize o papel do comunismo nestes feitos, ele já usou um tom ambivalente, classificando certa vez o colapso soviético em 1991 como a maior catástrofe geopolítica do século 20.
Nos raros comentários que fez sobre o tema antes do centenário, Putin deixou claro que acha que teria sido melhor que a revolução de 1917 nunca tivesse ocorrido e que acredita que não há nada para se comemorar.
"... Vemos quão ambíguos são seus resultados, o quão intimamente as consequências negativas e, precisamos reconhecer, positivas destes eventos estão entrelaçadas", afirmou Putin a uma congregação de acadêmicos no mês passado.
Putin escolheu suas palavras cuidadosamente. A data pode lhe causar sentimentos conflitantes, mas continua sendo um aniversário sagrado para o Partido Comunista e para muitos russos mais velhos.
Embora seja o segundo maior partido na câmara baixa do Parlamento após o partido pró-Kremlin Rússia Unida, o Partido Comunista Russo exerce pouca influência real hoje e vota com o Kremlin na maioria dos principais temas.
Mas os seus apoiadores, que realizaram uma série de eventos de comemoração de uma semana para marcar o centenário da revolução e que ainda deveriam realizar uma manifestação em Moscou nesta terça-feira, acreditam que sua hora vai chegar novamente.
"O capitalismo está tropeçando de uma crise para outra", escreveu o veterano líder do Partido Comunista Russo, Gennady Zyuganov, em uma nota de celebração do centenário para seus simpatizantes.
"Estamos convencidos de que o sol do socialismo voltará a iluminar a Rússia e o mundo inteiro."