🔥Ações selecionadas por IA com InvestingPro Agora com até 50% de descontoGARANTA JÁ SUA OFERTA

2020 – Na nova década, novos desafios

Publicado 06.01.2020, 18:02
Atualizado 09.07.2023, 07:32
ZW
-

Eis-nos chegados à terceira década do século XXI.

Tradicionalmente é uma década marcante para o futuro, em suma, é o verdadeiro início do século. Não é preciso ir mais longe do que o exemplo da história: o que ocorreu nos anos vinte do século XIX marcou profundamente a realidade por muitos anos, como são exemplos a independência do Brasil e a formação do Império. O país nunca mais seria o mesmo. O mesmo se pode dizer dos acontecimentos dos anos vinte do século XX, com os eventos que levaram à ascenção de Getúlio ou a Semana da Arte Moderna que marca a modernização cultural, só para citar alguns exemplos.

Também na Europa e nos EUA os eventos dos anos vinte romperam com o mundo velho, condicionando toda a realidade política e militar por muitos anos. A euforia norte-americana, os “roaring twenties”, que exportaram um estilo de vida e prosperidade pelo mundo ocidental, com toda a sorte de excessos que haveriam de culminar no choque do “crash” da Bolsa de Nova Iorque em 1929 – momento que marcou por muitos anos a esfera financeira, com consequências trágicas na economia, na política internacional, enfim, em tudo o que se passou no mundo nos anos e décadas seguintes.

Os eventos dos anos vinte deixaram uma herança quase interminável. Estamos em crer que a história se repete e que voltaremos a experimentar transformações de fundo que marcarão o futuro.

Há quem diga que isso é resultado da mudança geracional. Só agora nos anos vinte é que se perderá em definitivo uma certa memória histórica do século anterior e que as novas gerações estarão totalmente afastadas de experiências marcantes do passado. Vendo bem, quem tem hoje 35 anos de idade, já não compreende o mundo anterior à queda do Muro de Berlim, ou os eventos que levaram a esse momento histórico e nem sequer se lembra dessa noite mágica e das transformações subsequentes.

De igual modo, passando agora para a esfera financeira global, a mesma pessoa ainda tem uma leve memória das moedas antigas, alvo da hiperinflação, mas já não compreende o que é viver diariamente com isso ou com juros mais elevados ainda, antes do sucesso do Plano Real, nem sequer se recordará da evolução que levou ao maior experimentalismo financeiro dos Bancos Centrais, a que sempre chamei de “exacerbada liquidez”, a qual vem alimentando bolhas há mais de trinta anos, criando ao mesmo tempo crises cada vez mais duras. Da última destas, a memória coletiva ainda está fresca, mas rapidamente se vai desvanecendo, como já estamos a observar.

O mundo entra em 2020 com um grande sentimento de desilusão. Há 50 anos apenas todos sonhavam com o imaginário da ficção científica. À época, pensar em 2020 seria pensar em viagens pelo espaço sideral, circular em carros voadores, imaginar pessoas semi-biónicas. Enfim, até na possibilidade de nos podermos alimentar com uma espécie de pílula que nos forneceria todos os nutrientes, pelo que a alimentação convencional só seria utilizada em contextos de festa ou comemoração. Era acreditar que o Homem, quase liberto das obrigações e esforços do dia-a-dia, poderia se dedicar às mais altas esferas da arte e da cultura, podendo-se dedicar em pleno aos prazeres da vida.

Ao longo destes anos, o otimismo reinante acabaria por se desvanecer. O guarda-chuva da energia nuclear revelar-se-ia eficaz a evitar um novo conflito global, mas não impediu que o pior do Homem viesse à tona: continuámos sempre mergulhados em sangrentos conflitos, em permanente guerra e revolução, independentemente de conceitos de raça, religião ou geografia.

Mas se não obtivemos tudo o que muitos sonharam ao longo dos tempos, atingimos novos máximos no desenvolvimento tecnológico, nas comunicações, na ciência médica, no poderio industrial, nas novas técnicas agrícolas. O mundo nunca conheceu tamanho desenvolvimento e progresso, inclusive social, algo espantoso se tivermos em consideração todos os imponderáveis conhecidos, sendo um dos mais complexos, o próprio crescimento global da população.

Eis-nos chegados a 2020 com um “mix” improvável de frustração e satisfação. De alegria e desilusão. Sempre o copo meio cheio e meio vazio. Sempre o Yin e o Yang. No fundo, o mundo que temos é o mundo que somos. Sempre assim foi e sempre assim será. O maior de todos os paradoxos na virada da década é o de tentarmos compreender como foi possível atingirmos tão extraordinários progressos ao mesmo tempo que a miséria humana se multiplica. Somos, talvez, já demasiados seres humanos, daí que, por muito que a vida melhore para tantos, existem outros que parecem nunca ter vez.

Perante estes factos, há uma série de questões marcantes para 2020 e seguintes anos. As questões são intensas e deverão marcar a década.

Desde logo, pegando na política dos grandes blocos (vide ensaio sobre o ano de 2019), será que se vai intensificar a rivalidade EUA – Rússia – China? Admitindo-se a impossibilidade de guerra total, devido às terríveis armas de que todos dispõem, os dirigentes deverão provavelmente alimentar guerras de influência regionais, com a possibilidade de conflitos armados numa espécie de guerra fria moderna, as quais deverão influenciar cada vez mais a política das sub-regiões mais próximas, geograficamente falando, e, muito importante, tentarão influenciar os jogos de poder nos blocos que se formarão por virtude do gigantismo natural dos mesmos. Leia-se: Índia (um bloco de influência económica e política em estado puro), Indonésia (uma potência emergente e maior país de influência muçulmana), Nigéria (cuja explosão populacional vai fazer tremer o seu próprio continente e o mundo), Brasil (devido à marcante posição nos mercados de produtos agro e agroindustriais e outros recursos) e Reino Unido (agora com mãos livres para renegociar a sua influência política, militar, económica e histórica pelo mundo afora).

No meio disto tudo, volta a ser premente a questão: e onde fica a Europa unida no meio disso tudo. Sem o Reino Unido, mas ainda com os núcleos duros dos impérios do velho continente, qual será a posição europeia perante as jogadas de estratégia globais? O mais provável será a continuação da estagnação europeia, pelo menos em comparação com a ascensão de outros continentes. E a América do Sul, outrora considerado o continente de futuro radiante, que atraia gente de todos os lugares? O mais provável é que continue cada vez mais mergulhado em divisões gritantes nas áreas ideológicas, económicas e sociais, com possibilidade de conflitualidade interna nalguns países e até regional em caso de grise mais grave.

A Ásia deverá continuar a cimentar a sua posição no mundo, ostentando mais riquezas, mas também mais problemas. Crescer não é fácil e acarreta custos. Serão os benefícios suficientes para esconder os imponderáveis?

Dito isto, ficam algumas das questões que vão marcar seguramente a nova década, no seu todo ou em parte e que poderão atingir o seu auge ou a sua resolução:

- O debate sobre alterações ou emergência climática. Daqui não passa. Nesta década vamos ficar finalmente a saber se isto é o caos que se apregoa. A utilização de problemas ambientais como bandeira ideológica não afigura nada de bom. Corre-se o sério risco de um certo tipo de discurso alarmista nos desviar do essencial. O que é o essencial? A compreensão daquilo que é a participação do Homem na degradação da biodiversidade, dos efeitos da poluição moderna na natureza, como é o caso da execrável utilização dos oceanos como um gigantesco caixote de lixo, cheio de plásticos e demais atrocidades. Urge separar o trigo do joio e tomar medidas que evitem a utilização de matérias poluentes, mas essas medidas terão de ser globais e nunca focadas num determinado continente, sob pena de terem um efeito demasiado reduzido.

- Como alimentar uma população mundial que, sendo agora 7.7 mil milhões, vai atingir 8.5 mil milhões de pessoas no final da década. O aumento populacional por si só é impressionante, mas a realidade é cruel. Se hoje alimentar o mundo implica em mais e maior devastação do meio ambiente, como será no futuro? A agricultura é hoje responsável por 80% da extinção das florestas e da biodiversidade. Como poderemos tornar compatível a necessidade do aumento da produção agrícola com a preservação do meio ambiente é um desafio inimaginável há apenas cem anos. E a água? Vai ser uma “commodity” cotada em mercado? Nalguns locais este bem escasso, mas essencial à vida poderá valer ouro e ser motivo de guerras tremendas ou convulsões sociais. Mesmo nas sociedades desenvolvidas, a questão da água deverá levar a profundas perturbações e motivar a aceleração da mudança de certos paradigmas.

- Como fixar as populações nos seus locais de origem, prevenindo ondas de migração. Historicamente o ser humano sempre migrou pelas mais variadas razões, sobretudo económicas. Mas a situação atual tende a ser explosiva, pois a quantidade de pessoas em aflição excede toda a capacidade de acolhimento, sendo que, na maioria das vezes, os migrantes que têm sorte em fugir, podem nem sequer ser os mais necessitados. A grande questão é, pois, como ajudar as regiões depauperadas para que as populações se possam manter nos locais de origem. Portanto, trata-se de resolver o problema na fonte. As dificuldades em dar respostas serão dos maiores desafios da década.

- Perante os temas acima, como vai ser a sociedade de consumo. Vai mudar radicalmente o paradigma que comandou as últimas décadas ou tudo fica na mesma? Vai mudar alguma coisa para que, no fundo, tudo fique na mesma? Ou fica tudo igual? Como poderá o mundo aguentar o aumento do consumo de bens e serviços derivado do crescimento global do PIB? Vendo bem, cada vez há mais capacidade de consumo global, cada vez há mais rendimento disponível, surgem as classes médias um pouco por todo o lado. Todos querem a sua parte do bolo, mas o bolo tem de ser muito maior. Poderão os recursos do Planeta ser suficientes para todos? Até quando e por que preço?

- Será o 5G a revolução que todos esperam? O mundo está online, mas vai passar a ser tudo em tempo real. Irá isto aumentar ou diminuir o fosso entre ricos e pobres? Vamos ter mesmo carros autónomos por todo o lado? Será esta década suficiente para instalar uma grande rede de 5G em todos os locais ou só em alguns? E a inteligência artificial? Vai beneficiar a quem? Será uma ajuda válida ou cemitério de empregos? Hoje ainda não há uma noção da realidade da IA, mas no fim da década, seguramente, será uma questão na ordem do dia, com possibilidade de disrupções sociais um pouco por todo o mundo desenvolvido. A automação foi pensada para um mundo envelhecido, com menor capacidade de recrutar mão-de-obra. Como será num mundo mais populoso do que nunca?

- Qual será a influência das “blockchains” na evolução digital? Será o fim do mundo tal como o conhecemos? Sabemos que as moedas digitais terão muitas possibilidades tanto mais se houver garantia por parte de Bancos Centrais “viáveis”, mas o mundo das “blockchains” é muito mais do que as cripto moedas, é algo que poderá ser a futura revolução, ainda mais num contexto de internet de maior velocidade e fiabilidade. A minha aposta é a seguinte: no mundo das viagens e turismo vai fazer parte de uma revolução de metodologias. Haverá uma revolução no funcionamento de outros mercados? Do mercado financeiro? Ainda estamos só no começo. O protocolo de descentralização é um antigo sonho de muitos utilizadores da rede. Vamos esperar para ver se cumpre o que se promete, isso fará com que esta década seja mesmo incrivelmente marcante no contexto do século XXI.

Depois destas questões que são apenas uma amostra de tantas outras que poderiam ser inumeradas, como as guerras, o terrorismo, as crises políticas nas grandes democracias, fica a pergunta: qual será o grau de crescimento económico e qual o comportamento dos mercados financeiros globais?

Há apenas uma década, já se levantavam as maiores ondas de pessimismo (como sempre ocorre) pelas razões que todos conhecem, mas tal não impediu nem o contínuo crescimento económico global nem o crescimento dos mercados ou a valorização de ativos. A fórmula mágica do milagre da multiplicação das notas, ou seja, “dinheiro” (aumento da liquidez e diminuição dos juros) foi dando resultados inesperados. Na década que passou, um enorme aumento do endividamento global não foi impediu que muita dessa dívida rendesse zero ou menos que zero. Com a generalização dos juros negativos, os ativos de risco tiveram passadeira vermelha para valorizações inesperadas. A década foi positiva para quem arriscou, sendo insensível aos perigos. Mas os juros negativos levantaram questões: como será a ressaca dessa festa? Até quando o mercado aceitará que a passagem do tempo não tenha valor intrínseco? Aqui devemos pensar na explicação que daríamos a uma criança se questionados sobre o que são os juros? Normalmente, diríamos alguma coisa como isto: se quiseres 10 sorvetes agora, são só esses 10 e não tem mais conversa. Se esperares um ano, ganhas mais 3 ou seja um total de 13 sorvetes. Assim se explicaria um juro anual de 30% a uma criança. Então, como explicar juros negativos? Se quiseres dez sorvetes agora, tudo bem, mas daqui a um ano vais obter nove sorvetes apenas. Será fácil de imaginar a criança a gritar e pular pelos dez sorvetes imediatamente, nem pensar em esperar minuto mais.

Isso leva-nos a pensar: quem é que quer aceitar juros negativos? Por quanto tempo mais? Com que objetivo? A necessidade de preservar o capital tem limites ou a perda de algum capital é um preço a pagar pela segurança (quase) total desse mesmo capital?

Vamos acreditar que na nova década esta situação será igual a uma corda que se estica até ao limite…até partir para algum lado. Não é de excluir nenhum cenário: poderemos ver o fim definitivo dessa experiência inusitada, como poderemos ver Obrigações do Tesouro (algumas) com juros negativos de três, quatro ou cinco porcento.

No fundo, a mensagem é clara: arrisque, sim, mas se proteja também.

Feliz década nova

Últimos comentários

Carregando o próximo artigo...
Instale nossos aplicativos
Divulgação de riscos: Negociar instrumentos financeiros e/ou criptomoedas envolve riscos elevados, inclusive o risco de perder parte ou todo o valor do investimento, e pode não ser algo indicado e apropriado a todos os investidores. Os preços das criptomoedas são extremamente voláteis e podem ser afetados por fatores externos, como eventos financeiros, regulatórios ou políticos. Negociar com margem aumenta os riscos financeiros.
Antes de decidir operar e negociar instrumentos financeiros ou criptomoedas, você deve se informar completamente sobre os riscos e custos associados a operações e negociações nos mercados financeiros, considerar cuidadosamente seus objetivos de investimento, nível de experiência e apetite de risco; além disso, recomenda-se procurar orientação e conselhos profissionais quando necessário.
A Fusion Media gostaria de lembrar que os dados contidos nesse site não são necessariamente precisos ou atualizados em tempo real. Os dados e preços disponíveis no site não são necessariamente fornecidos por qualquer mercado ou bolsa de valores, mas sim por market makers e, por isso, os preços podem não ser exatos e podem diferir dos preços reais em qualquer mercado, o que significa que são inapropriados para fins de uso em negociações e operações financeiras. A Fusion Media e quaisquer outros colaboradores/partes fornecedoras de conteúdo não são responsáveis por quaisquer perdas e danos financeiros ou em negociações sofridas como resultado da utilização das informações contidas nesse site.
É proibido utilizar, armazenar, reproduzir, exibir, modificar, transmitir ou distribuir os dados contidos nesse site sem permissão explícita prévia por escrito da Fusion Media e/ou de colaboradores/partes fornecedoras de conteúdo. Todos os direitos de propriedade intelectual são reservados aos colaboradores/partes fornecedoras de conteúdo e/ou bolsas de valores que fornecem os dados contidos nesse site.
A Fusion Media pode ser compensada pelos anunciantes que aparecem no site com base na interação dos usuários do site com os anúncios publicitários ou entidades anunciantes.
A versão em inglês deste acordo é a versão principal, a qual prevalece sempre que houver alguma discrepância entre a versão em inglês e a versão em português.
© 2007-2024 - Fusion Media Limited. Todos os direitos reservados.