A discussão sobre educação financeira no Brasil ganhou força no início dos anos 2000, com iniciativas pontuais promovidas por entidades privadas e instituições financeiras. No entanto, a grande virada ocorreu em 2010, quando o governo lançou a Estratégia Nacional de Educação Financeira (ENEF), que tinha como objetivo promover a inclusão do tema nas escolas e disseminar boas práticas de gestão financeira para toda a população.
A Base Nacional Comum Curricular (BNCC), reformulada pela Lei no 13.415/2017, prevê que a educação financeira deve ser incorporada aos currículos escolares das escolas brasileiras. A partir de 2020, a educação financeira passou a ser um tema obrigatório nas escolas, não necessariamente como uma disciplina específica, mas de forma transversal, integrando-se a outras matérias.
O Brasil enfrenta um cenário crítico impulsionado pelo crescimento expressivo do mercado de apostas. A Confederação Nacional do Comércio (CNC) revelou que o varejo brasileiro deixou de faturar R$ 103 bilhões em 2024 devido ao redirecionamento de recursos familiares para as bets, plataformas de apostas esportivas e cassino online. Segundo o estudo “O Panorama das Bets”, os brasileiros movimentaram cerca de R$ 240 bilhões no setor, gerando endividamento e vício, além de impactos econômicos e sociais significativos.
Cidadãos desinformados tomam decisões que os deixam extremamente vulneráveis a dificuldades financeiras, como o superendividamento. Desta forma, a educação financeira é fundamental para o progresso social e econômico de um país. Uma população educada financeiramente não só saberá gerir melhor seus salários e bens como passará a entender melhor sobre economia e mercado.
O impacto da falta de educação financeira
A falta de educação financeira contribui para um ciclo de endividamento e dificuldades econômicas que afetam milhões de brasileiros. Segundo o Banco Central, 55% da população não possui reservas financeiras para emergências, e uma pesquisa do Instituto Datafolha revelou que 46% dos brasileiros gastam mais do que ganham.
Os jovens também são impactados: um estudo do Serasa Experian (LON:EXPN) apontou que 20% dos inadimplentes no Brasil têm entre 18 e 25 anos. A ausência de uma base sólida de educação financeira nas escolas resulta em adultos que enfrentam dificuldades para administrar créditos, planejar investimentos e evitar armadilhas financeiras.
A inserção da educação financeira no ensino básico não é apenas uma medida pedagógica, mas uma ferramenta essencial para a formação de cidadãos mais preparados para lidar com os desafios econômicos da vida adulta. Ao compreender conceitos como orçamento, crédito, investimentos e planejamento financeiro desde cedo, os estudantes desenvolvem habilidades fundamentais para uma relação saudável com o dinheiro, impactando positivamente suas famílias e a sociedade como um todo.
Dentre os principais benefícios dessa abordagem, destaca-se a preparação para o futuro, pois jovens bem instruídos financeiramente tendem a tomar decisões mais estratégicas sobre crédito, investimentos, consumo e aposentadoria, reduzindo a vulnerabilidade financeira ao longo da vida. Além disso, o conhecimento sobre juros, parcelamentos e orçamento doméstico contribui para a redução do endividamento familiar, permitindo que as famílias evitem armadilhas financeiras, previnam o superendividamento e promovam maior estabilidade econômica.
Outro benefício importante é o estímulo ao empreendedorismo, já que a introdução de conceitos financeiros desde a infância incentiva a criatividade e o pensamento estratégico, favorecendo a criação de pequenos negócios e o desenvolvimento da mentalidade empreendedora. Além disso, a autonomia e a segurança financeira são fortalecidas, pois a capacidade de gerenciar recursos de forma responsável permite que os indivíduos tomem decisões fundamentadas e evitem comportamentos impulsivos que comprometam sua estabilidade econômica.
Por fim, a educação financeira reduz a vulnerabilidade a golpes e fraudes, tornando as pessoas mais críticas diante de promessas de dinheiro fácil, esquemas fraudulentos e apostas esportivas enganosas. Isso diminui a exposição a golpes financeiros cada vez mais sofisticados, garantindo maior proteção e conscientização no uso do dinheiro.
Dessa forma, a educação financeira no ensino básico vai além de ensinar a economizar ou fazer contas: ela forma indivíduos mais conscientes, críticos e preparados para enfrentar os desafios financeiros com inteligência, responsabilidade e visão de longo prazo, protegendo-se de armadilhas econômicas e promovendo uma sociedade mais estável e segura.
Desafios para a implementação
Embora a educação financeira esteja prevista na Base Nacional Comum Curricular (BNCC), sua implementação ainda enfrenta desafios significativos que comprometem sua eficácia nas escolas. Entre os principais obstáculos, destacam-se a falta de capacitação docente e a escassez de materiais didáticos.
A maioria dos professores não recebeu formação específica para ensinar educação financeira, o que torna essencial o investimento em qualificação e no desenvolvimento de metodologias adequadas para diferentes faixas etárias. Além disso, ainda há uma carência de recursos pedagógicos estruturados, como livros, jogos, atividades interativas e tecnologias educacionais, dificultando a aplicação prática do conteúdo em sala de aula.
Outro desafio relevante é a baixa conscientização familiar. Muitos pais também carecem de educação financeira, o que limita o reforço dos conceitos aprendidos na escola e reduz o impacto do ensino na construção de hábitos financeiros saudáveis. Sem esse suporte em casa, as crianças e os jovens têm mais dificuldade em consolidar uma relação equilibrada com o dinheiro, comprometendo os benefícios a longo prazo da educação financeira.
A educação financeira deve ser tratada como prioridade nas escolas brasileiras para formar cidadãos mais conscientes e preparados para lidar com suas finanças. Além de reduzir o endividamento e estimular o empreendedorismo, essa formação contribui para a estabilidade econômica do país a longo prazo.
Para que essa mudança ocorra de forma efetiva, é fundamental que governos, instituições de ensino e a sociedade civil invistam na capacitação docente, no desenvolvimento de materiais didáticos acessíveis e na conscientização das famílias sobre a importância do tema. Somente assim poderemos transformar a próxima geração em protagonistas de sua própria segurança financeira.