Pegadinha do malandro
A produção industrial brasileira recuou 0,9% em fevereiro, de acordo com o IBGE.
O que impressionou, no entanto, foi o dado revisado de janeiro...
Ele passou de alta de 2% para uma evolução de apenas 0,3% em relação à dezembro.
Se teve gente comemorando “sinal de recuperação”, é bom ir com calma...
Na comparação com fevereiro de 2014, a produção diminuiu 9,1% (!!).
Com isto, no primeiro bimestre do ano o indicador acumulou queda de 7,1% e, em 12 meses, cai 4,5%, pressionado sobretudo pelo fraco resultado da produção de bens de capital (queda de 25,7% frente a fev/14 e de 21,1% no bimestre).
São números expressivos, que infelizmente não surpreendem...
Apesar da fraca base de comparação, o cenário para a indústria brasileira, que já era ruim, só tende a piorar com o agravamento das pressões inflacionárias e diante do ajuste fiscal, que, vimos ontem, sequer começou.
Pés trocados
Consequência da crise, a disparada do dólar é o alento de ao menos parte da indústria, aquela com mix de produtos mais voltados à exportação...
Esse cara esperou muito tempo pela flutuação livre da moeda, e sua inevitável valorização em relação ao real, mas, quando veio, a alta do dólar acompanhou fim dos benefícios fiscais, reoneração de folha, aumento dos custos com mão-de-obra e energia, e estrangulamento da demanda interna...
O que não falta, hoje, são pés trocados:
Petrobras liberou reajuste no preço dos combustíveis após as eleições para ganhar com as importações... O dólar veio e acabou com essa arbitragem.
As aéreas precisavam da queda dos preços do petróleo para reduzir o preço do combustível de aviação (QAV), mas também perderam com a alta do dólar...
Os frigoríficos, “máquinas de dinheiro” com a alta do dólar, também são máquinas de multiplicação de dívida, tendo em vista o elevado endividamento em moeda forte.
Os produtores de commodities, que ganham com o dólar forte nas exportações, sofrem com a virada no preço das matérias-primas no mercado internacional...
No momento que Dilma alarmava comprometimento com o ajuste fiscal à Bloomberg, e Levy ao Senado, o resultado das contas públicas para fevereiro mostrou o pior resultado da história, com déficit de R$ 7,5 bilhões.
No momento em que o déficit fiscal quebrava recorde negativo, o mercado passou a acreditar na meta fiscal, e a Bolsa foi buscar seu recorde positivo em 2015.
Pode?
PS: No meio da farra pontual da Bolsa, a Carteira Empiricus fechou março rendendo mais de 300% do CDI no ano, e 170% do CDI desde o seu lançamento, com o book isolado de ações com alta de 12,1% no ano, frente alta de 2,3% do Ibovespa.
A tragédia das commodities
Agora vejamos como foi o preço de algumas das principais commodities que compõem a balança brasileira de exportações em março:
Minério de ferro: -16%
Café: -12,6%
Açúcar: -10,3%
Suco de laranja: -9,4%
Cacau: -2,0%
Infelizmente, o maior pé trocado é o nosso...
Somos uma economia baseada em commodities e de moeda frágil.
Pode acontecer de não estarmos com os fundamentos na melhor forma aqui dentro, mas ainda assim prosperarmos, surfando a onda internacional. A história recente está aí para provar.
Agora, a recíproca não é verdadeira...
Mesmo se estivéssemos com os fundamentos internos no lugar (não estamos), não prosperaríamos contra uma tempestade internacional, por um simples motivo...
Somos o chamado “beta alto”, ou aquele bastante suscetível às variações internacionais.
De tanto desejarmos, a crise internacional de fato chegou...
Chegou pesada e encontrou os fundamentos internos, todos, completamente fora do lugar.
O mundo dá voltas 1
“Enxergamos que, se a Petrobras oferecer bons ativos maduros e de produção, podem ser geradas boas oportunidades”.
As aspas acima são do diretor financeiro e de relações com investidores da... PetroRio (HRT).
Sem dívidas, com R$ 500 milhões em caixa (posição líquida), ela avalia comprar ativos da Petrobras.
Quem imaginaria, um ano atrás, HRT comprando ativos da Petrobras, e não o contrário?
Na bacia das almas, a estatal está se desfazendo de cerca de US$ 13 bilhões em ativos no pior momento possível, em que precisa como nunca de dinheiro (não tem grande poder de barganha), e com o petróleo nas mínimas.
O mundo dá voltas 2
O Tribunal de Contas da União vai convocar quatorze pessoas, sendo quatro ministros da atual gestão, e nomes como Arno Augustin e Guido Mantega, para explicar as pedaladas fiscais realizadas no ano passado.
A contabilidade criativa envolveu dentre outros artifícios:
1. atraso nos repasses para CEF
2. atraso nos repasses para BB
3. leilão de linhas 4G
4. aumento dos dividendos distribuídos pelas estatais, em meio à tomada de dívida pelas mesmas
5. reabertura do Refis
6. leilão de excedente de produção futura do pré-sal com pagamento antecipado pela Petrobras, sem licitação
7. empurrão à balança comercial através da transferência de plataformas de petróleo para Petrobras brasileira para subsidiárias da Petrobras no exterior, sem que elas tenham movido uma palha do lugar…
Essas manobras visavam postergar o impacto sobre as contas públicas, que, ainda assim, terminaram com um rombo inédito, de R$ 32,5 bilhões, o maior da história.
O importante era não aparecer nada disso antes das eleições... Postergar para o ano que vem. Agora pagamos com o ajuste fiscal.
Coincidentemente, a notícia da convocação do TCU de esclarecimentos da contabilidade criativa vem no dia que Levy pediu ao Congresso para adiar o problema da revisão do indexador de dívida dos estados e municípios para 2016.
É mais ou menos assim:
Se o ajuste fiscal der certo este ano, no ano que vem, mais aliviado, o governo assume essa trolha, pagando também o que ficou acumulado.
Agora, se não der...