Miami lidera lista de risco de bolha imobiliária enquanto mercado mostra rachaduras
Bom dia, pessoal! O artigo de hoje foi desenvolvido em parceria com Camila Affonso, sócia do Leggio Group, e Joseph Boukai, consultor do Leggio Group, empresa especializada em avaliação de projetos e negócios de infraestrutura. Nosso objetivo neste texto é discutir como investidores podem analisar empresas de infraestrutura a partir de uma ótica alternativa: a comparação da taxa interna de retorno implícita no preço de suas ações com taxas do mercado de renda fixa, especialmente de instrumentos indexados à inflação (IPCA). Vamos explorar como essa abordagem se relaciona com a previsibilidade dos fluxos de caixa desse tipo de negócio, o perfil de contratos e, por consequência, o risco associado ao horizonte de investimentos. Nesse contexto, o conceito de duration, muito difundido no mundo da renda fixa, nos ajuda também a compreender melhor a sensibilidade desses ativos no longo prazo. Vamos lá?
Empresas de infraestrutura operam em setores essenciais para a sociedade, como transporte, saneamento, energia, telecomunicações, entre outros e geralmente possuem algumas características similares. Normalmente, realizam grandes investimentos iniciais (muitas vezes na casa dos bilhões de reais) em ativos fixos como usinas, rodovias, portos, aeroportos, redes de transmissão e sistemas de saneamento de água, que demoram anos para serem construídos, regularizados, operacionalizados e, principalmente, amortizados. Isso implica dizer que as receitas e lucros são esperados ao longo de décadas, não em poucos trimestres ou anos. Por exemplo, uma licença de concessão portuária pode durar de 20 a 35 anos, com ainda a possibilidade de extensão de prazo em muitos casos.
Outro aspecto fundamental é a previsibilidade trazida pelos contratos de longo prazo: alguns exemplos práticos confirmam essa tese. A Sabesp (BVMF:SBSP3), empresa listada em bolsa sob o ticker SBSP3 e uma das maiores do setor de saneamento no Brasil, possui contratos de concessão de longo prazo com municípios que garantem relativa previsibilidade de receitas até daqui a 20-30 anos. No setor de transmissão de energia elétrica, a Taesa (BVMF:TAEE11) se destaca, com ativos contratados sob regime regulado e concessões que se estendem por décadas também, assegurando fluxo de caixa moderadamente estável e indexado à inflação. Já no setor rodoviário, concessões como a CCR Sorocabana, com períodos de contrato de 30 anos, ilustram também como o retorno financeiro é distribuído ao longo de prazos muito extensos. Esse tipo de estruturação torna claro que o investidor mira um horizonte de muitos anos, não apenas para os próximos dois, três ou mesmo cinco anos (ou, ao menos, deveria ser assim).
Além disso, esses ativos tendem a resistir melhor a choques macroeconômicos (desde que não sejam extremos ou não rompam as bases contratuais), porque muito do risco está “embutido” ou amortizado ao longo do tempo. A visibilidade de longo prazo (como em concessões reguladas) dá uma espécie de “parâmetro de previsibilidade”, o que tende a tornar o fluxo de caixa menos volátil quando comparado a empresas mais dependentes de ciclos curtos ou reféns de viradas bruscas do mercado.
Em relação aos custos, o modelo regulatório de muitos desses ativos também impõe requisitos de manutenção, índices de serviço e mecanismos de reequilíbrio econômico-financeiro caso uma das partes esteja desfavorecida ao longo do contrato. Esses contratos regulados ou concessionários permitem ajustes diante de inflação, mudanças de custos, eventuais legados ou necessidades de investimento não previstos inicialmente.
Portanto, embora os fluxos de caixa não sejam exatamente “prefixados”, eles oferecem uma previsibilidade maior do que em outros casos mais usuais e até um certo nível de proteção em cenários adversos. Isso faz com que investidores também avaliem empresas de infraestrutura como “títulos de renda fixa” de longo prazo com o fator incremental de riscos operacionais, regulatórios e de execução. Nesse sentido, a análise da taxa interna de retorno (TIR) esperada dessas empresas (implícito no preço das ações) em comparação a taxas de títulos de renda fixa, especialmente aqueles indexados à inflação, é bastante utilizada no mercado. Na prática, investidores e, na maioria das vezes, a própria empresa calculam o retorno projetado pelo fluxo de caixa futuro esperado vis à vis o preço atual de mercado da ação da empresa. Normalmente, como o fluxo de caixa é do tipo IPCA+ (ou seja, é ajustado pelo IPCA), a TIR implícita é uma taxa real de juros (isto é, acima da inflação), de modo bastante similar ao que ocorre nos títulos indexados ao IPCA. Essa lógica confere às ações de infraestrutura um caráter híbrido, no “meio do caminho” entre renda variável e renda fixa de longo prazo.
Dessa forma, é bastante comum uma ação de companhia aberta de infraestrutura ser “precificada” como, por exemplo, IPCA + 14%, indicando que o fluxo de caixa projetado equivale atualmente a uma rentabilidade de 14% ao ano acima do IPCA. Dessa forma, o prêmio de risco embutido no preço da ação pode ser facilmente calculado (subtraindo-se a rentabilidade atual de títulos do Tesouro IPCA com duration similar à do fluxo da empresa) e avaliado vis-à-vis qualquer modelo de prêmio de risco que se prefira.
Por falar em duration, este é um dos conceitos mais importantes do mundo da renda fixa e aqui ele contribui como complemento importante nesse entendimento. A duration de um título de renda fixa mede o prazo médio do seu fluxo de caixa, ponderado pelo valor presente de cada montante esperado no futuro. No caso simples de títulos sem cupom, ou seja, apenas com o fluxo relativo ao valor de face no vencimento, a duration iguala o prazo para o vencimento. Quanto maior o prazo de vencimento de um título, naturalmente maior será a sua duration.
Em títulos com pagamentos intermediários, quanto maior a taxa de cupom, menor será a duration do título (claro, todo o resto igual). Ainda no universo de títulos com cupom, há ainda uma relação inversa entre a duration e as taxas de juros de mercado. Quando os juros sobem, a duration diminui, pois os fluxos de caixa mais distantes passam a ter menor peso no cálculo, já que são descontados a taxas compostas mais elevadas.
E por que este conceito é extremamente importante no mundo da renda fixa? Porque quanto maior a duration, mais sensível é o título em relação a variações nas taxas de juros, tendo em vista que uma parte significativa dos retornos está mais distante no tempo. Em outras palavras, a duration é uma medida do risco (isto é, da sensibilidade) do preço de um título em relação a oscilações nas taxas de juros que governam aquele mercado.
Para ilustrar como é comum esse tipo de análise IPCA+, tomei o último relatório público de uma relevante empresa holding de infraestrutura negociada na B3 e recortei a imagem abaixo, logo na primeira folha de informações como um highlight importante do documento:
Neste caso, a TIR implícita calculada é de 17,6% ao ano mais IPCA. Note que esta TIR está baseada no valor da cota no fechamento de agosto (R$ 39,99). Fala-se “cota” (em vez de ação) porque, na verdade, a empresa foi estruturada para pertencer a um fundo (negociado na bolsa), mas na prática, isso não muda muita coisa no que diz respeito aos conceitos apresentados neste artigo. E ainda há o detalhe acima do gross up do imposto de renda: por se tratar de um fundo de infraestrutura, portanto incentivado, não há pagamento de IR, logo para efeito de comparação com títulos IPCA+ (por exemplo, do Tesouro Direto), que pagam imposto de renda, faz-se a conta acrescentando o imposto que seria pago (essa prática é bastante comum no mercado de investimentos incentivados, ou seja, que não pagam imposto de renda). Assim, para efeito de comparação com títulos não incentivados, a TIR real seria de 21,4% ao ano.
E aí, gostaram do tema? Escrevemos com muito carinho e responsabilidade para compartilhar temas que ajudem vocês no dia a dia enquanto investidor. Sintam-s