Como o conflito no Oriente Médio pode afetar o ambiente macro e os mercados

Publicado 13.06.2025, 10:06

Uma nova escalada nas tensões entre Irã e Israel pode levar os preços do petróleo acima de US$ 80, com impacto adicional sobre o dólar americano, que tende a se valorizar. O Federal Reserve já indicava propensão a manter os juros inalterados até o terceiro trimestre, e os desdobramentos recentes reforçam essa perspectiva.

O que aconteceu

Israel realizou ataques coordenados contra instalações nucleares e de mísseis balísticos do Irã, além de atingir comandantes da Guarda Revolucionária e cientistas nucleares. Em resposta, o Irã lançou cerca de 100 drones contra o território israelense, marcando uma escalada expressiva nas hostilidades regionais. Israel declarou estado de emergência, classificou os ataques como preventivos e sinalizou a possibilidade de novas operações.

Embora os Estados Unidos não tenham se envolvido diretamente, o Irã acusou Washington de cumplicidade e pode mirar ativos americanos na região. Até recentemente, os EUA vinham tentando conter a ação israelense devido às negociações nucleares, que agora parecem estagnadas.

Paralelamente, os riscos à segurança marítima aumentaram no Estreito de Ormuz, no Golfo Pérsico e em áreas adjacentes — pontos críticos para o comércio global de petróleo e gás natural liquefeito (GNL). Embora a infraestrutura energética ainda não tenha sido atingida, a possibilidade de ataques futuros ameaça as cadeias de suprimento e tende a pressionar ainda mais os preços. Eventuais restrições ao comércio marítimo podem ter efeitos prolongados, caso o Irã decida adotar bloqueios como forma de retaliação indireta, evitando confrontos diretos com ativos americanos.

Além disso, a recente censura do Irã pela Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) agravou seu isolamento diplomático. Teerã enfrenta agora uma encruzilhada: avançar rumo à quebra definitiva do acordo nuclear — podendo desenvolver armamento em poucos meses — ou retomar negociações em meio a duras sanções econômicas. Um rompimento definitivo mudaria o equilíbrio regional e quase certamente provocaria uma reação militar dos EUA.

Com a expectativa de novos ataques israelenses, o uso de drones por Teerã dificilmente será a resposta final. O regime iraniano precisa decidir como reafirmar sua capacidade de dissuasão, considerando a fragilidade de sua rede de aliados e o risco de desencadear um conflito amplo com envolvimento direto dos EUA. Embora episódios anteriores indiquem propensão à desescalada para preservar a estabilidade interna, o cenário atual permanece altamente volátil.

Impacto nos mercados de energia e cenários possíveis de escalada

O aumento da incerteza geopolítica força os mercados de energia a precificar um prêmio de risco maior, devido à possibilidade de interrupções na oferta. Os primeiros ataques fizeram os preços do petróleo saltarem 13%, embora parte desses ganhos já tenha sido devolvida. Na ausência de interrupções concretas nos fluxos de petróleo iraniano, é provável que esse rali perca força.

Ainda assim, o mercado deve incorporar um prêmio de risco mais elevado no curto prazo, mantendo o Brent entre US$ 65 e US$ 70 por barril.

Caso haja disrupção na exportação de petróleo iraniano, os preços devem subir com mais intensidade. O Irã produz cerca de 3,3 milhões de barris por dia e exporta aproximadamente 1,7 milhão. A perda dessa oferta eliminaria o superávit esperado para o quarto trimestre deste ano e empurraria os preços para perto de US$ 80 o barril.

Neste cenário, os preços tenderiam a se estabilizar entre US$ 75 e US$ 80, com a Opep dispondo de cerca de 5 milhões de barris por dia em capacidade ociosa — o que poderia ser ativado mais rapidamente que o previsto.

Em um cenário mais crítico, uma escalada com bloqueio do Estreito de Ormuz comprometeria os fluxos de petróleo do Golfo Pérsico, por onde transita cerca de um terço do comércio global marítimo de petróleo. Tal disrupção poderia elevar os preços a US$ 120 por barril.

A capacidade ociosa da Opep, concentrada majoritariamente na região, não seria útil neste caso. Seria necessário recorrer às reservas estratégicas de petróleo, o que apenas postergaria os impactos. Preços mais altos seriam, portanto, inevitáveis para forçar destruição de demanda.

A escalada também afeta o mercado europeu de gás natural. Para que os preços avancem substancialmente, seria necessário um cenário extremo — como a interrupção do tráfego no Estreito de Ormuz. O Catar, responsável por cerca de 20% do comércio global de GNL, depende integralmente dessa rota. O mercado global de GNL está atualmente equilibrado, mas qualquer disrupção geraria déficit e intensificaria a disputa entre compradores asiáticos e europeus.

Impactos econômicos e implicações para os bancos centrais

Embora os temores com inflação sejam legítimos, é possível que estejam superestimados. Durante a pandemia e o choque de preços da energia em 2022, o ambiente macroeconômico era mais propício à aceleração inflacionária, amparado por estímulos fiscais substanciais que hoje seriam mais difíceis de repetir, diante de juros elevados e mercados financeiros mais instáveis.

Além disso, o mercado de trabalho estava em situação mais apertada. Em 2022, havia duas vagas para cada trabalhador americano; hoje, essa relação caiu para uma vaga por trabalhador, abaixo dos níveis anteriores à pandemia, o que reduz o potencial de aceleração dos salários.

O aumento nos preços do petróleo reduz substancialmente as chances de o Federal Reserve iniciar cortes de juros no terceiro trimestre — perspectiva que já vinha se enfraquecendo nas últimas semanas. No entanto, espera-se que, até o final do ano, o impacto inflacionário das tarifas comerciais perca força e que a desaceleração nos serviços ganhe tração.

Ao mesmo tempo, os efeitos negativos da guerra comercial dos EUA devem se tornar mais evidentes, especialmente sobre o emprego. O primeiro corte de juros por parte do Fed é projetado para o quarto trimestre, possivelmente com uma redução de 50 pontos-base em dezembro. Um ciclo mais acelerado de cortes pode levar os juros a 3,25% até meados de 2026.

Na Europa, o desafio se amplia para o Banco Central Europeu (BCE). A inflação na zona do euro permaneceu moderada recentemente graças à queda nos preços de energia, mas esse quadro pode mudar. Novos aumentos de custo representam mais um entrave para a indústria, já enfraquecida por incertezas econômicas e geopolíticas. O consumidor europeu poupa mais, enquanto empresas postergam investimentos — um agravamento no Oriente Médio reforçaria esse pessimismo, impactando negativamente o crescimento.

Caso a tensão persista, o cenário europeu pode evoluir para uma combinação de estagnação econômica com inflação elevada. Segundo projeções do BCE, um aumento de 20% nos preços de energia poderia reduzir o crescimento em 0,1 ponto percentual em 2026 e 2027, com impacto inflacionário adicional de 0,6 e 0,4 ponto, respectivamente.

Embora esse cenário extremo ainda não tenha se concretizado, ele dificulta a atuação do BCE, que deverá monitorar com mais rigor a inflação subjacente. Espera-se um corte adicional de juros em setembro, mas a presidente Christine Lagarde deve usar a pausa recente como margem para observar os desdobramentos antes de sinalizar novas reduções abaixo da taxa neutra.

Impacto sobre o câmbio

O dólar se recuperou após os eventos entre Israel e Irã, mas ainda não reverteu as perdas recentes. A pressão sobre os índices acionários americanos limita os ganhos da moeda, cuja sensibilidade ao risco mudou. Caso a crise escale e o petróleo suba mais, o dólar tende a ganhar fôlego, sobretudo por estar atualmente subvalorizado. No entanto, a reação contida indica perda parcial de seu status de porto seguro, com viés estrutural ainda desfavorável.

Esse enfraquecimento está ligado a fatores domésticos nos EUA, e não há expectativa de que eventos externos revertam essa tendência sozinhos. Em caso de desescalada, espera-se retomada de compras no EUR/USD. Já o iene japonês é visto como a melhor proteção cambial diante da atual conjuntura.

Impacto sobre as taxas de juros

Na quinta-feira, os mercados já reagiam à escalada de tensões no Irã, com os títulos soberanos alemães voltando a atuar como ativos de segurança, superando os swaps. Após os ataques confirmados, o movimento inicial de busca por segurança deu lugar a preocupações com política monetária, o achatamento da curva e o avanço nos swaps de inflação de curto prazo refletem receio de um cenário estagflacionário.

Apesar disso, o impacto nas taxas de juros tende a ser limitado. O ambiente já estava instável por conta de tarifas, questões fiscais nos EUA e perspectivas de gasto na União Europeia. A crise no Irã apenas intensifica esse ruído. O mercado ainda projeta mais um corte do BCE até 1,75%, mas reduziu a probabilidade de novas reduções. A taxa de swap de 10 anos subiu ligeiramente acima de 2,5%, mas segue dentro do intervalo recente.

Impacto nos mercados de crédito

Os mercados de crédito têm absorvido fatores externos com relativa resiliência, graças à elevada liquidez, que sustentou a redução de spreads mesmo com aumento da emissão. A princípio, o impacto sobre os spreads deve ser limitado, salvo agravamento do conflito. A reação inicial foi uma leve ampliação, mas o mercado pode retomar a trajetória de estreitamento caso o quadro geopolítico se estabilize.

A longo prazo, a incerteza sobre a saúde financeira das empresas persiste, com preços de commodities elevados e inflação pressionando margens — um fator negativo para o crédito. Setores cíclicos e ligados à indústria, que haviam se destacado recentemente, podem sofrer correções à medida que cresce a busca por posições mais defensivas.

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