À moda da casa
Tem muita coisa relevante acontecendo... Os próximos dias contam com dados importantes como a divulgação do PIB americano e encontros que podem definir o conflito Rússia-Ucrânia. Mas seguimos à nossa moda, novamente...
Em terrinha brasilis, esta é mais uma semana que começa com apostas para a próxima pesquisa eleitoral (Ibope) e com rebaixamento (o 13o seguido) das projeções para o PIB brasileiro, agora em 0,7%. Qual a relação entre um e outro?
Com PIB cada vez menor e Bolsa alimentada pelo rali eleitoral, o Ibovespa se aproxima dos 60 mil pontos.
Que raio de argumento é esse?
Dentre os principais argumentos do Ministro Mantega para desqualificar os “pessimistas”, está justamente a subida da Bolsa. Como afirmou em entrevista ao Valor na semana passada: “A economia está em crise com a bolsa subindo há vários meses consecutivos?”. “Que raio de crise é essa?”
Talvez o Ministro não tenha percebido que o rali da Bolsa é escorado, justamente, em apostas de mudança na política econômica atual. Ainda que por vias tortas, pelo menos ele percebeu que há alguma relação entre economia e o mercado de capitais. Alguém poderia perguntar a Mantega: “Ministro, na sua opinião, por que a Bolsa tem subido? Em especial, por que as ações de Petrobras têm subido?”
O autista (parte 2)
Falando na entrevista de Mantega ao Valor, deixei de “lição de casa” no M5M da última sexta-feira algumas aspas curiosas do Ministro. Tais como:
- a atividade econômica está em franca recuperação
- a indústria automobilística está íntegra
- a inflação chegou em um ponto satisfatório
dentre outras...
No final de semana, o excelente Mansueto Almeida fez o dever para a gente, e publicou texto esmiuçando alguns dos diversos pontos que destacamos. Vale a reflexão. A leitura ajuda a explicar porque o subtítulo da minha tira, na ocasião, havia sido “o autista”, coisa que alguns questionaram por email.
O problema da TJLP
Nessa onda de faz-não-faz ajuste fiscal, o também excelente Nelson Barbosa, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda no governo Lula, tem defendido um ponto extremamente relevante: a necessidade de ajuste da TJLP. A Taxa de Juros de Longo Prazo é usada para corrigir empréstimos concedidos pelo BNDES. Ela está fixada em 5% (ao ano) desde o primeiro trimestre de 2013, quando a Selic estava em 7,25% ao ano. A Selic agora está em 11%, e a TJLP continua em 5%, abaixo da inflação, gerando uma discrepância significativa...
Isso acarreta, obviamente, um grande custo fiscal para o Tesouro, que arca com essa diferença. Explico: o BNDES recebe recursos do Tesouro a custo de TJLP (5%). Com isso, pode beneficiar alguns setores da economia com taxas de juros extremamente baixas - como exemplo as linhas de Finame-PSI do setor automotivo, dentre outros. Mas o custo de captação do Tesouro, por outro lado, é referenciado, grosso modo, em Selic (11%). No final das contas sabemos quem vai pagar essa diferença, via aumento da carga tributária...
Entre ganhadores e perdedores
Ao não assumir que um ajuste da TJLP é necessário, e tampouco que há uma distorção na taxa, a política econômica atual segue privilegiando alguns setores específicos da economia que sequer vêm dando resposta significativa ao subsídio (vide a retração dos indicadores de investimentos). Lembrando: para ter um beneficiado, há sempre de ter um prejudicado.
No exemplo apresentado pelo Nelson Barbosa, essa discrepância da TJLP custa aos cofres públicos o equivalente a R$ 30 bilhões ao ano. Para não aumentar carga tributária de forma mais pronunciada antes de eleição, o governo levanta os recursos por outras vias, dentre elas a aceleração da concessão de ativos públicos à iniciativa privada - além, claro, de abusar da criatividade contábil. Vide os leilões de rodovias, 4G, excedente de produção e campos do pré-sal...
Comprando imóvel mais barato
Chamo atenção, agora, para uma outra distorção de uma outra taxa de juro da economia. Normalmente, as ações de incorporadoras imobiliárias apanham na Bolsa em cenários de alta da Selic. Acontece que historicamente os financiamentos imobiliários estão mais atrelados a outra taxa, a TR (Taxa Referencial). Isso geralmente abre distorção e oportunidade de posicionamento em ações de construção civil. Mas não é esse o ponto relevante aqui...
“Como vemos crise na economia e recomendamos compra de fundos imobiliários? E a bolha? Não parece um constrassenso?”
Primeiro, e mais uma vez: tendência de acomodação e queda gradual dos preços é bem diferente de estouro de bolha (queda abrupta e agressiva dos preços, geralmente disparada por algum colapso de crédito; bolha é um conceito técnico). E fundos imobiliários podem ser um veículo agora para você ter exposição a imóveis mais barata. Pela marcação a mercado (as cotações variam todo dia), o preço dos FIIs já embicou para baixo meses atrás, incorporando uma perspectiva menos favorável aos preços. Enquanto isso, a falta de marcação a mercado e relutância em vender um imóvel físico por preço mais baixo causam a falsa sensação de preservação de valor, postergando esse impacto (de ajuste nos preços) sobre os imóveis físicos.
Sonhático vs. concrético
Para concluir um M5M de excelentíssimos, destaco trecho de Eduardo Giannetti à Folha.
“Com quem se governa e se negocia? Com Lula e Fernando Herinque. Temos todo o interesse em ter os dois como aliados em projetos que interessem o País.”
Unir o apoio de Lula e FHC seria fantástico, mas entre o sonhático e o concrético, ainda há um caminho longo a percorrer. De todo modo, o que fiquei mais triste na declaração de Giannetti foi o fato de ele ter negado que, em caso de vitória de Marina, será o próximo Ministro da Fazenda.
Para visualizar o artigo completo visite o site da Empiricus Research.