Governo central tem déficit primário de R$59,1 bi em julho, segundo pior resultado para o mês
O mês de agosto começou com um novo ponto de inflexão para os mercados globais. A combinação entre sinais mais claros de enfraquecimento da economia americana, o endurecimento da política comercial dos Estados Unidos sob Donald Trump e a manutenção da taxa Selic em 15% no Brasil redefine as perspectivas de curto e médio prazo para os ativos emergentes, especialmente para o real. Com o mercado reavaliando suas expectativas sobre os próximos passos do Federal Reserve, a moeda brasileira ganha tração, mas permanece vulnerável a um ambiente de incerteza geopolítica e riscos fiscais domésticos.
Os dados de emprego nos EUA foram decisivos para essa reprecificação. O payroll de julho trouxe a criação de apenas 73 mil vagas, bem abaixo das expectativas, com revisões negativas de 258 mil postos nos dois meses anteriores. A taxa de desemprego subiu para 4,2% e a média trimestral de criação de empregos caiu para o nível mais baixo desde a pandemia. Apesar da resiliência dos salários (+0,3% no mês, +3,9% em 12 meses), o diagnóstico do mercado é de que a desaceleração do mercado de trabalho ganhou tração e profundidade, elevando substancialmente as apostas de que o Fed promoverá dois cortes de juros ainda este ano, com alta probabilidade de movimento já em setembro.
A resposta do mercado foi rápida: os rendimentos dos Treasuries de 2 anos recuaram mais de 20 pontos-base. Essa virada ocorre poucos dias após Jerome Powell adotar um tom ainda resistente a cortes, o que acentuou a sensação de descompasso entre o diagnóstico do Fed e a realidade dos dados econômicos. A pressão pública exercida por Trump contra o Fed também cresceu, abrindo mais um flanco de instabilidade institucional na condução da política monetária americana.
Paralelamente, o governo Trump impôs um novo pacote de tarifas comerciais, elevando para uma média de 15% as alíquotas de importação dos EUA, o maior nível desde a década de 1930. As tarifas afetam diversos parceiros, mas o Brasil ocupa posição central no conflito: foram anunciadas tarifas de até 50% sobre produtos estratégicos como carne e café, embora com isenções relevantes em setores como aviação, celulose, óleo cru e suco de laranja. O risco imediato foi parcialmente contido, mas o ambiente de instabilidade regulatória e política continua elevando os prêmios de risco em toda a cadeia exportadora.
O Banco Central do Brasil, por sua vez, optou por manter a taxa Selic em 15% ao ano, uma decisão amplamente antecipada pelo mercado. O comunicado reafirma o compromisso com a convergência da inflação, que ainda resiste a retornar à meta, e reconhece o ambiente externo como "mais adverso", especialmente após o anúncio das novas tarifas americanas. A autoridade monetária indica que os juros elevados devem permanecer por um período prolongado, rejeitando qualquer sinalização de afrouxamento no curto prazo. Apesar da desaceleração da atividade e de uma leve melhora nas expectativas inflacionárias, o BC mantém o foco na ancoragem da política monetária e na preservação do canal cambial.
Essa estratégia de manter juros reais elevados, hoje próximos a 10%, tem sustentado o real como uma das moedas emergentes de melhor desempenho em 2025. De acordo com projeções de grandes bancos internacionais, a moeda brasileira ainda está subvalorizada frente ao dólar e deve continuar se beneficiando de três fatores-chave: carry elevado, redução do prêmio de risco local e forte correlação com o yuan, que deve se fortalecer no segundo semestre. Contudo, à medida que se aproximam as eleições presidenciais de 2026, espera-se um aumento na volatilidade, exigindo maior seletividade por parte dos investidores globais.
Fonte: APP da XTB.
No campo técnico, o gráfico diário do USD/BRL mostra a formação de uma zona de consolidação entre R$ 5,36 e R$ 5,65, com o preço atual R$ 5,54 testando a média móvel de 50 dias, que atua como resistência dinâmica. O candle mais recente rejeitou o rompimento da banda superior, sugerindo esgotamento comprador de curto prazo. O suporte mais relevante está em R$ 5,36, enquanto uma eventual quebra acima de R$ 5,65 abriria espaço para teste da média de 200 dias em torno de R$ 5,76, zona que coincidiria com resistência estrutural do canal de médio prazo. O RSI neutro indica espaço para correção ou lateralização, reforçando o cenário de indecisão no curto prazo.
Diante desse cenário, o real segue com fundamentos técnicos e macroeconômicos favoráveis no curto prazo, mas enfrenta um ambiente externo cada vez mais volátil e imprevisível. A combinação entre juros elevados no Brasil e expectativa de cortes nos EUA cria uma janela tática positiva para a moeda brasileira, mas os riscos associados ao protecionismo norte-americano e à proximidade do calendário eleitoral exigem uma postura estratégica e cautelosa por parte dos investidores.