"Isso não pode estar acontecendo"
Agosto passado, estava em férias. Desembarquei em Munique num sábado, ansioso por conhecer a capital da Baviera. Logo após deixar o desembarque, sentei em um banco para me organizar: passaporte, dinheiro, documentos. Levava comigo, em uma pochete tipo doleira, os euros que havia comprado para custear minha estada em solo alemão, bem como dois cartões de crédito. Abro a doleira, que levava junto ao corpo desde o Brasil, e a encontro vazia. Fico atônito. Remonto mentalmente meus passos até ali... ...e lembro do único momento em que, ainda em Guarulhos, precisei abrir a doleira para pegar um dos cartões de crédito. De alguma forma, o restante do conteúdo deve ter caído de dentro dela naquele momento. "Não, isso não pode estar acontecendo." Foi meu pensamento na hora.
Paralisia
Conto esta história por dois motivos. O primeiro é que ela se passa na Alemanha. O segundo, porque naquele momento me vi paralisado diante de uma situação extremamente adversa. Ambas características se fazem, também, presentes na situação que me preocupa hoje.
O que me aflige é que o Deutsche Bank, maior banco alemão, pode estar à beira do colapso.
O problema
Não vêm de hoje as preocupações com a saúde financeira do Deutsche. Rumores a seu respeito já rondam as mesas de operações há vários meses, e seus resultados no último teste de estresse promovido pelo BCE justificaram certa cautela. Além de resultados fracos em anos recentes, estão no cerne da questão litígios, nos Estados Unidos, relacionados a operações conduzidas pelo banco envolvendo hipotecas subprime. O montante em discussão com o Departamento de Justiça americano para liquidar a questão é apontado na casa dos 14 bilhões de dólares. Considerando a atual situação do Deutsche, seria imprescindível à instituição um aumento de capital para arcar com qualquer desembolso superior a 5 bilhões.
A reação
O Deutsche é uma corporation - com capital pulverizado, não tem um acionista controlador definido. Com investidores privados relutantes em injetar recursos adicionais no banco (por razões óbvias!), contava-se no mercado com a possibilidade de o governo alemão promover um socorro à instituição, se necessário. Notícias divulgadas ao longo do final de semana indicam que a chancelerAngela Merkel descartou, em absoluto, a hipótese. Ações do Deutsche desabam cerca de 6 por cento em Frankfurt no momento em que escrevo estas linhas. No ano, acumulam perdas de 52 por cento. Na mínima histórica, as ações negociam hoje à cerca de metade do menor preço visto em meio à crise do subprime.
Grande parte da "ala falante" do mercado insiste que Merkel não tem alternativa se não socorrer o banco. E se ela não o fizer
Coisas ruins acontecem...
Quanto à minha viagem, tudo acabou bem. Consegui me virar com o limite do cartão de crédito que havia tirado da carteira e que provocou toda a cadeia de acontecimentos. Não sei se o final do Deutsche será igualmente feliz. E pior: não tenho dúvidas de que, caso o cenário mais sombrio se concretize, os efeitos serão grandes. Com um socorro governamental, a pior hipótese era a diluição dos acionistas atuais. Problema deles... Sem isso, podemos estar diante de um evento dramático para o sistema financeiro europeu, com inescapáveis repercussões nos demais mercados mundiais.
...então preparemo-nos para elas.
Como disse, impossível abordar toda a questão em uma única edição do M5M. Continuaremos amanhã. Até lá, gostaria que você se fizesse estas perguntas: 1. Você está confortável com o nível de risco do seu portfolio de investimentos? 2. Você tem no seu portfolio ativos que se comportem como um "seguro" caso um cenário de crise internacional se configure?
Caso ainda não o tenha feito, pode ser uma boa hora de se informar a respeito de operações estruturadas. Já falamos sobre algumas oportunidades do gênero no Palavra e, se o assunto for totalmente novo para você, a edição deste mês do Você Investidor.
|