Você acorda toda primeira sexta-feira de mês do mesmo jeito. Sapato engraxado para curtir o boteco no fim do dia, entra espremido no metrô rumo à estação Faria Lima. O aperto cotidiano não impede a trivial espiada no celular, que estampa a agenda diária de indicadores. Antes de entrar no escritório para o call matinal, um breve desvio na padaria. Pão na chapa, um pingado e uma passada de olhos no caderno de finanças. Somos todos filhos de Deus.
O que tem para hoje?
Equipado do notebook, já dentro do escritório, falta uma hora para a abertura da Bolsa. Ops, a amnésia típica das manhãs de sexta, reflexo do whisky de quinta(feira). Quase se esquece, desta vez não vai ter Relatório de Emprego dos EUA, uma das principais referências sobre o estágio de recuperação da ainda maior economia do mundo. Um dos termômetros mais apurados para se medir o timing de retirada dos estímulos econômicos.
Dejà vú! Ontem o M5M já havia te alertado disso. Mas para compensar a falta de dinheiro do governo americano, o Fed, que ainda tem dinheiro, reservou quatro de seus infinitos membros para falar ao mercado. Na falta de um bom termômetro para a retirada dos estímulos hoje teremos quatro, cada um apontando para um lado.
A nossa paralisação
Enquanto a guerra política assola a recuperação (e a visibilidade da recuperação) da economia americana, cá estamos nós, próximos da nossa paralisação. Como? Lembra da padaria, quando ao abrir o caderno de finanças você passou batido pela notícia do pernoite da Marina Silva no TSE? Não deveria. Talvez não tenha percebido, mas estamos a exatamente um ano das eleições presidenciais. A formação das expectativas já começou, e faz tempo. O nosso “shutdown” político será nas urnas.
O final da novela (a das 20h30)
Ontem a Moody’s abateu a perspectiva da classificação de risco brasileira. Ela apenas resumiu um sentimento já bem arraigado entre o setor privado brasileiro. O governo Dilma bombou gastos, crédito, deixou a responsabilidade fiscal em segundo plano, colocou contratos em xeque e - consequência? - abateu a credibilidade da política econômica brasileira em nível internacional. Sim, alguns de nossos principais problemas de crescimento derivam disso. Será o grande tema da propaganda política.
Uma breve pausa aqui
Nesse cenário imposto, ficou bem mais difícil encontrar ação defensiva em Bolsa. Vá ver o que era e o que é Eletropaulo, por exemplo. Um dos principais requisitos para um investimento defensivo é a previsiblidade, que sumiu de setores como elétrico ou saneamento, por exemplo, tradicionalmente os principais expoentes de previsibilidade (demanda inelástica, oferta de bens essenciais).
Nessa onda de gastos do governo, a inflação vai comendo, roubando poder de compra das aplicações convencionais. Mas a própria incerteza atrelada à política econômica acaba, por vias tortas, abrindo oportunidades únicas de preservar capital com um belo retorno real na renda fixa. Lembra das NTN-B? Em qual delas aplicar? Ops, outro dejà vú de ontem...
Cara, cadê meu rating? (capítulo II)
Com essa história toda de perda do rating soberano, quem já levou foi o Itaú, o Bradesco, a Petrobras. O rating dessas empresas é uma derivada do rating nacional. A Moody’s cortou a nota de crédito da estatal petrolífera de “A3” para “Baa1”, ainda grau de investimento, mas manteve a perspectiva negativa para potenciais cortes adicionais, falando em perspectiva de “ampla queima de caixa nos próximos anos”. Os bancos continuam bem capitalizados, não há grande problema aqui. Mas e a Petro?
Dil(e)ma manda na Petrobras
Sem reajuste nos preço dos combustíveis, sem avanços expressivos no programa de venda de ativos e sem evolução signficativa na capacidade de refino e na produção no curto e médio prazo, a medida mais sensata para a Petrobras seria enxugar o seu plano de investimentos - simples assim. Qual alternativa melhor forma para dissipar temores de diluição da base atual de acionistas a partir potencial emissão de ações ou de novas captações via dívida, a custo cada vez mais elevado? Se a alavancagem da Petrobras passar de 4x dívida líquida/ebitda, não há grau de investimento que se sustente.
O mugido do Rodolfo
Depois de tudo isso (do metrô, do jornal, da padaria e da abertura do mercado), você assistiu ao Rodolfo mugir no Vida de Investidor. Antes de pensar qualquer bobagem, saiba que isso tem a ver é com a série de Vacas Leiteiras da Bolsa. Não existem mais ações defensivas na Bolsa? Não da forma como era antes, as que eram no passada. A defensividade agora está atrelada à resiliência de fluxos de caixa, barreiras à entrada, estrutura de capital confortável a ponto de garantir uma política de dividendos crescente e sustentável. O Rodolfo chegou de viagem essa semana. Não me trouxe o litrão de Glenvilet encomendado. Mas veio com esta vaca leiteira na cartola.
Alguém tem que parar o BNDES
O que a queda do rating soberano nos disse? Esgotamento do modelo de crescimento baseado em consumo e crédito, necessidade de se fomentar o investimento. Quem melhor do que o BNDES para isso? De olho nisso, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social irá participar da capitalização da Oi, que ERA uma questão de soberania nacional, agora é uma empresa de controle português. Voltamos à época de colônia de exploração e estamos querendo ajudar a matriz, é isso? O que significa o “N” do BNDES? Você acorda todo domingo do mesmo jeito...
Passa o olho no jornal, veste o Ryder, e vai para o posto, lavar o carro. Volta para casa e abre a primeira, a segunda, a terceira e se posiciona estrategicamente à mesa, esperando a macarronada. Enquanto isso, sua caixa de email receberá um texto ácido sobre a questão do BNDES. Antes de comer, reserve cinco minutos para ele. Sabe como é: digestão de macarronada é algo sempre complexo, e logo depois tem rodada do Brasileirão.
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