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Por que Comprei EUR/GBP Após um Sinal Silencioso nos Gilts (e Como Perdi Mesmo Estando Certo)
Um movimento silencioso, mas suspeito
Na manhã de terça-feira, tudo parecia seguir conforme o script. O Euro despencava após o anúncio de um novo acordo comercial entre os Estados Unidos e a União Europeia — um movimento amplamente dominado pela força do dólar. O EUR/USD caía com força, os índices europeus operavam no vermelho, e o mercado reagia com aquele velho padrão de aversão ao risco. Até aí, nada fora do esperado.
Mas enquanto acompanhava os desdobramentos desse cenário, um detalhe chamou minha atenção: os gilts britânicos (títulos do governo britânico) — especialmente os de 2 e 10 anos — subiam com força nos yields (juros), o que implicava em venda desses títulos. E isso não fazia sentido.
A divergência que ligou o alerta
Em dias de aversão ao risco, a regra é clara: o dinheiro corre para a segurança. Yields dos Bunds alemães (títulos do governo alemão) caem, dos Treasury americanos (títulos do governo americano) caem, dos gilts caem. O fluxo é quase automático.
Mas naquele dia…
O yield do gilt de 2 anos teve um range de +0.85%
O yield do gilt de 10 anos subiu mais de 0.50%
Era como se o Reino Unido estivesse sendo tratado como o elo fraco da corrente.
Essa venda em gilts (yields sobem), em pleno dia de flight to safety (fuga para segurança), era um sinal que não podia ser ignorado. O tipo de movimento que denuncia que há algo não cheira bem no reino da rainha.
A leitura fundamental
A partir desse momento, as peças começaram a se encaixar.
As noticias recentes voltaram à memória: O FMI (fundo monetário internacional) alertando sobre a fragilidade das metas fiscais britânicas em caso de choques inesperados. A dívida pública atingindo 96,3% do PIB, com endividamento surpreendendo para cima em junho. E o comportamento do mercado acionário: o FTSE 250, composto por empresas domésticas, havia caído -0,75%, mesmo com a libra fraca — um sinal de que o problema era interno.
A narrativa era clara: O risco fiscal britânico estava voltando para o radar institucional.
E o mercado… ainda não tinha percebido.
O recuo técnico no EUR/GBP
Enquanto isso, o EUR/GBP havia recuado junto com a queda do Euro frente ao dólar. Uma queda esperada, dentro de uma dinâmica global pró-USD.
Mas havia algo curioso nesse movimento: Nada havia mudado entre Euro e Libra. A fraqueza do Euro era contra o dólar. A fraqueza da Libra… era contra o mundo.
A decisão de entrar
Foi exatamente aí que decidi comprar EUR/GBP.
A queda havia trazido o par de volta a uma zona técnica de compra previamente mapeada. Mas o ponto-chave não era técnico — era narrativo.
O mercado estava olhando para o lugar errado. Enquanto todos os olhos estavam fixos na fraqueza do Euro, ninguém parecia notar o que acontecia com a Libra — e com os gilts.
E como acontece nos melhores trades, o momento de agir é quando a maioria ainda está distraída.
Então vamos resumir a tese: O Euro caiu por conta da força do dólar. A Libra caiu por fragilidades internas, com viés de continuidade. Os gilts britânicos foram rejeitados em um dia de busca por segurança. Isso poderia ser risco fiscal voltando.E quando o risco fiscal ganha tração, a moeda do país costuma sofrer.
Mas o movimento do preço nos dias seguinte não validou a narrativa.
Agora que você acompanhou a construção da tese, vamos à parte divertida — ou, podemos dizer, humana.
Mesmo com todos os sinais alinhados, fechei a operação com prejuízo. E o motivo?
Badminton. Sim, você leu certo.
Sexta-feira, o dia do Badminton (e o dilema do trader responsável)
Duas vezes por mês, tenho um compromisso inadiável com a minha esposa: jogar badminton juntos. E como o mercado não para, costumo agendar essas sessões para dias de feriado nos EUA ou quando espero volatilidade excessiva. (e também por que evito ir nos finais de semana, pois costuma estar lotado)
Além do mais, naquela sexta-feira, a agenda de dados econômicos estava especialmente caótica: Divulgação do Payroll dos EUA. Último dia do prazo para negociações tarifárias com o governo Trump. E uma expectativa de mercado emocional e volátil.
Decisão tomada: Agendar a quadra e evitar o mercado.
E o EUR/GBP…?
Na manhã de sexta, antes do jogo, revisitei a operação: O FTSE 250 havia subido +0.86% no dia anterior. O mercado britânico parecia ignorar completamente a tese de risco fiscal. E o EUR/GBP havia voltado para perto do ponto de entrada
Pensei: “Hoje vai ser caótico. O mercado não está reagindo como esperei. E não estarei na frente do computador. Melhor sair agora e manter a mente limpa para o jogo.”
Fechei a operação. Desliguei o computador. Fui jogar.
E quando voltei a olhar o gráfico…
Pois é.
O mercado finalmente acordou para a narrativa que eu havia antecipado dias antes.
Mas eu já tinha saído. Com um prejuízo pequeno, é verdade, mas prejuízo.
E por que esse trade valeu a pena mesmo assim
Porque operar bem não é sobre estar certo sempre. É sobre seguir o processo com consistência.
Eu identifiquei o sinal, construi a tese, esperei a entrada certa, gerenciei o risco com responsabilidade, e saí do mercado quando entendi que não poderia acompanhá-lo.
Esse é o tipo de operação que gera consistência: Narrativa clara, execução disciplinada e uma mentalidade que prioriza o longo prazo.
Considerações finais
Esse trade foi mais do que uma posição comprada em EUR/GBP. Foi uma demonstração de que, mesmo quando o mercado parece ignorar os sinais, o importante é ver o que poucos veem e saber quando é hora de agir — e especialmente quando é hora de pausar.
Porque, no fim das contas, consistência não é ganhar sempre. É fazer a coisa certa todas as vezes.
Até a próxima operação.