Todo investidor, mesmo o iniciante, já deve ter ouvido a expressão muito comum no mercado de ações: comprar no boato, e vender no fato.
Implicitamente, a frase acima destaca que as informações circulam, e nem sempre o investidor tem certeza desta informação, que em um momento seguinte, pode se revelar tanto verdadeira, como falsa.
O mercado financeiro como um todo e, especialmente o de ações, é uma ‘máquina’ devoradora de informações. E uma das suas características atuais que mais chamam atenção é a rapidez com que ocorrem mudanças de cenários com o respectivo impacto no preço dos ativos.
Notícias vindas do outro lado do planeta impactam as ações de empresas brasileiras a todo instante. Por exemplo: basta uma projeção um pouco abaixo do esperado na demanda por minério de ferro por parte da China que as ações da Vale (SA:VALE5) começam a sofrer desvalorização no mesmo instante em que se publica a notícia.
Essa agilidade de informações e seus efeitos fazem com que uma série de conflitos de interesse possam ser gerados. Muitas vezes antes que as fontes possam ser checadas a notícia já tomou proporções enormes e o mercado financeiro já foi impactado.
O simples fato de uma notícia conseguir impactar na variação no preço de ações é motivo para termos muito cuidado ao operar. Já que este efeito ocorrerá sendo a notícia verdadeira ou não.
Nesse contexto, tem sido cada vez mais comum o aparecimento de notícias falsas ( em inglês: fake news), boatos, análises e comentários exagerados.
Um dos casos que mais chamaram atenção recentemente foi sobre a suposta venda do Twitter. A notícia dizia que a empresa seria vendida por US$ 31 bilhões. Isso fez com que as ações da companhia disparassem 8% mesmo com toda a história desmentida.
Mas por que os indivíduos lançam boatos, notícias falsas ou exageradas nos meios de comunicação em massa? Para entendermos e nos precavermos contra as “fake news”, notícias falsas, devemos entender antes como o mercado recebe informações, verdadeiras ou falsas.
Pois bem. A rapidez com que o mercado opera por vezes gera desconforto em investidores iniciantes, por outro lado, cria boas oportunidades para operadores de curto e curtíssimo prazo, ou seja, aqueles que em último caso compram e vendem ações no mesmo dia (day trade).
Para investimentos de prazo maior é possível analisar com mais cautela os resultados operacionais da empresa, suas condições de mercado, seus números, e chegar a uma conclusão mais precisa. Porém, no curtíssimo prazo a ferramenta que possuímos para tomada de decisão de compra e venda de ações podem ser baseadas em análise gráfica, ou em expectativas, projeções, em grande parte relacionadas a anúncios, declarações, variações de preço, mudanças de cenários, etc.
Sendo assim, é uma tarefa complexa tentar antever esses fatos que alteram os preços das ações e que podem gerar oportunidades de ganhos no curto prazo. Expectativas podem não se confirmar, projeções ou notícias podem estar erradas, e em último caso, podem ser falsas, gerando oscilações de mercado, fazendo com que o investidor seja prejudicado.
A lógica seria a seguinte: caso queira obter um bom ganho no curto prazo, devo tentar me orientar com antecedência baseado em análises gráficas e projeções e assim identificar uma tendência (baixa ou alta) para o ativo. De preferência anteceder a média do mercado, pois só assim conseguirei um bom lucro. Há, portanto, um incentivo em cada vez mais antecipar fatos para comprar o papel enquanto ainda está barato e vender mais caro quando a alta se consolidar.
No limite, quem mais conseguiria antecipar os fatos que poderiam ocasionar variações de preços? Os mesmos que geraram, correto?
Deste modo, há um enorme incentivo para que haja um “mercado” onde a notícia vem de fonte privilegiada ou até mesmo seja criada. As notícias verdadeiras, falsas e os boatos são publicados com o aval e auxílio daqueles que geraram o fato ou estiveram próximos e tiveram informação privilegiada, o indivíduo ou grupo com antecedência já comprou ou vendeu os papéis e apenas espera tornar-se público através de terceiros o fato que impactará na variação dos preços, em seguida realiza a operação inversa.
Repercussões
Atualmente a SEC (Security and Exchange Comission), correspondente da nossa Comissão de Valores Mobiliários (CVM), investiga 27 casos de indivíduos ou firmas suspeitas de contratarem empresas de comunicação para gerarem publicidade para suas próprias ações. Essas firmas em sequência contrataram jornalistas para publicarem artigos com inverdades a respeito dessas empresas. Foram mais de 250 artigos com falsas declarações.
De acordo com a legislação, se uma empresa paga outra para publicar informações isso deve estar expresso no documento.
No Brasil, dois casos não tão recentes enquadram-se neste quesito.
Em 2003 a CVM proibiu um acionista da Cosipa (Companhia Siderúrgica Paulista) de fazer negócios com ações no país por um ano depois que ele tentou manipular preços pela internet.
De acordo com o órgão regulador do mercado de capitais, o investidor divulgou em um fórum da corretora de ações on-line InvestShop uma notícia falsa de que a Cosipa iria promover um programa de recompra de ações por um preço acima da cotação em Bolsa.
Outro caso, ocorreu em 2008 quando o diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP), Haroldo Lima, declarou que o bloco BM-S-9, conhecido como Carioca, poderia ser alçado ao posto de terceiro maior campo de petróleo do mundo com reservas de aproximadamente 33 bilhões de barris de óleo equivalente. Baseado nessa informação divulgada por um membro do governo o mercado se viu otimista e os papéis ordinários da Petrobras (SA:PETR4) chegaram a subir 10%.
Como se precaver contra notícias falsas e boatos?
Acreditamos que em primeiro lugar deve-se checar a fonte: São sites conhecidos, confiáveis, possuem crédito com seus leitores, possuem algum histórico problemático? O articulista ou colunista entende do que fala, tem bagagem profissional? Há algum conflito de interesses por trás? Estas são questões a serem levantadas em um primeiro momento.
Ao ler a publicação atentar para termos que os jornalistas usam para se isentar de responsabilidade, como: teria, supostamente, não se sabe ao certo, há fortes indícios, etc.
Nunca é demais se perguntar: se esta informação é tão importante, por que ele está a dividindo comigo?
O site de Relação com Investidores da empresa é também sempre uma boa fonte de informações. Lá você consegue consultar informações passadas sobre resultados operacionais, projetos e movimentos internos que a empresa fez, além de possuir contato direto com profissionais que estão prontos para esclarecer dúvidas.
Analise os conflitos de interesse. Há muitos sites de informações com forte interesse em publicar informações que estimulem seus leitores-investidores a operações, por estarem atrelados a entidades que operacionalizam estas operações.
Devemos redobrar nossas atenções como investidores e leitores, já que, a internet possibilitou por bem ou por mal, uma enorme profusão de sites, blogs, e fóruns, com respectivas “autoridades” em investimentos, e nas quais são feitas recomendações de ações. No entanto, nem todos tem autorização para recomendar decisões de investimentos em ações.
Opiniões de casas independentes costumam ser um bom parâmetro. Consulte sempre profissionais da sua confiança a respeito do ocorrido. Lembrando que recomendações de ações só podem ser feitas por profissionais com CNPI (Certificado Nacional de Profissional de Investimentos), devidamente reconhecidos pela CVM ( Comissão de Valores Mobiliários).
Por Shin Lai e João Paulo Freitas (Upside Investor)