Publicado originalmente em inglês em 13/10/2020
O presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, escolheu o momento errado para reiterar a necessidade de mais estímulo fiscal na última terça-feira, já que seu alerta das consequências "trágicas" ocorreu horas antes de o presidente Donald Trump interromper as tratativas em torno de um amplo pacote de auxílio contra a covid-19.
Embora Trump tenha recuado mais tarde, ainda não havia previsão de um acordo entre a Casa Branca e os democratas no congresso para um novo estímulo. No momento em que escrevo, esse impasse continuava.
Os riscos de intervenção política são assimétricos, afirmou Powell durante seu pronunciamento em vídeo à Associação Nacional de Economia Empresarial.
“Um suporte insuficiente enfraqueceria a recuperação, criando dificuldades desnecessárias para as famílias e empresas”, ressaltou Powell.
“Por outro lado, os riscos de excesso parecem menores por enquanto. Mesmo que as ações políticas acabem se mostrando maiores que as necessárias, não serão descartadas”.
A ausência de estímulo econômico poderia desencadear uma dinâmica recessiva, alertou o presidente do Fed, já que a fraqueza leva a mais fraqueza. “Um longo período de progresso desnecessariamente lento pode continuar exacerbando as disparidades existentes em nossa economia”, disse Powell. “Isso seria tráfico.”
Nuances de opinião, mensagem de paciência
O chefe do Fed de Minneapolis, Neel Kashkari, corroborou a visão de Powell de que é necessário mais auxílio governamental. “Haverá enormes consequências se deixarmos as coisas seguirem como estão, e a crise acabará ficando muito pior”, declarou à CNBC.
“Se não apoiarmos as pessoas que perderam seus empregos, elas não conseguirão pagar suas contas, o que repercutirá na economia, fazendo com que a crise seja muito pior."
No entanto, o pedido dos banqueiros centrais não pareceu convencer os políticos. Alguns conservadores chegaram a criticar as autoridades do Fed por se meter no gasto governamental. Eles acusaram Powell de colocar em perigo a credibilidade e a independência do Fed ao querer participar do debate político. Alguns questionaram a eficácia do estímulo fiscal.
Outros formuladores da política do Fed foram mais taxativos na semana passada. Nos últimos dias, ficou mais evidente a contundência dos membros do Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc), órgão responsável por debater a política monetária a cada seis semanas, formado por cinco membros do conselho de governadores sediado em Washington e pelos presidentes dos 12 bancos regionais do Federal Reserve.
Suas manifestações dão uma boa ideia das nuances de opinião do comitê, além de indicações da direção da política monetária.
Eric Rosengren, diretor do Fed de Boston, reforçou sua posição mais rígida no comitê, criticando a política de juros baixos do Fed que, segundo ele, aumentou a tomada de risco antes da pandemia, o que pode desacelerar a recuperação mais do que o esperado. Na quinta-feira, em um pronunciamento virtual à Universidade de Marquette, em Milwaukee, ele afirmou:
“O aumento dos riscos no mercado imobiliário comercial e a alavancagem no setor corporativo, antes da pandemia de covid-19, devem resultar em mais falências e maior desemprego durante essa crise”.
Os defensores do aperto monetário geralmente defendem taxas de juros mais elevadas, enquanto os partidários do afrouxamento defendem maior flexibilidade e juros mais baixos.
O presidente do Fed de Chicago, Charles Evans, que defende o afrouxamento, afirmou na semana passada que, se o Fed tivesse adotado uma abordagem mais flexível da inflação antes, provavelmente não teria aumentado os juros de 2015 a 2019, um movimento que o banco reverteu rapidamente.
Powell anunciou em agosto que o Fed não elevaria mais as taxas referenciais preventivamente, para combater a inflação, tolerando preços temporariamente acima da meta de 2% para atingir seu objetivo de máximo emprego.
“É bastante provável que essa estratégia evitasse a elevação dos juros em 2015 e 2016", declarou Evans em seu pronunciamento virtual à NABE. ”Uma política mais frouxa teria feito com que a economia real ficasse mais resiliente aos ventos contrários de 2018 e 2019", complementou.
Mas Esther George, diretora do Fed da Cidade do Kansas, deu novas nuances sobre esse novo marco. Ela esclareceu que a nova política seria “tolerante" à inflação mais alta, mas que isso não representava "uma promessa de incentivar" a inflação através de uma política monetária relaxada. Segundo seu discurso em vídeo para a Universidade Estadual de Wichita, em Kansas, trata-se de “uma mensagem de paciência”.