Quanto à elevação das taxas de juros nos EUA, eu as descartei durante muito tempo. Finalmente, no mês passado (dez/2015), o FOMC deliberou pelo aumento dos juros em 0,25% depois de vários anos de juros nominais quase zerados.
De fato, acredito que a verdadeira justificativa para uma alta dos juros básicos norte-americanos pode ser uma tentativa de frear a alta do mercado de ações nos EUA, desestimulando a alavancagem especulativa nos mercados financeiros. Mas tal atitude também tem outro efeito bastante interessante. Ela enfraquece o temível Estado Islâmico! A alta dos juros nos EUA acaba por fortalecer o dólar e, consequentemente, depreciar o petróleo. Ainda que isso seja ruim para os EUA em vários sentidos (por exemplo: várias empresas americanas de petróleo estão notoriamente alavancadas em dívidas), o petróleo mais barato, assim como foi determinante na insolvência da União Soviética na década de 1990, também poderá causar sérios problemas para a disponibilidade financeira do Estado Islâmico. Apesar de nada ter a ver com os objetivos institucionais e declarados do FOMC (Federal Open Market Committee) ou do Federal Reserve System (Banco Central dos EUA), esse é um fator bastante importante e tem que ser levado em conta no atual cenário geopolítico.
Os noticiários internacionais já revelaram na semana passada que o apoio financeiro fornecido pelo Estado Islâmico aos seus militantes foi reduzido pela metade! Uma redução bastante expressiva e coerente com a queda no preço do petróleo, que chegou a ser cotado em US$ 27 na mesma semana, pouco mais de um mês depois da elevação da taxa de juros nos EUA.
Para quem acha improvável que o FOMC esteja olhando para outros interesses que não a vigília da inflação e do desemprego, aos quais formalmente deveriam estar atentos, deixo as questões:
Por que aumentariam os juros quando a inflação ainda se mostrava bem mais baixa que na maior parte dos vários anos anteriores?
Por que juros mais altos quando a participação da população civil na força de trabalho encontra-se tão baixa?
A alteração no cálculo da taxa de desemprego oficialmente divulgada nos EUA, depois da crise de 2008, roubou-lhe a credibilidade. Por isso, a taxa de participação da população civil na força de trabalho me parece bem mais relevante.
Resta saber até quando o FOMC será capaz de manter sua atual política econômica, uma vez que a economia já mostra importantes desafios à frente.
Ontem (28-jan-2016), a divulgação oficial para as encomendas de bens duráveis nos EUA despencaram 5,1%. Se isso não bastasse, os dados anteriores foram submetidos a uma revisão para baixo!
Juntamente a essas quedas nas encomendas de bens duráveis, que por si só já são preocupantes, outros dados sugerem potenciais problemas à frente:
A desaceleração do crescimento e dos gastos pessoais dos americanos...
A desaceleração e já contração da produção industrial nos EUA...
O enfraquecimento das condições para a indústria manufatureira e uma queda nas vendas de habitações já existentes...
Uma desaceleração nos números das folhas de pagamento e horas trabalhadas em empregos fora da atividade agropecuária rural...
E a desaceleração dos lucros das empresas em relação ao produto interno bruto dos EUA...
Pelo que venho observando, diferentes bancos centrais cometeram erros nos últimos anos. O do Brasil foi um exemplo, corrigido com um verdadeiro “cavalo de pau” na tendência dos juros. Mas se no caso brasileiro, o erro foi para baixo, outros bancos centrais, de economias mais avançadas, se precipitaram em uma inversa e prematura elevação dos juros. Na Suécia, tentaram puxar a carroça à frente dos bois: em 2010, os juros suecos (de 0,25% a.a.) estavam no mesmo patamar do FED, mas o Sveriges Riksbank imaginou que haveria espaço para iniciar uma alta dos juros. A alta durou pouco mais de um ano, antes que fossem forçados a reconhecer o erro e voltar a baixar os juros. Hoje a taxa lá se encontra NEGATIVA!
Crises econômicas sempre vêm e vão. Mas esta não: ela é diferente, complexa, demográfica e exacerbada pelo endividamento generalizado. Ela veio para ficar por muito mais tempo!
O reiteradamente desesperado BoJ (Banco Central do Japão) decidiu hoje (29-jan-2016) negativar a taxa de juros por lá. A taxa de depósito de +0,1% a.a., que o banco central pagava para custodiar o dinheiro dos bancos comerciais excedente às reservas obrigatórias, passa agora a ser negativa em -0,1% a.a.. O desespero é óbvio na tentativa de empurrar crédito à força e ressuscitar tanto a inflação como o dinamismo econômico. Aquela velha utopia do foie gras (fuagrá) financeiro, sobre o qual já escrevi anos atrás, parece jamais ter fim. Se ao menos o crédito dependesse de uma decisão unilateral dessas...
A situação realmente não parece permitir uma alta dos juros, como no recente caso dos EUA, mas também é bobagem e perigoso forçar taxas negativas, como no atual caso da Europa e do Japão, pois o crédito não pode ser empurrado à força numa sociedade que envelhece e se vê diante de uma menor população economicamente ativa nos próximos anos. Tal comportamento falacioso parece típico do planejamento central de um presunçoso Politibüro dos tempos da guerra fria. A ansiedade de estipular o preço do dinheiro (leia meu texto sobre taxa de juros) artificialmente acima ou abaixo daquele que seria natural e bilateralmente alcançado pelo equilíbrio entre a oferta e a demanda de capital no mercado, bem como uma avaliação do risco embutido, está fadada ao fracasso no longo prazo. É só uma questão de tempo. Nossa economia de mercado está sucumbindo aos próprios exageros capitalistas gananciosos e à ausência ou inadequação de regulamentações preventivas e éticas. Agora, já desesperada, tenta corrigir seus excessos cometendo ainda mais erros.
Não sou nenhum profeta do apocalipse, nem sinto qualquer mórbido prazer pessoal ao ver coisas tristes e desagradáveis acontecendo. Além disso, para meu próprio benefício, seria muito mais fácil e desejável obter rentabilidade nos investimentos com um cenário positivo para os mercados. Entretanto, a economia, não só brasileira como mundial, já se mostra muito mais problemática do que gostaríamos de crer. Mesmo assim, posso me orgulhar de ter permanecido suficientemente lúcido e antecipadamente alerta para vários fatos que vêm se desenrolando nos últimos anos.
Para não deixar dúvidas, publiquei algumas análises bastante certeiras! Fazer uma análise econômica e redigir conclusões próprias e objetivas sobre o futuro é expor a face à férula de muitos leitores, colegas investidores e profissionais do mercado.
Em 2011, com o dólar ainda em R$ 1,77, eu compilei minhas razões e argumentos para apostar na valorização da moeda dos EUA. Para muita gente naquela época, eu parecia até blasfemar, uma vez que o banco central norte-americano vinha imprimindo dólares como nunca antes. Com tamanha expansão da base monetária nos EUA, a maior parte das pessoas apostava na desvalorização do dólar. Ora, a moeda já vinha perdendo valor por muitos anos no mercado internacional. Mesmo antes do início do Quantitative Easing (QE = impressão de dólares).
Podemos até lembrar a notória derrocada da Sadia, anos antes. A forte e tradicional empresa de alimentos brasileira havia acreditado tanto na continuidade da desvalorização do dólar, que se permitiu um abuso fatal! Em um exercício de inaceitável audácia especulativa, muito mais cabível à ousadia de algum hedge fund do que ao espectro de atividades esperadas de qualquer indústria alimentícia, a Sadia se afundou alavancada em uma enorme aposta especulativa contra o dólar no mercado de derivativos cambiais. O equívoco gerou gigantescos R$ 2,5 bilhões de perdas em 2008 e o primeiro resultado negativo em 64 anos de história da empresa! O prejuízo contabilizado foi tamanho que, enfraquecida, a empresa sucumbiu à concorrente (uma vez associada à Perdigão, viria a dar corpo à atual Brazil Foods S.A.). Mesmo assim, aquela efêmera apreciação do dólar parecia estar mais relacionada a uma aversão ao risco e à fuga de capital de outros mercados mundiais. O dólar voltou a cair mais tarde, chegando a R$ 1,65 em outubro de 2010.
Aos olhos de muitos, aquela efêmera apreciação ocorrida entre 2008/2009 pareceu um espasmo temporário. Parecia-lhes mais sensato acreditar que a desvalorização do dólar só poderia e deveria continuar, ou mesmo se acentuar, devido à desesperada impressão de moeda norte-americana que se iniciou ao fim de 2008. Com tantos dólares novinhos chegando ao sistema financeiro, o argumento era de que o inchaço da base monetária, só poderia gerar ainda maior queda do poder aquisitivo do dólar.
Minha análise foi antagônica a tais expectativas e enfaticamente favorável ao dólar. Dos R$ 1,77 na época (2011), o dólar já alcançou os R$ 4,19 neste início de 2016. Um ganho denominado em R$ de 137% em 4 anos. Mas essa expressiva mudança cambial não se deve apenas a nossa própria crise econômica e política, uma vez que o dólar (ilustrado abaixo) também se valorizou diante das principais moedas internacionais.
Também quanto ao petróleo, minha análise de agosto de 2014 (exatamente o mês que precedeu o início da derrocada do petróleo), embora incômoda para muitos leitores, foi recompensada pelos eventos que pudemos observar dali em diante.
Claro que o bom resultado de minhas análises anteriores não confere qualquer garantia de infalibilidade à minha atual perspectiva para a economia... Mas creio que, ainda por uns bons anos, ficarei devendo as saudosas palavras e mensagens de otimismo que tanto e tantos gostaríamos de ouvir.
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