No açúcar, a única certeza é a incerteza

Publicado 10.02.2025, 09:04
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Na semana passada, destacamos três fatores que contribuíram para a queda do mercado de açúcar em Nova York: a desvalorização do real em relação ao dólar, a pressão dos fundos especulativos, que seguem vendidos a descoberto em 127 mil lotes, e a percepção de que a safra 2025/26 será significativamente maior do que o esperado, mesmo após os incêndios e a seca que afetaram parte dos canaviais no último terço do ano passado.

Apesar dessa pressão, estruturalmente, o mercado de açúcar dificilmente permanecerá abaixo dos 18 centavos por muito tempo. A curva do real, que reflete o cupom cambial e, portanto, converte dólares em mais reais ao longo do tempo, cria um ambiente que pressiona ou, no mínimo, dificulta a recuperação do mercado em centavos de dólar por libra-peso. O funcionamento desse mecanismo pode ser entendido da seguinte forma: quando uma usina determina uma fixação de preço em reais por tonelada, o valor final dependerá da quantidade de reais oferecida pelas instituições financeiras e da cotação do açúcar em Nova York. Isso significa que a usina não observa exclusivamente a cotação em Nova York, mas sim o produto dessa cotação com a taxa de câmbio, que, por sua vez, é influenciada pela diferença entre os juros internos e externos.

Mesmo com esses desafios, é pouco provável que o mercado se mantenha abaixo dos 18 centavos por um período prolongado. O mercado interno indiano, por exemplo, já opera acima desse patamar, e o custo de produção no Centro-Sul ainda garante uma rentabilidade bastante atrativa. Atualmente, nos níveis mais baixos, o custo de produção do açúcar FOB Santos está abaixo de 15 centavos de dólar por libra-peso. No entanto, apenas o Brasil consegue ofertar açúcar nesses valores, uma vez que nenhum outro país consegue produzir abaixo de 18 centavos.

Vale ressaltar que a dependência global do açúcar brasileiro tem dois lados. Por um lado, qualquer aumento na produção nacional, como o que veremos neste ano, com 1.3 milhão de toneladas adicionais, exerce uma forte influência negativa sobre o mercado. Por outro, qualquer fator adverso – seja climático ou de outra natureza – pode reduzir a disponibilidade do produto e aumentar a volatilidade dos preços. Esse equilíbrio delicado reforça a importância do Brasil na dinâmica global do açúcar e explica as flutuações do mercado diante de qualquer mudança relevante no cenário produtivo.

Nesta semana, o contrato futuro de açúcar em Nova York para vencimento em março encerrou a 19.31 centavos de dólar por libra-peso, registrando uma leve queda de apenas 3 pontos em relação à semana anterior. Os demais contratos, com vencimentos de maio de 2025 a outubro de 2027, oscilaram dentro de uma faixa estreita, variando entre uma queda de 10 pontos e uma alta de 10 pontos, sem grandes alterações.

O real teve uma valorização modesta de 0,72% frente ao dólar, encerrando a semana cotado a 5,7988. As usinas continuam cautelosas em relação às fixações de preço, mas encontram no NDF (Non-Deliverable Forward), um contrato a termo de câmbio com liquidação financeira, condições bastante atrativas. Desde a safra 2021/22, a rentabilidade na exportação de açúcar tem sido satisfatória. Para a safra 2024/25, o preço médio das fixações ficou em 108.38 centavos de real por libra-peso, enquanto a safra atual já registra um preço médio ligeiramente superior, de 108.70 centavos de real por libra-peso.

Os fundamentos do açúcar estão fortemente atrelados a eventos climáticos. Apesar de uma oferta global maior esperada para este ano, o superávit projetado não parece ser suficiente para impactar significativamente os preços. Um excedente de 2.6 milhões de toneladas, por exemplo, equivale a apenas cinco dias de consumo mundial, o que dificilmente altera a trajetória de preços. No entanto, a demanda parece menos aquecida, reflexo do volume expressivo exportado pelo Brasil no último ano, que somou 38.2 milhões de toneladas.

Historicamente, o maior preço médio do ano nunca ocorreu no período de abril a julho nos últimos 25 anos, o que sugere que esse não seja o melhor momento para fixações por parte das usinas. Por outro lado, em 76% dos casos, os preços mais altos do ano foram registrados entre novembro e fevereiro, um período que pode oferecer melhores oportunidades de fixação.

No mercado de combustíveis, a gasolina segue defasada em relação ao mercado internacional, embora não haja expectativa de reajustes por parte da Petrobras (BVMF:PETR4). Atualmente, o preço da estatal está 9.5% abaixo da paridade internacional, mas um ajuste nessa magnitude parece improvável.

Do ponto de vista técnico, segundo nosso colaborador Marcelo Moreira, o contrato de março de 2025 encontrou forte resistência na média móvel de 200 dias, em 20,39 centavos de dólar por libra-peso, e está ligeiramente abaixo da média móvel de 9 dias, que se encontra em 19.46 centavos. O próximo suporte relevante está em 17.74 centavos, enquanto as resistências permanecem em 19.46 centavos, 20.39 centavos e 20.94 centavos. Já o contrato de julho de 2025 fechou a 17.50 centavos, com suporte em 16.50 centavos e resistências em 17.95 e 18.65 centavos.

Um executivo do mercado, em busca de respostas, questiona: “Como é possível que, mesmo com tantos agrônomos, incontáveis viagens para inspecionar os canaviais e uma montanha de dados coletados no campo, ainda sejamos incapazes de fazer uma previsão minimamente precisa da safra de cana? Em 2023/24, começamos estimando 595 milhões de toneladas. Quando uma trading asiática ousou projetar 617 milhões, poucos levaram a sério. No fim, fechamos com 654 milhões. Na safra 2024/25, o impacto dos incêndios e da seca foi superestimado, enquanto a expansão de área sequer estava no radar. E agora, para 2025/26? Onde vamos errar desta vez?”

Talvez a verdadeira questão não seja a precisão das estimativas, mas sim a ilusão de controle sobre um setor que depende de variáveis imprevisíveis. Será que os modelos de previsão não estão presos a uma visão excessivamente técnica, ignorando os fatores comportamentais, políticos e logísticos que moldam a realidade do mercado? Ou será que a resistência em aceitar projeções fora do consenso revela um viés coletivo que só se desfaz quando os fatos já estão consumados? Enquanto seguimos revisando números e ajustando expectativas, o mercado continua provando que a única certeza que temos é a incerteza.

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