O mercado futuro de açúcar em NY apresentou durante a última semana mais uma performance devastadora. Mergulhou de cabeça com quedas que somaram 131 pontos no acumulado da semana, ou quase 29 dólares por tonelada, no primeiro vencimento, que fechou cotado a espantosos 13.74 centavos de dólar por libra-peso.
Os demais meses ao longo da curva que se estende até maio/2020 também tiveram quedas entre 23 e 29 dólares por tonelada. Os preços alcançaram o nível mais baixo desde 23 de fevereiro de 2016. Ocorre que naquele dia, o fechamento de NY com o real bastante machucado equivalia a R$ 1,274 por tonelada. O fechamento desta sexta-feira, em reais por tonelada, foi 19.36% menor: R$ 1,027 por tonelada. Estamos, na verdade, no menor preço em reais por tonelada desde 22 de setembro de 2015.
O colapso no preço do açúcar desde a máxima no ano, em 6 de fevereiro, de 21.49 centavos de dólar por libra-peso foi 775 pontos em 82 pregões, uma queda de 36%. No dia 17 de fevereiro, alertamos aos clientes que se nada mudasse nos fundamentos, os preços iriam despencar a partir de abril, segundo nosso modelo. O preço médio do fechamento de NY em abril foi de 16.32 centavos de dólar por libra-peso 20% inferior ao preço médio de fevereiro (20.41 centavos de dólar por libra-peso).
Queda dessa magnitude (775 pontos em 82 pregões) são raras. A última vez foi em maio de 2012 quando o mercado iniciava a safra 2012/2013 a preços bem inferiores do que aqueles praticados no pico da entressafra. De 2010 até hoje, se compararmos o fechamento do dia com a máxima registrada nos 82 pregões anteriores, em média, chegados a 380 pontos. O que vimos nesta semana foi o dobro.
Gostaria de chamar a atenção para alguns pontos que contribuíram ao longo dos últimos meses para a queda vertiginosa nos preços do açúcar. O primeiro golpe foi desferido com a entrega física de açúcar na expiração do contrato futuro de março protagonizada por um grande produtor, exatamente no período de entressafra no Centro-Sul. Na leitura do mercado físico, se um grande produtor entrega 900 mil toneladas no final de fevereiro, essa entrega é uma clara demonstração que não existe comprador interessado e a bolsa acaba sendo o único destino final possível do seu hedge.
O segundo baque foi o câmbio que, contaminado pelo tenebroso quadro político nacional, paralisa a economia, aumenta a percepção de risco e desvaloriza as commodities, entre elas, o açúcar.
O terceiro golpe, mas não menos importante, foi a redução do preço da gasolina pela Petrobras (SA:PETR4) em 5.4% aumentando o temor de que teremos mais açúcar sendo produzido em função da pressão sobre a paridade com o etanol, provocando uma avalanche de vendas no contrato futuro de açúcar em NY.
Além dos pontos mencionados, temos alguns riscos escondidos que podem emergir a qualquer momento trazendo ainda mais devastação aos preços. Fomos muito claros em nossos comentários que somos completamente avessos a recompra de hedge por parte das usinas, pois isso viola as boas práticas de gestão de risco. Sabe-se que algumas lançaram mão dessa alternativa para gerar caixa, pagando um pedágio para as tradings. Agora se encontram na situação de perderem 200 pontos e terem que voltar ao mercado, em algum momento, para fixarem suas vendas. Isso vai pressionar o mercado mais cedo ou mais tarde.
Além dessa estratégia nociva, existem cerca de 24.000 lotes de puts (opções de venda) vendidas entre o preço de exercício de 15 e 13 centavos de dólar por libra-peso para financiar a compra de calls fora do dinheiro, cuja maior parte refere-se às estruturas que objetivavam auferir lucros numa eventual recuperação de preços, o que acabou não ocorrendo (pelo menos não até agora). Esse enorme volume de puts vendidas, que vencem em 25 de junho, poderá acionar operações de stop-loss que vão colocar mais pressão o mercado.
A ruptura dos níveis de 15 e 14 centavos em apenas três sessões foi traumática e desencadeou, como de hábito, todo o tipo de conversa sobre cenários ainda mais desanimadores para os produtores. Sazonalmente, maio é um mês de preços baixos.
Os riscos escondidos podem e irão fazer a diferença. E o mercado futuro de açúcar vai estressar até o ponto em que o sangue seja estancado. Como mercados exageram na alta e na baixa, fica difícil estabelecer o limite da insanidade.
O banho de sangue que temos assistido serve de alerta para várias discussões fomentadas aqui. Entre elas, acerca do Consecana. Usinas que não fixaram seus açúcares correspondentes à cana de terceiros perderam dinheiro assim como seus fornecedores. Uma fórmula que destrói riquezas. Nem Einstein conseguiria bolar uma fórmula assim.
Outra discussão é sobre a gestão de riscos. As empresas precisam ter uma política profissional e isenta focada nisso. É inacreditável o volume de dinheiro que se perde no setor por simples negligência na elaboração e condução de uma política eficiente de riscos.
Para encerrar, é importante lembrar do péssimo desempenho do mercado de energia: gás natural com queda de 19%, óleo de aquecimento 14%, petróleo 11%, gasolina 6% e etanol de milho 4%. E o açúcar teve a segunda pior queda entre as commodities agrícolas 30%, perdendo apenas para o suco de laranja com 32%.
Há fortes rumores de que grandes produtores começam a apontar seus lápis e fazer contas para reduzir o mix de açúcar. Não temos o hábito de corrigir nossas previsões de safra. Fazemos apenas uma ou duas no início. Nossa única desta safra 2017/2018 foi divulgada no início de janeiro deste ano, com 586 milhões de toneladas de cana. No entanto, dada as modificações de renda (cana inferior) e mix (como acima citado), nosso número inicial de produção de açúcar que era de 35.54 milhões de toneladas de açúcar pode ser reduzido em 1.5 milhão de toneladas de açúcar.