Uma transação de M&A é uma questão de “vida ou morte”?

Publicado 01.08.2025, 13:30

Em 2021, tive o privilégio de entrevistar o meu xará, Dennis Herszkowicz, na época CEO da Totvs (BVMF:TOTS3), entrevista esta que intitulamos como “Insights provenientes de um serial buyer de empresas”, uma vez que o Dennis já havia feito dezenas de aquisições quando CFO da Linx (BVMF:LINX3) e já tinha excelentes casos concluídos na Totvs como por exemplo a aquisição da RD (BVMF:RADL3) em 2021. 

Naquela ocasião, ao responder uma das minhas perguntas, o Dennis disse o seguinte: “É o que eu falei para você, Denis. Eu não conheço, não vi até hoje, um M&A que fosse de vida ou morte. Então, na hora que não é de vida ou morte, que o Sol vai continuar nascendo no dia seguinte, por que você está perdendo tempo em um negócio que está claro que não vai funcionar? Simplesmente não faz sentido.” Agora, ao concluir a aquisição da Linx, novamente algo como isto foi dito aos meios de comunicação: “Herszkowicz disse que a Linx não é, nunca foi e nunca será uma questão de vida ou morte para a Totvs. Existimos há 42 anos e sempre fomos bem-sucedidos. Em relação a 2020, dobramos de tamanho. O que justifica o interesse de longa data pela Linx é a complementariedade dos negócios”, afirmou ao Valor Econômico.

Ao me deparar com esta questão do meu xará, e ao analisar meus mais de 25 anos à frente de dezenas de transações como assessor financeiro, eu me faço esta pergunta: Uma transação é questão de vida ou morte? Minha resposta objetivamente é “não” - e vou me explicar.

Como tudo mais em nossa vida, e uma transação empresarial não foge desta realidade, escolhemos o tempo todo. Escolhemos onde vamos comer, a velocidade a que vamos conduzir nosso veículo, a empresa onde vamos trabalhar, a escola onde nossos filhos vão estudar, o filme que assistiremos no cinema ou no canal de streaming, enfim, somos seres a fazer escolhas diariamente diversas vezes ao dia. Cada uma destas escolhas não é uma questão de vida ou morte, mas sem dúvida alguma traz caminhos diferentes ao que segue. Se escolho uma escola em detrimento à outra para um filho certamente ele ou ela terão um ambiente diferente, amigos e amigas diferentes, exposição a diferentes aulas, realidades etc. Então a certeza de que podemos ter a partir de diferentes escolhas que podemos fazer é que resultarão, sim, em realidades distintas as quais são difíceis de compararmos a posteriori. 

Se estas afirmações acima fazem sentido, uma transação também não trará um cenário binário de vida ou morte a uma empresa, ou seja, se a transação não for efetivada, aquela empresa deixará de existir. Certamente o uso da expressão traz um tom emocional à questão de se fazer ou não uma transação, ou no jargão de nosso mercado fazer ou perder a transação. Mas após tantos anos, tenho uma certeza, tanto o caminho da compradora quanto o caminho da vendedora serão diferentes caso não venham a fazer a transação. 

Ao não comprar a Linx em 2020, e como disse meu xará não foi uma questão de vida ou morte, a Totvs seguiu sua estratégia, continuou crescendo e dobrou de tamanho conforme apontado acima. Ou seja, a empresa de modo algum morreu, pelo contrário. Podemos nos perguntar como teria sido a vida da Totvs se tivesse feito a aquisição? Podemos e a resposta seria provavelmente diferente do que se encontra à nossa frente atualmente. Primeiro porque a Totvs teria investido a valores históricos mais de R$ 3,7 bilhões para comprar a mesma empresa que acaba de adquirir, ou seja, estaria R$ 3,7 bilhões menos capitalizada do que está hoje, mas também teria obtido 5 anos de lucros desta operação com suas devidas sinergias. Enfim, vejam os fatos que somos capazes de elencar e daí vem a certeza de que tudo seria diferente. 

Agora, vou para as diversas vezes em que me deparo com a questão vinda de um cliente que assessoro: será que devo desistir de uma transação que está sobre a mesa de negociação? Eu não gosto da resposta: é um cavalo selado que está passando à sua frente então melhor montar. Esta resposta traz a mesma conotação da vida ou morte. Porém apesar de a pergunta trazer sem dúvida um grande grau de emoção vinda lá do âmago de um ser humano que fundou uma empresa, diariamente a leva adiante, emociona-se e se dedica quase que ilimitadamente àquela causa, eu sempre procuro conduzir a resposta para algo mais racional e simular o que serão as respostas, os caminhos que a empresa vai tomar, e o seu acionista, caso não faça a transação. Ao explorar estas respostas e possíveis cenários, talvez fique claro que o fazer é melhor que o não fazer. Geralmente, não chegamos a conclusões de vida ou morte, mas podemos chegar a palpáveis respostas melhores ao se fazer que superam as piores ao não se fazer a transação.

Lanço aqui mão de um argumento que tenho usado em algumas conversas recentes uma vez que o momento em que estamos é desafiador: juros estão altos, incertezas estão por todos os lados e as transações têm seus preços pressionados. Então é muito fácil que um vendedor acabe pensando muitas vezes antes de assinar. O argumento que uso é a observação de alguns setores como por exemplo saúde e prestação de serviços onde houve centenas de transações nos últimos 20 anos o que acarretou o surgimento de grandes empresas nacionais altamente escaláveis e eficientes. Isto faz com que uma aquisição adicional se torne cada vez menos necessária para estas potencias consolidadoras. Portanto se um cliente tem a oportunidade de vender a um deles, eu digo que talvez seja melhor fazer pois a chance de a possível venda nunca mais acontecer é grande. Não será questão de vida ou morte, mas pode ser questão de ser forçado a fechar uma empresa futuramente por não ter mais a venda como um cenário sucessório possível.

Enfim, questão de vida ou morte? Não, definitivamente. O que me coloca ao lado do meu xará. Mas sem dúvida, uma questão de se avaliar os cenários ao se dizer sim, os cenários ao se dizer não, ponderá-los de forma racional para tomar uma decisão eficiente e da qual não nos arrependamos. Sem dúvida, a turma da Totvs nesta semana consolidou a ideia que deixar uma transação passar pode ser além de tudo rentável pois compraram a mesma empresa por menos da metade de 5 anos atrás. Mãos à obra e vamos ajudar nossos clientes a tomar decisões muito além da transação e sem o gosto binário da “vida ou morte”.

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