Para os investidores do ouro que esperam ler o futuro nas entrelinhas do pronunciamento do Federal Reserve (Fed) após sua reunião de hoje, uma provável sinopse seria a seguinte: como a taxa de juros está praticamente zerada, o foco deverá estar voltado ao plano de empréstimos diretos a empresas, à perspectiva econômica para o segundo trimestre e à mensagem ao congresso, se for o caso.
Desde a sua reunião emergencial de meados de março, o banco central dos Estados Unidos praticamente igualou seus esforços ao estímulo da Casa Branca contra o coronavírus, com mais de US$ 2 trilhões na forma de compras de ativos, maior volume de crédito e oferta de linhas de swap a bancos centrais estrangeiros. E está prometendo fazer ainda mais. Toda a degradação subsequente no dólar será excelente para quem espera que o ouro alcance US$ 1.800 ou até mais.
Depois de Powell, é preciso acompanhar a reabertura da economia
Mas não há um catalisador para o ouro chegar a US$ 1.800 no futuro próximo, ou pelo menos não parece haver. Portanto, ao colocar na sua tela hoje o pronunciamento do presidente do Fed, Jerome Powell, concentre-se no que o metal amarelo precisa para continuar no seu atual patamar abaixo de US$ 1.750 e desenvolver um gradativo movimento de alta ou até mesmo ficar de lado.
A resposta para isso é a reabertura econômica nos Estados Unidos e ao redor do mundo.
Apresento a seguir um quadro geral do fim dos confinamentos nos EUA provocados pela Covid-19:
- Quatorze estados com mais de 95 milhões de habitantes começaram a retomar suas atividades ou anunciaram planos de reabertura.
- O Alabama reabrirá na quinta-feira e será seguido de Ohio, na sexta. As empresas e eventos sociais no Missouri terão permissão para reabrir a partir de 4 de maio, e Iowa abrirá seus restaurantes, shoppings, academias de ginástica, livrarias e lojas de varejo com 50% de capacidade a partir de 1 de maio.
- As ordens para ficar em casa emitidas pelos governos dos EUA e as decisões subsequentes de lentamente reabrir as economias acabaram esquentando o debate político.
- Minnesota, Mississipi, Colorado, Montana, Tennessee, Geórgia, Oklahoma, Alaska e Carolina do Sul irão reabrir ou já reabriram suas economias após semanas de confinamentos compulsórios.
- O Texas fez uma reabertura parcial na semana passada, mas o governador anunciou, na segunda-feira, que sua ordem para ficar em casa expira em 30 de abril.
- Nova York, epicentro da epidemia de Covid-19 nos EUA, estabeleceu um plano de reabertura de 12 passos para garantir que o vírus não apresente um novo pico.
- Nova Jérsei também estipulou condições que devem ser alcançadas antes do fim dos confinamentos, mas teme um “armagedom” financeiro capaz de impossibilitar o estado de pagar seus professores, bombeiros e policiais.
O número de mortes nos EUA por causa da pandemia, enquanto isso, aproxima-se de 60.000, enquanto os casos de infecção ultrapassam 1 milhão.
Possibilidade de mais infecções com a reabertura
As autoridades sanitárias alertam que o aumento das interações e da atividade econômica pode gerar mais infecções, ao mesmo tempo em que as medidas de distanciamento social parecem estar colocando a disseminação do vírus sob controle. E o conselheiro de saúde da Casa Branca, Anthony Fauci, afirma que os Estados Unidos “podem estar prestes a apresentar uma grave queda” se os pesquisadores não encontrarem um tratamento eficiente até lá.
E tudo isso prova uma coisa: não haverá nada de normal em relação à emergência do “novo normal”. Embora muitos já tenham suspeitado disso, a insistência do governo Trump em sentido contrário permitiu que o Dow de Wall Street recuperasse grande parte da desvalorização de 35% deste ano, caindo apenas 15%.
“Não me parece realista pensar que conseguiremos voltar ao que era antes. Na verdade, não gostaria que isso fosse feito”, declarou Jonathan Caulkins, professor de operações, pesquisa e política pública da Universidade de Carnegie Mellon. “Mas a sociedade pode, e deve, fazer mudanças agora para facilitar a transição e ajudar a economia”.
Caulkins disse ainda:
“Se você visitar uma cozinha de um restaurante típico e uma fábrica, verá que muitos trabalhadores de cozinha trabalham de forma muito mais próxima entre si do que em um chão de fábrica.”
Ouro deve permanecer entre US$ 1.700 e US$ 1.720 no curto prazo
A prolongada luta para fazer os americanos voltarem ao trabalho e reabrir a economia provavelmente frustrará as esperanças do governo Trump de evitar que ocorra no terceiro trimestre o deve acontecer no segundo: uma forte queda no PIB.
Essa é a melhor aposta que os investidores do ouro podem fazer neste momento.
“No cenário mais amplo, tudo indica que o ouro ficará na faixa de US$ 1640 a US$ 1740 por onça no longo prazo, consolidando-se no curto prazo entre US$ 1700 e US$ 1720 por onça”, declarou Jeffrey Halley, analista sênior de mercados da OANDA, em Nova York.
Imagens de televisão mostram restaurantes vazios em muitos estados americanos que reabriram as portas, enquanto os clientes continuam preocupados com sua segurança. “O movimentou caiu 90%”, afirmou Christopher Hartland, proprietário da cervejaria Cool Springs (SA:SGPS3) em Franklin, Tennessee.
Um fenômeno global
E isso não está acontecendo apenas nos EUA.
Na Índia, onde o governo central começou a retirar as restrições em áreas com poucos ou nenhum caso conhecido de Covid-19, as autoridades estão enfrentando um novo desafio: persuadir os habitantes amedrontados e seus líderes a considerar uma reabertura parcial.
Embora os estados indianos de Kerala e Gujarat tenham agido rápido para reabrir os negócios, outros estados maiores, como Tamil Nadu e Maharashtra indicaram que permaneceriam fechados até pelo menos 3 de maio, quando o primeiro-ministro Narendra Modi decidirá se estenderá ou não o confinamento. Outros estados praticamente ficaram em silêncio.
Na Itália, o impacto econômico dos confinamentos pode fazer a relação dívida-PIB alcançar astronômicos 155,7% (contra uma previsão de 135,2% antes da Covid-19) e a taxa de desemprego deve atingir 11,6%. Analistas estimam que 10 milhões de italianos, ou um quinto da população adulta, serão jogados na pobreza, incapazes de atender suas necessidades básicas de alimentação, medicação e habitação.
Tudo isso favorece as posições em ouro como porto seguro.