Por Lisandra Paraguassu e Mateus Maia
BRASÍLIA (Reuters) - O governo do presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) quer mudar para concessão o regime de exploração do petróleo e gás do pré-sal, que atualmente é explorado via partilha de produção, disse nesta quinta-feira uma fonte de alto escalão da equipe de transição.
"Tem uma clara preferência nossa, vamos mudar sim para concessão, ao invés de partilha", afirmou a fonte, que pediu para não ter seu nome revelado.
O regime de partilha foi instituído no governo do PT, com o argumento de que o Estado teria mais acesso a recursos dos produtivos campos do pré-sal, assim como maior controle sobre as riquezas.
Foi até criada uma estatal, a PPSA, para representar os interesses do Estado nos contratos de partilha.
O futuro governo, contudo, tem trabalhado por um Estado mais enxuto.
Bolsonaro está formando uma equipe econômica com viés mais liberal, tendo sido eleito com promessas pró-mercado, que incluem privatizações.
A fonte evitou elaborar sobre a mudança planejada, se a ideia da equipe de Bolsonaro poderia exigir uma alteração na lei.
Entretanto, para representantes do atual governo, uma mudança no modelo de partilha poderia trazer riscos importantes, como o atraso na realização de novos leilões, segundo afirmaram autoridades em evento sobre pré-sal nesta quinta-feira, no Rio de Janeiro.
Questionado sobre o assunto, o economista Roberto Castello Branco, indicado para o cargo de presidente da Petrobras (SA:PETR4), disse nesta quinta-feira que ainda não há uma decisão sobre uma mudança de regime de exploração do pré-sal. Ele afirmou ainda que o assunto ainda está em estudo na equipe de transição do presidente eleito.
Apesar de no início o setor privado ter apresentado resistência ao regime, após alguns ajustes, o modelo de partilha atraiu interesse e aportes bilionários de grandes petroleiras globais, como Exxon Mobil (NYSE:XOM), Chevron, Repsol (MC:REP), Shell e BP.
Em leilões sob regime de partilha, as companhias pagam um bônus de assinatura fixo, em uma licitação no qual o vencedor é aquele que oferta o maior volume de petróleo ao governo, uma forma de o Estado se apropriar de mais recursos da exploração do petróleo.
Nesse caso, agora a Petrobras tem direito de preferência caso queira ser operadora da área --ela deve se manifestar antes da realização do leilão. Anteriormente, antes dos ajustes feitos para atrair mais investidores, a estatal era obrigada a ser operadora.
Já pelo regime de concessão, utilizado atualmente em leilões fora do polígono ou para áreas terrestres, ganha o certame aquele que ofertar o maior bônus de assinatura, que neste caso é variável.
Dessa forma, no regime de concessão, um maior volume de recursos pode ser arrecadado em um pagamento inicial, enquanto com a partilha a União em geral acaba recebendo os pagamentos ao longo do contrato de produção.
Um regime de concessão, com pagamentos "à vista" de maiores montantes, poderia ajudar um governo que enfrenta dificuldades fiscais.
A ação preferencial da Petrobras fechou praticamente estável nesta quinta-feira, com alta de 0,28 por cento.
PROPOSTAS
Após questionamentos do governo de transição sobre a possibilidade de acabar com o modelo de partilha de produção, o atual secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia, Márcio Félix, disse que o atual governo sugeriu que a melhor forma seria eliminar o polígono do pré-sal.
Pela lei, licitações de áreas altamente produtivas, como pré-sal, devem ser realizadas sob o regime de partilha.
No entanto, Félix ressaltou que sugeriu ao governo de transição que, caso haja a realização de mudanças, que isso ocorra a partir de 2020, depois da realização do leilão dos excedentes da cessão onerosa e da sexta rodada do pré-sal marcada para 2019.
O leilão dos excedentes da cessão onerosa ainda não tem uma data, dependendo de votação de projeto no Senado.
"Isso foi um ponto que eles levantaram e a gente deu essa sugestão: de que a forma mais simples de fazer é tirar o polígono", disse Félix, durante um evento sobre o pré-sal nesta quinta-feira, explicando que tal mudança terá que passar por discussões no Congresso Nacional.
O temor de Félix e de outros integrantes do governo é que mudanças causem atrasos em leilões. No entanto, ele ressaltou que ainda é cedo para avaliar a receptividade do governo de transição à sugestão.
No passado, o processo de criação do modelo de partilha consumiu muito tempo de discussões no governo e colaborou para uma paralisação de cinco anos na realização dos leilões.
Agentes do mercado frequentemente apontam esse tempo como um período de grande perda de investimentos para o setor no Brasil.
O diretor de Petróleo, Gás e Biocombustíveis da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), José Mauro Coelho, afirmou nesta quinta-feira ter receio em relação à discussão.
"Se nós entrarmos nessa discussão no Congresso, por exemplo, nós corremos o risco de paralisar leilões e isso é tudo o que a gente não quer. Os riscos precisam ser bem medidos", afirmou.
Também presente no evento, o presidente da PPSA, Ibsen Flores, disse que a indústria e investidores veem a intenção de acabar com o modelo de partilha "com muita apreensão".
"Tudo o que o investidor financeiro e o investidor operacional, como as empresas de petróleo, querem é estabilidade nas regras. Uma mudança dessas vai parar o país, a indústria de novo para, para que isso seja discutido", afirmou.
(Reportagem de Mateus Maia e Lisandra Paraguassu; com reportagem adicional de Marta Nogueira, no Rio de Janeiro)