Por Marcelo Teixeira e Roberto Samora
SÃO PAULO (Reuters) - Poderia muito bem ser um filme de Hollywood. Juliana Armelin e seu marido Paulo Siqueira decidiram mudar radicalmente suas vidas em 2010, deixando seus empregos no setor financeiro e se mudando para uma fazenda há 7 horas de São Paulo para começar a produzir café.
Sete anos depois, eles levaram, pelo segundo ano consecutivo, o prêmio mais tradicional de qualidade de café do Brasil, superando centenas de produtores extremamente experientes em um país que produz e exporta café há mais de 200 anos.
"Não dava pra imaginar mesmo que estaríamos nessa situação tão rapidamente", disse Paulo Siqueira à Reuters nas primeiras horas desta sexta-feira após receber o prêmio anual da torrefadora italiana Illy.
"A gente brinca que a gente não tem história no café, só uns capítulos", disse Juliana.
O casal se conheceu durante a faculdade, ambos estudando Engenharia na Universidade de São Paulo. Eles então passaram alguns anos nos Estados Unidos fazendo um MBA na Universidade de Chicago antes de começarem suas carreiras na capital paulista.
Juliana é ex-consultora da McKinsey & Company, enquanto o Paulo ocupou posições como gestor de fundos no Credit Suisse e na empresa Vector Investimentos.
Eles acabaram no negócio de café graças ao pai de Juliana, que também decidiu começar a produzir os grãos.
"Eu estava ajudando meu pai que estava comprando uma fazenda ali na região de café, e a gente começou a olhar, pensou que poderia funcionar para nós, a gente sempre quis ter um negócio junto", disse Juliana.
Após estudar a fundo a possibilidade, eles compraram uma fazenda de 210 hectares (518 acres) no município de Ibiá, em uma região produtora de café conhecida como o Cerrado Mineiro, no Estado de Minas Gerais.
FAZENDA MODELO
"Era uma área de pastagem", relembra Paulo, explicando que tiveram que fazer tudo do zero para transformar a propriedade.
Plantaram os primeiros pés de café em 2011, colheram os primeiros grãos em 2013 e tiveram sua primeira colheita cheia em 2015. Um ano depois, receberam seu primeiro prêmio.
A fazenda do casal é hoje uma propriedade modelo. Os campos são 100 por cento irrigados, com a colheita completamente mecanizada. O café arábica lavado é colocado para secar em terreiros elevados para evitar contato com o solo, o que poderia afetar o sabor.
"Basicamente a gente ouviu o pessoal que sabia mais que a gente, fomos na Illy, no escritório experimental agrícola da Emater, fomos na UFLA, contratamos um engenheiro agronômo que tinha muita experiência com café, que vinha de família que trabalhava com café há muito tempo", diz Juliana. "Tem gente que fala que nós somos nerds que foram para o café e a gente diz: tudo bem, nós somos mesmo".
A fazenda Terra Alta foi escolhida seguindo alguns aspectos, como disponibilidade de água e relevo que permitisse a mecanização.
O casal usou o máximo possível que havia disponível de linhas de crédito agrícola do governo para comprar todo o equipamento. "A gente tem empréstimo para pagar a vida inteira", diz Juliana, sorrindo.
EXPORTAÇÕES DIRETAS
A fazenda hoje exporta 80 por cento de sua produção que varia de 10 mil a 13 mil sacas de 60kg por ano. Muitos acordos são fechados diretamente com comerciantes de café gourmet nos Estados Unidos.
Paulo diz que a comunidade de café na região do Cerrado tem sempre sido receptiva, apesar da origem incomum do casal.
Mas eles usam cautela quando questionados se recomendariam sua experiência para outros.
"Se alguém pensar assim, vou investir em café para fazer dinheiro, provavelmente ele vai se apaixonar, como a gente, mas não é fácil. Não é um negócio que você escolhe só pelo dinheiro, é uma dedicação integral", disse Juliana, acrescentando que ela geralmente cuida das planilhas, dos detalhes finaceiros, enquanto Paulo tende a acompanhar a ação no campo.
Mas eles não tem arrependimentos. "Nós gostamos muito disso. A gente se vê fazendo isso pelo resto da vida", disseram.