Por Lisandra Paraguassu e Anthony Boadle
BRASÍLIA, (Reuters) - As negociações entre o Mercosul e a União Europeia por um acordo comercial foram retomadas na semana passada e devem seguir pelos próximos meses, disseram à Reuters fontes que acompanham as conversas, mesmo em meio à resistência da França.
Uma reunião entre os negociadores no Palácio Itamaraty foi a primeira entre as partes desde dezembro, quando os debates foram suspensos pela decisão do então governo argentino de deixar para o novo presidente, Javier Milei, a continuação das tratativas.
De acordo com fontes europeias e brasileiras ouvidas pela Reuters, não houve avanços significativos no encontro, mas as conversas foram positivas e foi tomada a decisão de continuar as negociações.
"As negociações estão andando lentamente na direção certa. Mas vai levar algum tempo", disse uma das fontes europeias.
Do lado brasileiro, a informação segue na mesma linha. Chegou-se a falar em concluir o acordo até a reunião da Organização Mundial do Comércio (OMC) no final de fevereiro, mas decidiu-se evitar falar em prazos e não criar expectativas.
No momento, o maior entrave é a resistência da França. Em meio a imensos protestos de agricultores franceses contra importações e contra o acordo com o Mercosul, o governo francês divulgou nesta segunda-feira a informação de que a Comissão Europeia teria orientado os negociadores a suspenderem as negociações.
A Comissão, no entanto, disse que os negociadores da UE e do Mercosul continuam em contato, incluindo os encontros da semana passada em Brasília, mas alguns temas importantes continuam em aberto.
"O foco da UE continua em assegurar que o acordo atenda as metas de sustentabilidade do bloco, ao mesmo tempo que respeita as sensibilidades do setor agrícola europeu", disse um porta-voz da Comissão.
De acordo com uma das fontes da UE ouvidas pela Reuters, a informação divulgada pelo governo da França é uma versão formulada pelos franceses de acordo com seus interesses. Outra fonte classificou a informação como "ficção".
Do lado brasileiro, as fontes confirmam que nada sobre isso foi trazido pelos negociadores, ao contrário.
Perguntado sobre as informações francesas, o Itamaraty não quis comentar oficialmente. Uma fonte diplomática, no entanto, lembrou que as negociações não são feitas com países ou presidentes individualmente, mas com a Comissão Europeia.
Em dezembro, quando as negociações se encaminhavam para serem fechadas, Macron se manifestou publicamente contra o acordo, classificando-o de "antiquado" e dizendo que "não era bom para ninguém."
Segundo as fontes brasileiras, as negociações continuarão nos próximos dias para resolver questões pendentes, especialmente do lado brasileiro. O novo governo argentino já declarou que não tem problemas com o as negociações e não pretende fazer novas exigências, mas o Brasil aponta duas questões que ainda precisam ser tratadas.
Uma delas é o cronograma para redução de tarifas de importação para carros elétricos. A outra, mais complexa, é um sistema de conciliação para resposta à lei antidesmatamento aprovada pela União Europeia.
O Brasil quer a criação de um instrumento de conciliação no caso de a UE invocar a lei e suspender importações de produtos agrícolas acertadas no acordo, assim como o direito de reduzir as cotas europeias se tiver suas exportações cortadas.
(Reportagem de Lisandra Paraguassu e Anthony Boadle, em Brasília; Reportagem adicional de Philip Blenkinsop, em Bruxelas)