O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, disse nesta sexta-feira, 28, que vários Países têm um sistema muito engessado para o corte de gastos, não apenas o Brasil, e isso afeta o ajuste fiscal, que acaba sendo feito pelo lado das receitas. Para Campos Neto, o ajuste fiscal feito pelo lado da receita pode tornar alguns investimentos inviáveis.
Ele cita que esse ajuste tende a gerar aumento de custos para as empresas, que geralmente acabam repassados para o preço.
"Quando você faz o ajuste 100% pelo lado da receita, você acaba quebrando relações na parte tributária que vinham de muito tempo e gera insegurança jurídica. A combinação desses fatores leva a menos investimento, menos crescimento, mais inflação", disse em participação no Fórum Jurídico de Lisboa, em Portugal.
O presidente do Banco Central afirmou também que a relação entre dívida e crescimento é um tema em discussão no mundo pós-pandemia e que o custo da dívida tem implicação para o crescimento globalmente, analisando o cenário de médio prazo.
Ele citou trabalhos que mostram que para países com a relação dívida/PIB acima de 60%, o estímulo fiscal tem efeito negativo sobre o produto.
"Quando a dívida é alta, o governo está competindo por fundos com o setor privado. Ao mesmo tempo, com a queda de credibilidade do governo, os juros acabam aumentando. À medida que o quadro se agrava, os governos passam a se financiar mais no curto prazo", disse Campos Neto.
O presidente do Banco Central defendeu que é preciso discutir a relação entre investimento público e eficiência, para que governos não caiam em tentação e façam escolhas de gastos piores por pressão política. "Vários países emergentes aumentaram gastos fiscais em momentos em que a economia estava aquecida. Tentar impulsionar crescimento através de intervenção do governo com investimento público tem alguns casos em que ele funciona no começo, mas o excesso volta para o ciclo vicioso em que você acaba tendo menos eficiência", disse.
Novos desafios no pós-pandemia
O presidente do Banco Central afirmou que o período pós-pandemia apresentou novos desafios à economia global, e um deles é a percepção da interação entre inflação e fiscal.
"Quando a inflação aumenta, o governo tem percepção inicial de melhora do resultado fiscal, porque receitas são indexadas. Por outro lado, inflação produz efeitos distributivos adversos, sobretudo nas camadas mais pobres da população", disse ele.
Campos Neto alertou que quando os governos querem inflação maior para turbinar arrecadação, pode haver ciclo vicioso. Ele disse que alguns Países viveram esse ciclo com inflação maior gerando mais desigualdade e o governo, para contra-atacar, faz mais programas sociais e gera mais gastos.