Por Leandro Manzoni
Investing.com - O Comitê de Política Monetária (Copom) decidiu, de forma unânime, acelerar a alta da taxa Selic nesta quarta-feira (4). Após três elevações seguidas de 0,75 ponto percentual nas reuniões anteriores, a autoridade monetária intensificou o tamanho da alta em 1 ponto percentual, com a taxa de juros subindo de 4,25% para 5,25%. A decisão foi em linha com a expectativa de mercado.
O aperto monetário mais intenso está em linha com o que o Banco Central havia prometido após a reunião anterior, em que comprometia aumentar a velocidade das altas caso houvesse deterioração dos dados de inflação e, consequentemente, contaminasse a expectativa de inflação. Na última sexta-feira, o IPCA-15 de julho, prévia da inflação oficial do mês, havia subido 0,72%, acima do consenso do mercado.
Além disso, a expectativa de inflação para 2022 estava se deteriorando, de acordo com o Boletim Focus. Na última segunda-feira, o IPCA de 2022 era projetado em 3,81%, acima dos 3,8% da estimativa da semana e dos 3,77% de quatro semanas atrás, todos acima do centro da meta de inflação de 3,5% estabelecido para o ano que vem.
No comunicado, a autoridade monetária diz que a elevação de hoje da taxa Selic é "compatível com a convergência de inflação para as metas de horizonte relevante, que inclui o calendário de 2022 e, em menor grau, o de 2023". Além disso, o colegiado está preocupado com a inflação inercial, ou seja, a reabertura do setor de serviços com a vacinação contra a Covid-19 poderia adicionar deterioração maior às expectativas de inflação.
A novidade do comunicado é a retirada de "normalização parcial da política monetária". "A autoridade ajustou seu comunicado no tocante ao tamanho do ciclo", diz Étore Sanchez, economista-chefe da Ativa Investimentos.
Agora, o Copom indica que o atual ciclo de aperto monetário exige taxa de juros acima do patamar neutro, com o objetivo de "suavizar flutuações do nível de atividade e fomento do pleno-emprego". Economistas calculam que a taxa neutra está entre 6,5% e 7,5%. Por isso, na próxima já está contratada próxima novo aumento de mesma magnitude (100 pontos-base) dependendo "da evolução da atividade econômica, do balanço de riscos e projeções e expectativas de inflação para o horizonte relevante para a política monetária".
"O mercado irá ler o comunicado como um duro recado", avalia André Perfeito, economista-chefe da Necton Investimentos, que prevê, em tese, uma suavização na parte longa da curva de juros, porém o economista sugere cautela devido ao possível encaminhamento de uma PEC pelo governo "que pode ser considerada um desrespeito ao Teto de Gastos e mitigar a queda dos juros mais longos.
A próxima reunião do Copom ocorre agora nos dias 21 e 22 de setembro.
Confira abaixo a íntegra do comunicado da reunião.
Em sua 240ª reunião, o Comitê de Política Monetária (Copom) decidiu, por unanimidade, elevar a taxa Selic para 5,25% a.a.
A atualização do cenário básico do Copom pode ser descrita com as seguintes observações:
No cenário externo, a evolução da variante Delta da Covid-19 adiciona risco à recuperação da economia global. O Comitê avalia que, a despeito dos movimentos recentes nas curvas de juros, ainda há risco relevante de aumento da inflação nas economias centrais. Ainda assim, o ambiente para países emergentes segue favorável com os estímulos monetários de longa duração, os programas fiscais e a reabertura das principais economias;
Em relação à atividade econômica brasileira, os indicadores recentes continuam mostrando evolução positiva e não ensejam mudança relevante para o cenário prospectivo, o qual contempla recuperação robusta do crescimento econômico ao longo do segundo semestre;
A inflação ao consumidor continua se revelando persistente. Os últimos indicadores divulgados mostram composição mais desfavorável. Destacam-se a surpresa com o componente subjacente da inflação de serviços e a continuidade da pressão sobre bens industriais, causando elevação dos núcleos. Além disso, há novas pressões em componentes voláteis, como a possível elevação do adicional da bandeira tarifária e os novos aumentos nos preços de alimentos, ambos decorrentes de condições climáticas adversas. Em conjunto, esses fatores acarretam revisão significativa das projeções de curto prazo;
As diversas medidas de inflação subjacente apresentam-se acima do intervalo compatível com o cumprimento da meta para a inflação;
As expectativas de inflação para 2021, 2022 e 2023 apuradas pela pesquisa Focus encontram-se em torno de 6,8%, 3,8% e 3,25%, respectivamente; e
No cenário básico, com trajetória para a taxa de juros extraída da pesquisa Focus e taxa de câmbio partindo de USD/BRL 5,15*, e evoluindo segundo a paridade do poder de compra (PPC), as projeções de inflação do Copom situam-se em torno de 6,5% para 2021, 3,5% para 2022 e 3,2% para 2023. Esse cenário supõe trajetória de juros que se eleva para 7,00% a.a. neste ano, mantém-se nesse valor durante 2022 e reduz-se para 6,50% a.a. em 2023. Nesse cenário, as projeções para a inflação de preços administrados são de 10,0% para 2021 e 4,6% para 2022 e 2023. Adota-se uma hipótese neutra para a bandeira tarifária de energia elétrica, que se mantém em "vermelha patamar 1" em dezembro de cada ano-calendário.
O Comitê ressalta que, em seu cenário básico para a inflação, permanecem fatores de risco em ambas as direções.
Por um lado, uma possível reversão, ainda que parcial, do aumento recente nos preços das commodities internacionais em moeda local produziria trajetória de inflação abaixo do cenário básico.
Por outro lado, novos prolongamentos das políticas fiscais de resposta à pandemia que pressionem a demanda agregada e piorem a trajetória fiscal podem elevar os prêmios de risco do país. Apesar da melhora recente nos indicadores de sustentabilidade da dívida pública, o risco fiscal elevado segue criando uma assimetria altista no balanço de riscos, ou seja, com trajetórias para a inflação acima do projetado no horizonte relevante para a política monetária.
O Copom reitera que perseverar no processo de reformas e ajustes necessários na economia brasileira é essencial para permitir a recuperação sustentável da economia. O Comitê ressalta, ainda, que questionamentos sobre a continuidade das reformas e alterações de caráter permanente no processo de ajuste das contas públicas podem elevar a taxa de juros estrutural da economia.
Considerando o cenário básico, o balanço de riscos e o amplo conjunto de informações disponíveis, o Copom decidiu, por unanimidade, elevar a taxa básica de juros em 1,00 ponto percentual, para 5,25% a.a. O Comitê entende que essa decisão reflete seu cenário básico e um balanço de riscos de variância maior do que a usual para a inflação prospectiva e é compatível com a convergência da inflação para as metas no horizonte relevante, que inclui o ano-calendário de 2022 e, em grau menor, o de 2023. Esse ajuste também reflete a percepção do Comitê de que a piora recente em componentes inerciais dos índices de preços, em meio à reabertura do setor de serviços, poderia provocar uma deterioração adicional das expectativas de inflação. O Copom considera que, neste momento, a estratégia de ser mais tempestivo no ajuste da política monetária é a mais apropriada para garantir a ancoragem das expectativas de inflação. Sem prejuízo de seu objetivo fundamental de assegurar a estabilidade de preços, essa decisão também implica suavização das flutuações do nível de atividade econômica e fomento do pleno emprego.
Neste momento, o cenário básico e o balanço de riscos do Copom indicam ser apropriado um ciclo de elevação da taxa de juros para patamar acima do neutro.
Para a próxima reunião, o Comitê antevê outro ajuste da mesma magnitude. O Copom enfatiza que os passos futuros da política monetária poderão ser ajustados para assegurar o cumprimento da meta de inflação e dependerão da evolução da atividade econômica, do balanço de riscos e das projeções e expectativas de inflação para o horizonte relevante da política monetária.
Votaram por essa decisão os seguintes membros do Comitê: Roberto Oliveira Campos Neto (presidente), Carolina de Assis Barros, Fabio Kanczuk, Fernanda Magalhães Rumenos Guardado, João Manoel Pinho de Mello, Maurício Costa de Moura, Otávio Ribeiro Damaso e Paulo Sérgio Neves de Souza.
*Valor obtido pelo procedimento usual de arredondar a cotação média da taxa de câmbio USD/BRL observada nos cinco dias úteis encerrados no último dia da semana anterior à da reunião do Copom.