Por Maria Carolina Marcello
BRASÍLIA (Reuters) - Em uma grande mobilização final no último dia efetivo de esforço concentrado antes do "recesso branco", a Câmara dos Deputados concluiu nesta sexta-feira a votação da reforma tributária e aprovou o projeto de lei que recria o voto de qualidade no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), mas adiou para agosto a análise do novo marco fiscal.
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), inicialmente havia anunciado que votaria os três projetos prioritários para o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva nesta semana, mas negociações de última hora para aprovar a reforma tributária acabaram atrasando o calendário e jogando a votação do arcabouço fiscal para depois do recesso parlamentar.
Oficialmente o recesso começaria apenas em 17 de julho, mas Lira não estará em Brasília na próxima semana, o que na prática congela a agenda de votações importantes. E, como os parlamentares só devem votar a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) após a análise do projeto do marco fiscal, em agosto, o Congresso nem sequer entrará formalmente em recesso.
Pela manhã, Lira disse que ainda tentaria votar o arcabouço nesta sexta-feira após o Carf. Após conversa com os líderes, no entanto, ficou decidido que o arcabouço será analisado apenas no próximo mês.
"O projeto do arcabouço, infelizmente hoje o relator, deputado (Cláudio) Cajado (PP-BA) não se encontra em Brasília, nem disponibilizou o texto -- lógico que o nosso foco a semana toda era a reforma tributária", disse Lira.
O novo marco fiscal já havia sido analisado pela Câmara, mas como passou por modificações no Senado, precisa ser reavaliado pelos deputados.
Segundo o presidente da Câmara, as principais prioridades do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, eram a reforma tributária e o projeto do Carf, que tem ligação direta com o marco fiscal.
Para Lira, a votação do projeto do Carf também poderá ser levada em conta pelo Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, mesmo com o arcabouço ainda pendente, ao avaliar uma possível redução dos juros.
"O fato do Carf entrar na avaliação de hoje dará um conforto também de previsibilidade para a próxima reunião do Copom que, com todos os sinais que a política vem dando, que o Congresso vem dando, que a economia vem fazendo, eu não tenho dúvidas que -- respeitando a autonomia do Banco Central, que é primordial para que a gente tenha segurança na nossa moeda, no controle da inflação, na nossa meta fiscal --, nós teremos, sim, se Deus quiser, a partir de agosto um começo de diminuição de taxa de juros. É a nossa expectativa", afirmou.
O texto principal do projeto de lei do Carf, que recria o voto de qualidade do governo em caso de empates nas decisões do colegiado, foi aprovado de maneira simbólica pela Câmara, e a votação das emendas foi concluída rapidamente.
O texto que segue ao Senado incorpora acordo fechado com a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que prevê redução de multas e juros nos casos de desempate em favor da União.
Reforma tributária
O chamado "esforço concentrado" de Lira para votar as pautas econômicas nesta semana teve como principal destaque a aprovação em dois turnos da reforma tributária, um tema que se arrasta há décadas no Congresso Nacional.
A aprovação da reforma ajudou o Ibovespa a fechar em alta de 1,25%, enquanto o dólar caiu mais de 1% e voltou a fechar abaixo dos 4,90 reais.
A proposta ainda precisa percorrer um caminho considerável no Senado, onde governadores e setores econômicos tendem a ter mais poder de influência, e pode ser modificada. Até mesmo Lira reconhece a alta probabilidade de isso ocorrer.
Ainda assim, a conclusão da análise em dois turnos na Câmara sela o cumprimento da promessa de ter a proposta aprovada pelos deputados antes do recesso de julho, e fecha uma importante etapa na tramitação da matéria.
A aprovação da PEC na Câmara mostrou-se resultado dos esforços do governo, que na reta final acelerou a liberação de emendas, nomeações de cargos e até mesmo a troca do comando do Ministério do Turismo.
Mais do que isso, a movimentação da proposta dentro do calendário e em sessão relativamente rápida, em termos de PEC, evidencia a força política de Lira, que entrou pessoalmente na articulação.
Também deixou exposto o cisma na oposição, tendo como protagonistas o ex-presidente Jair Bolsonaro e o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos).
Bolsonaro posicionou-se abertamente contra a reforma e preferia que seu partido, o PL, fechasse questão contra a proposta -- o que não ocorreu.
Seu ex-ministro Tarcísio, em lado oposto, defendeu a aprovação da matéria e seu apoio foi crucial para que outros governadores entrassem no barco. Também teve influência sobre a bancada de São Paulo. Dos 70 deputados paulistas -- a maior unidade da Federação em termos de representação na Câmara --, os parlamentares deram 53 votos a favor, 16 contra, com uma abstenção.