Investing.com – Juros em patamares elevados seguem como um dos principais desafios para a economia brasileira neste ano, em meio às incertezas sobre cortes nas taxas americana e sobre o cumprimento da meta fiscal a nível local. “Continuaremos a ver uma tendência de alta da dívida pública”, lamenta Camila Abdelmalack, economista-chefe da Veedha Investimentos, que concedeu entrevista à equipe do Investing.com Brasil.
Segundo a economista, para que houvesse alguma estabilização da razão de endividamento, seria preciso conquistar superávits fiscais nos próximos anos – o que ela acredita que não tende a acontecer.
“O governo vai depender quase que exclusivamente do desempenho das receitas, a arrecadação tributária vai ter que fazer frente às despesas que continuam crescendo acima da inflação. O governo vai contar com as medidas que foram adotadas no ano passado para equilibrar o orçamento nesse ano”, pontua, ao indicar que o mercado enxerga com ceticismo a meta do governo em zerar o déficit neste ano.
As medidas com foco na elevação da receita, implementadas pelo Ministério da Fazenda, não são o suficiente, no entendimento da economista. “Seria necessário que o governo promovesse algum contingenciamento ou revisão do lado dos gastos, mas isso não é o projetado e orçado para o ano de 2024. Portanto, a gente tem que esperar se haverá alguma notícia positiva do lado de receita ou alguma nova medida do governo”, completa.
Um mercado de trabalho resiliente deve ser um dos drivers para o crescimento da atividade e, ainda que não haja perspectiva de reaceleração da inflação de serviços ao longo do ano, a economista espera uma sustentação dos preços em nível mais alto, o que poderia colocar em risco comprimento da meta inflacionária ao longo do tempo.
Neste contexto, não haveria espaço para aceleração no ritmo de cortes na taxa de juros básica da economia brasileira, a Selic, tendo em vista que a autoridade monetária brasileira vem atuando com cautela.
Em alusão ao mês em que é comemorado o Dia Internacional da Mulher, o Investing.com Brasil publica uma série de entrevistas com economistas em cargos de chefia, com os principais temas macroeconômicos que devem movimentar os mercados neste ano.
Camila Abdelmalack é economista, com mestrado pelo Insper, além de 12 anos de experiência no mercado financeiro. A economista iniciou carreira em corretora de valores e, no início de 2020, ela aceitou o desafio de atuar como economista-chefe na Veedha Investimentos, uma das maiores assessorias de investimentos credenciadas à XP (NASDAQ:XP) (BVMF:XPBR31). Além disso, integra o time da Jovem Pan de comentaristas de economia.
Investing.com – Quais são os principais desafios para a economia brasileira em 2024, em sua visão?
Camila Abdelmalack – Sobre os desafios para economia brasileira em 2024, a taxa de juros no patamar ainda restritivo continuará, sem dúvidas, sendo um obstáculo importante para uma aceleração da economia doméstica. Embora a gente esteja acompanhando o corte de juros desde agosto de 2023 e as projeções apontem para uma Selic ao final de 2024 entre 9% ou 10%, para os que não estão tão otimistas, esse ainda é um patamar de juros que não é estimulativo para a economia.
O que está influenciando nessas projeções, sem dúvidas, inclui o componente do cenário externo, a recente precificação do mercado em relação ao início do corte de juros dos Estados Unidos e sua magnitude, assim como a questão da política fiscal, as dúvidas em relação ao comprimento da meta e a dinâmica do endividamento público por aqui.
Inv.com – Como avalia o processo de desinflação? O BC aplicou a melhor estratégia na condução da política de juros? Há espaço para aumentos dos cortes?
Abdelmalack – Sobre o processo de desinflação e a condução da política monetária aqui no Brasil, primeiro precisamos olhar sobre um aspecto global. Acompanhamos ao longo de 2023 uma queda no preço das commodities, o que favoreceu a desinflação global. A desvalorização dos preços das commodities agropecuárias e de energias favoreceu, então, o arrefecimento do grupo de preços de alimentação, de energia e de combustíveis. Isso foi muito importante e relevante para a trajetória de desaceleração do IPCA no Brasil, sem contar o efeito da política monetária restritiva durante a permanência da Selic no patamar de 13,75%.
Agora, quando analisa isso para o aspecto da condução da política monetária aqui no Brasil, observamos uma desaceleração nos núcleos de inflação em grupos de preços que vinham pressionando o índice. Essa desinflação continua em 2024, com os grupos caminhando no sentido da meta de inflação, mas os preços de serviços ainda preocupam e é algo que vem sendo pontuado pelos diretores do Banco Central.
Embora não exista uma expectativa de que a inflação de serviços possa reacelerar ao longo do ano, a expectativa é de que haverá uma sustentação dos preços em nível mais alto e isso pode colocar em risco comprimento da meta ao longo do tempo.
O Banco Central vem, então, priorizando ser parcimonioso, olhando para essa questão do grupo de serviços, que segue incerta, principalmente com sinais de aquecimento do mercado de trabalho e de olho na questão da política fiscal, que ainda reserva bastantes incertezas. O BC se mantém, por isso, cauteloso diante dessas questões.
Colocando a perspectiva de inflação de serviços ainda preocupando os diretores por conta da dinâmica do mercado de trabalho ainda aquecido, a questão da política fiscal, com as incertezas que ainda circundam esse cenário de contas públicas, e a dinâmica dos juros nos Estados Unidos, tudo isso leva a crer que há uma restrição para o aumento na magnitude do corte de juros aqui no Brasil.
Inv.com – Acredita que o governo será capaz de chegar próximo ou atingir a meta de zerar o déficit? Acha que as medidas alinhadas até o momento têm sido suficientes?
Abdelmalack – Em relação à dinâmica das contas públicas, a gente continuará a ver uma tendência de alta da dívida pública. Para que houvesse alguma estabilização da razão de endividamento, seria necessário que o governo atingisse superávits fiscais nos próximos anos, o que não está sendo previsto.
O governo vai depender quase que exclusivamente do desempenho das receitas, a arrecadação tributária vai ter que fazer frente às despesas que continuam crescendo acima da inflação. O governo vai contar com as medidas que foram adotadas no ano passado para equilibrar o orçamento nesse ano.
O que é importante pontuar é que o mercado tem um consenso de um déficit fiscal para 2024 ao redor de 0,7%, e está ancorado nessa expectativa.
Um resultado "menos pior" das contas públicas pode eventualmente surpreender positivamente. O mercado já tem um número que é bastante ruim, e tem uma inclinação para eventualmente ter uma surpresa positiva, dependendo de como for a dinâmica e as negociações que estão acontecendo ainda no Congresso.
Essas medidas que foram implementadas não são o suficiente porque, mesmo com elas, o consenso do mercado é de um déficit fiscal ao redor de 0,7%. Seria necessário que o governo promovesse algum contingenciamento ou revisão do lado dos gastos, mas isso não é o projetado e orçado para o ano de 2024. Portanto, a gente tem que esperar se haverá alguma notícia positiva do lado de receita ou alguma nova medida do governo.
Inv.com – Qual sua impressão sobre os potenciais drivers do Produto Interno Bruto (PIB) neste ano? A situação do El Niño ainda é um risco?
Abdelmalack – Em relação aos drivers para o PIB de 2024, que na minha projeção deve apontar para um crescimento ao redor de 1,5%, 0 consumo das famílias é um destaque por conta da resiliência do mercado de trabalho, com salários crescendo acima da inflação como consequência.
Com a condução da política monetária com os cortes de juros, a economia deve sentir os efeitos de uma melhora nas condições de crédito tanto para as empresas quanto para as famílias. Embora a taxa de juros ainda permaneça num patamar elevado, haverá uma melhora por conta dos cortes que estão sendo projetados. Deve haver uma materialização disso no mercado de crédito.
Outra questão também que ainda favorece o consumo das famílias é a inflação, que deve seguir bem-comportada no ano de 2024. Isso acaba favorecendo a renda real, o poder de compra das famílias. Outro aspecto também que deve continuar d impulsiona a atividade econômica é o setor exportador.
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