Por José de Castro
SÃO PAULO (Reuters) - A percepção de incerteza sobre os rumos da taxa de câmbio segue em alta a despeito do alívio recente na cotação do dólar, com analistas citando desde a política monetária norte-americana quanto as eleições locais como elementos a manter posições defensivas no mercado cambial.
Uma medida da volatilidade implícita nas opções de dólar/real para seis meses cravou 21 nesta quarta-feira, maior valor desde setembro de 2018. Com alguns recuos no meio do caminho, a curva de volatilidade tem subido desde janeiro.
A volatilidade implícita para três meses está em 19,59, próxima de picos desde janeiro do ano passado. O real tem a terceira maior volatilidade implícita entre seus principais pares emergentes, atrás apenas de rublo russo, que sofreu os choques da guerra da Rússia na Ucrânia, e lira da Turquia, país que está rapidamente consumindo suas reservas internacionais.
O dólar à vista era cotado em torno de 4,82 reais nesta quarta-feira e estava 5,2% acima da cotação mínima do ano, de 4,5820 reais, tocada em 5 de abril. Ainda caía, contudo, 15,8% desde o pico de 5,7260 reais alcançado em 6 de janeiro. A moeda brasileira vem numa montanha-russa e foi uma das que mais sofreram desde 20 de abril, quando um fortalecimento global do dólar alvejou divisas emergentes.
A política monetária norte-americana, que deve ficar ainda mais apertada, e problemas na China são as razões principais para os recentes movimentos de depreciação do câmbio, segundo analistas. Mas no plano local a eleição deve ganhar cada vez mais espaço e adicionar um componente de incerteza.
"O cenário externo difícil e as eleições que se aproximam provavelmente manterão o real numa faixa estreita, com um viés de enfraquecimento", disse em nota Bertrand Delgado, estrategista do Société Générale (EPA:SOGN).
"Mantemos nossa visão de que um dólar forte, elevada volatilidade nos ativos, as próximas eleições e as preocupações com os riscos fiscais locais provavelmente prejudicarão o real", completou. O SG estima dólar de 5,45 reais ao fim de 2022.
O Bradesco (SA:BBDC4) divulgou estudo em que também cita receios sobre as contas públicas como fator a manter o real desvalorizado em relação ao que vê como taxa "justa", que com base em dois modelos estaria entre 4,40 reais e 4,50 reais por dólar.
"Apesar de os modelos indicarem apreciação do Real, acreditamos que existem vetores para ambas as direções e que há uma incerteza acima da usual para essa variável", disseram Rafael Martins Murrer, Henrique Monteiro de Souza Rangel e Fabiana D'Atri no estudo.
Em relatório deste mês, o BTG Pactual (SA:BPAC11) chamou atenção para o risco de os problemas fiscais tornarem o juro brasileiro --cuja alta é vista como um dos fatores de suporte ao câmbio-- menos atrativo.
"Os riscos fiscais voltaram ao protagonismo do debate econômico doméstico, com a questão dos reajustes salariais dos servidores ainda indefinida", disseram analistas do banco.
"Entendemos que a definição de novos compromissos para o governo podem contratar novos movimentos de depreciação do Real", completaram, adicionando que mantêm previsão de dólar a 4,80 reais ao fim do ano, mas com balanço de risco "mais pessimista" na margem.