Lima, 22 dez (EFE).- A floresta amazônica peruana viveu este ano
um inusitado surto de violência, que deixou 34 mortos em choques
entre policiais e indígenas, sobre a legalidade de decretos sobre
investimentos ligados ao petróleo na selva, incidentes que colocaram
em relevo a tradicional marginalização dos povos nativos.
Os nativos, liderados pela Associação Interétnica de
Desenvolvimento da Floresta Peruana (Aidesep), iniciaram um protesto
no dia 9 de abril contra dez decretos legislativos que consideravam
lesivos a seu direito sobre suas terras, contido em um tratado da
Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Os protestos das comunidades amazônicas - 400 mil pessoas que
ocupam 62% do território peruano - se deram em um contexto em que o
Governo do presidente peruano, Alan García, pretende aumentar suas
reservas de gás e petróleo, presentes, sobretudo, na floresta, para
fazer frente a uma eventual crise energética e se transformar em um
país fornecedor.
Com a falta de diálogo entre os indígenas e o Executivo, o
contínuo adiamento do debate no Congresso sobre suas reivindicações
e vários meses de protestos, o mal-estar dos nativos se exacerbou no
dia 5 de junho, data em que é comemorado o Dia Mundial do Meio
Ambiente.
O epicentro da violência foi a província amazônica de Bagua, no
nordeste do país. Cinco mil nativos bloquearam uma importante
estrada que une a costa norte peruana à floresta.
No começo da manhã daquele dia foi realizada uma operação
policial por ar e por terra para liberar a estrada, que gerou
enfrentamentos. Dez civis foram mortos, entre indígenas e habitantes
de Bagua, além de 12 agentes da Polícia. O corpo de um deles ainda
está desaparecido.
A notícia sobre o conflito na estrada correu e chegou à remota
estação 6, na cidade de Imacita, onde os indígenas assassinaram,
aparentemente em represália, 12 policiais dos 38 que mantinham como
reféns.
Pouco depois destes fatos, milhares de indígenas se esconderam em
igrejas, começaram as investigações e o líder da Aidesep, Alberto
Pizango, se refugiou na embaixada da Nicarágua em Lima ao ser
acusado pelo Governo, junto a outros líderes nativos, de instigar os
enfrentamentos em Bagua.
Pizango, atualmente asilado na Nicarágua, é criticado por ter
fugido do país e, apesar de ter um processo judicial pendente pela
violência em Bagua, não descarta candidatar-se às eleições
presidenciais de 2011.
A violência em Bagua obrigou o Congresso peruano a derrogar, no
dia 18 de junho, duas das leis rechaçadas pelas comunidades da
floresta. Além disso, o Executivo foi obrigado a formar uma comissão
investigadora, seguindo as recomendações do relator especial da ONU
para os povos indígenas, James Anaya.
A comissão tornou público que muitos fatos não serão esclarecidos
devido ao hermetismo tanto entre os policiais quanto entre os
indígenas.
Os nativos alegam há anos que a exploração de petróleo e da
madeira poluiu suas águas, causou o desmatamento de seus
territórios, reduziu seus recursos, além de ter trazido diversas
doenças, algumas fatais.
Mas foram os protestos na Amazônia de 2008 e 2009 - a deste ano a
mais violenta no Peru nesta década - que fez com que o Governo em
geral escutasse as exigências e desse voz aos indígenas, que, embora
vivam sob seus costumes ancestrais, reivindicam seu direito a serem
respeitados como cidadãos. EFE