Por Lisandra Paraguassu
BRASÍLIA (Reuters) - Diante da constatação de que não teria condições de aprovar a reforma da Previdência como está, o governo federal admitiu nesta quinta-feira alterar a proposta em pelo menos cinco pontos mais sensíveis, que podem reduzir economia com a reforma em 115 bilhões de reais ao longo de 10 anos.
O governo aceitou alterar as regras de transição, as normas para aposentadoria rural, o acúmulo de pensões, aposentadorias especiais para professores e policiais e os Benefícios de Prestação Continuada.
Com isso, a economia prevista de 678 bilhões de reais ao longo de 10 anos com o novo regime previdenciário seria reduzida em 17 por cento, disse a Casa Civil nesta quinta-feira. Mais cedo, o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, havia dito que esse impacto seria de 10 por cento.
A mudança de rumo também levou à extensão do cronograma da comissão especial que analisa a reforma da Previdência. A apresentação do relatório do deputado Arthur Oliveira Maia (PPS-BA), prevista inicialmente para esta semana e já adiada para a próxima, foi remarcada agora para o dia 18 deste mês, informou o presidente da comissão, Carlos Marun (PMDB-MS).
O presidente Michel Temer chamou na noite de quarta-feira uma reunião com Oliveira Maia e Marun, além dos ministros da Casa Civil, Eliseu Padilha, e da Fazenda, Henrique Meirelles, para informar que o governo concordava em modificar os pontos que estavam dificultando uma negociação com os parlamentares.
"Essa manifestação do presidente deixa a nós todos, deputados da base, livres para podermos avançar e realizar esses ajustes, mas todos eles para atender os menos favorecidos", disse Oliveira Maia.
Segundo o relator, ainda não há definição sobre as alterações que serão feitas em todos esses pontos, mas o governo e os parlamentares estudam alternativas, especialmente para as regras de transição.
Uma das opções que está sendo estudada, afirmou Oliveira Maia, é a possibilidade de se criar uma idade mínima de aposentadoria para vigorar durante a transição, a partir da promulgação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC), que poderia ser de 60, 57 ou 55 anos.
Outra possibilidade é ampliar o prazo de transição, o que já vem sendo estudado há algum tempo pelos técnicos do governo.
"As prováveis mudanças serão primeiro no sentido de trazer a inclusão na regra um pouco para trás e depois a compatibilização entre idade mínima e tempo de contribuição", disse o relator.
O governo ainda tenta encontrar também uma fórmula para a aposentadoria rural. Parte dos parlamentares quer evitar a cobrança de contribuição e outros defendem também uma idade mínima menor que os 65 anos que valerá para os trabalhadores urbanos.
O relatório deve prever ainda a autorização para acúmulo de pensões em um valor ainda a ser definido, mas que não ultrapasse o teto da Previdência e regras especiais para professores e policiais --neste caso, um dos principais problemas dos deputados com suas bases, já que as duas categorias têm enorme resistência às mudanças.
"Não há aí nenhum privilégio, o que existe é buscar um equilíbrio maior, um senso de justiça", disse o relator, defendendo ainda que as duas categorias já tinham regras especiais.
RESPONSABILIDADE FISCAL
Apesar das mudanças em pontos centrais da reforma, o discurso do governo continua sendo de que não haverá prejuízo do ajuste fiscal.
Depois de anunciadas as alterações, Temer afirmou que o governo ainda vai analisar o impacto fiscal das mudanças propostas na reforma da Previdência e negou, com irritação, que tenha recuado da proposta inicial, mais dura. [nL2N1HE1QN]
No início da noite, por meio de nota, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, afirmou que as mudanças preservam o ajuste fiscal. [nE6N1GJ01E]
O analista de finanças públicas da consultoria Tendências, Fabio Klein, acredita que o governo tem alguma margem de gordura, sobretudo com relação à idade mínima --diferença para homens e mulheres-- e na regra de transição.
"Em linhas gerais, a proposta veio com uma certa dose de gordura com o governo sabendo que haveria discussões pela frente", avalia Klein.
Na quarta-feira, o jornal Estado de S. Paulo revelou um levantamento próprio que mostrava menos de 100 deputados a favor da reforma entre os 433 ouvidos pelo jornal. São necessários 308 votos para a aprovação de uma PEC.
No mesmo dia, fontes palacianas confirmaram à Reuters que os números do governo mostravam também dificuldade de aprovar a reforma sem mudanças consistentes, mesmo com uma suposta base de 414 parlamentares.
Daí a decisão do governo de aceitar alterações mais amplas e retardar a apresentação do relatório de Oliveira Maia, inicialmente programado para esta semana.
(Reportagem adicional de Luiz Guilherme Gerbelli, em São Paulo, e Marcela Ayres, em Brasília)