Por Eduardo Simões e Maria Carolina Marcello
SÃO PAULO/BRASÍLIA (Reuters) - Um comparecimento maciço às manifestações convocadas pelo presidente Jair Bolsonaro para o feriado do Dia da Independência na terça-feira ajudará o presidente em sua tentativa de acuar o Supremo Tribunal Federal (STF), a quem tem atacado frequentemente, e eventuais episódios de violência durante os atos elevarão ainda mais o grau de instabilidade institucional no país.
Bolsonaro tem apostado suas fichas nas manifestações de 7 de Setembro, em busca de mostrar força e apoio popular num momento em que pesquisas de opinião mostram queda de sua popularidade, apoiadores e ele próprio são alvos de investigações judiciais e seu governo é acossado pela alta da inflação, uma crise hídrica que ameaça descambar para uma crise energética e demonstrações de descontentamento de setores econômicos que antes o apoiavam.
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Para analistas ouvidos pela Reuters, o presidente poderá usar um eventual e, na avaliação desses especialistas, provável grande comparecimento aos atos em seu discurso de que tem o povo ao seu lado, tentando com isso intimidar o STF, órgão que tem sido alvo de ataques quase diários do presidente, especialmente nas pessoas dos ministros Luís Roberto Barroso e Alexandre de Moraes.
"O 7 de Setembro é especialmente importante nesse jogo do presidente se movimentando por meio do tensionamento institucional tendo em visto os riscos não somente para o seu mandato, mas sobretudo para o status jurídico do seu núcleo político, em particular o núcleo familiar", disse o analista da Tendências Consultoria Rafael Cortez.
"O presidente tenta, por meio dessas manifestações, constranger decisões futuras que atores do Judiciário possam tomar envolvendo diretamente esse núcleo político", explicou.
Bolsonaro tem acusado Moraes e Barroso de atuarem fora dos limites impostos pela Constituição, ao mesmo tempo que afirma que, em resposta, também poderá desrespeitar a Carta Magna. O presidente afirmou na semana passada que os protestos do Dia da Independência serão um ultimato aos dois ministros e tem estimulado a participação de policiais militares nas manifestações, apesar de a legislação proibir que policiais da ativa se envolvam em protestos políticos.
"Essa estratégia, se não o ajuda para o plano eleitoral de 2022, ao menos dá um sinal que tem ainda uma mobilização importante de apoiadores do presidente. No fundo o que o presidente quer é aumentar um custo de uma eventual decisão negativa seja em relação ao seu mandato seja de um relação a essa questão mais individual", disse Cortez.
A retórica inflamada de Bolsonaro sobre os atos de 7 de Setembro --que se reflete no discurso de seus apoiadores em redes sociais, alguns deles prometendo comparecer armados-- gera o risco e temores de atos violentos, especialmente em Brasília, onde há receio de ataques ao prédio do Supremo, e em São Paulo, onde uma manifestação contrária ao presidente acontecerá no Vale do Anhangabaú, perto da Avenida Paulista, local do ato de apoiadores de Bolsonaro.
BARRIL DE PÓLVORA
O presidente promete comparecer a esses dois atos e discursar em ambos, e as palavras que dirá aos apoiadores também deverão ser acompanhadas com lupa por políticos e analistas.
"O barril de pólvora vai ser colocado na rua, resta saber se alguém vai acender o fósforo. Aí a grande pergunta é saber a quem isso atende e me parece obviamente, na percepção do presidente da República, isso atende a ele", disse o consultor político e CEO da Dharma Politics, Creomar de Souza.
Bolsonaro cita constantemente riscos de conflitos sociais e também frequentemente lembra o fato de ter feito parte das Forças Armadas --foi capitão do Exército-- e cita os militares como responsáveis por garantir a liberdade e a democracia.
Na avaliação do cientista político e mestre em Direito Luiz Alexandre Souza da Costa, que é militar da reserva da Polícia Militar do Rio de Janeiro, os protestos de terça devem ter grande comparecimento, dando ao presidente a manifestação de força que procura na tentativa de fazer frente a instituições democráticas responsáveis pelo sistema de freios e contrapesos.
"Para o Bolsonaro é muito difícil entender democracia liberal quando se tem ali um Poder antimajoritário como a Suprema Corte, porque para ele democracia é uma democracia autoritária, no contexto dele: 'Ganhei a eleição e agora eu faço o que eu quiser porque eu sou a maioria e pronto e acabou'", disse.
"O cenário que vejo que deve acontecer é: eles vão encher as ruas. Eles são uma minoria muito aguerrida, muito barulhenta e organizada. Eles vão encher as ruas. Isso vai dar para um presidente fraco uma demonstração de força."
Para o cientista político e professor do Insper Carlos Melo, há três possíveis cenários mais prováveis e suas consequências, que, avalia, ficarão claras somente no dia seguinte, a quarta-feira, 8 de setembro.
"A manifestação foi pacífica e foi pequena, irrelevante: Bolsonaro está na chuva. A manifestação foi grande e foi pacífica: aí eu diria para você que Bolsonaro mostrou força e demonstrou controle, seria o melhor cenário para ele. As manifestações foram grandes e não foram pacíficas: aí com a palavra, as instituições e a oposição", afirmou.
"Não existe um cenário bom em que você possa dizer que no dia 8 se volta à normalidade. Eu não vejo", avaliou.