O ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, Paulo Teixeira (PT), disse que o governo quer destinar propriedades rurais de “maus pagadores” para criar assentamentos. Segundo o ministro, a prática denominada por ele de programa de “adjudicação” já existia antes do 3º governo Lula.
“O que nós estamos tentando inovar é que esses bens sejam destinados para o assentamento de famílias quando se trata de assentamentos rurais”, disse Teixeira ao Poder360. “É um programa que o Estado brasileiro sempre fez. O que a gente quer é a destinação desses bens para o assentamento de tantas famílias que estão vivendo em acampamentos, em beira de estrada”.
A declaração foi feita depois de o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) publicar um vídeo de Teixeira no qual o ministro questiona se o Banco do Brasil (BVMF:BBAS3) pode dar “terras de maus pagadores para assentar mais gente na reforma agrária”. O ex-presidente escreveu a seguinte mensagem ao compartilhar as imagens: “Vem aí a expropriação de terras”.
Os bancos usam imóveis de clientes como garantia de um empréstimo. Em caso de descumprimento das parcelas, a instituição passa a ter o direito de tomar aquele imóvel para si como forma de quitar a dívida.
Nesse processo, pessoas físicas e jurídicas e o governo federal podem adquirir imóveis de propriedade dos bancos. São essas propriedades que o ministério pretende usar para criar assentamentos.
O vídeo compartilhado por Bolsonaro foi gravado durante uma visita de Teixeira ao assentamento Dorcelina Folador, em Arapongas (PR), em 9 de outubro de 2023. Nas imagens, o ministro conversa com José Ricardo Sasseron, vice-presidente de Negócios, Governo e Sustentabilidade Empresarial do Banco do Brasil, sobre o processo de alienação de imóveis no Brasil, chamado por Teixeira de “programa de adjudicação” –ato que transfere a propriedade de um devedor ao seu credor.
“Eu queria, Sasseron, ver se o Banco do Brasil dá as terras de maus pagadores para assentar mais gente na reforma agrária como aconteceu aqui no Dorcelina Folador”, disse o ministro.
A Fazenda São Carlos, onde está o assentamento, foi comprada pelo Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) em 1998 por meio de processo de compra e venda (via decreto nº 433/1992). A propriedade foi vendida pelo Banco do Brasil depois de ter sido dada como garantia por um cliente.
Em nota, o Incra disse que a fazenda foi transformada em assentamento em 2000. A propriedade tem 757 hectares, com capacidade para 90 famílias de trabalhadores rurais.
- 1 hectare – equivale a um terreno de 10.000 metros quadrados, algo como 2 campos de futebol; ou seja, 756 hectares são o equivalente a 1.504 campos de futebol.
O Banco do Brasil informou em nota que a alienação de bens é uma prática comum no Sistema Financeiro Nacional e que segue rigorosamente a legislação e normativos em vigor. Segundo a instituição financeira, foram vendidos mais de 6.000 imóveis neste processo, sendo 234 imóveis rurais e 5.814 urbanos nos últimos 5 anos.
O STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu nesta 5ª feira (26.out.2023) que os bancos e outras instituições financeiras podem tomar, sem decisão judicial, imóveis financiados quando houver atraso no pagamento. Foram 8 votos a favor e 2 contra.
Grupo Atalla
No vídeo compartilhado por Bolsonaro, Teixeira também diz que quer implementar o programa de adjudicação em propriedades do Grupo Atalla, no Paraná. “A 1ª ação que vamos fazer vai ser aqui no Paraná de adjudicação dessas terras dos Atallas”, afirma.
Os bancos não podem divulgar informações de seus clientes por uma questão de sigilo bancário.
Uma fazenda do Grupo Atalla localizada em Florestópolis (PR) foi ocupada por integrantes do MST em 2014. Na ocasião, cerca de 500 famílias de agricultores invadiram o imóvel.
Em 2016, outra propriedade do grupo, esta, por sua vez, localizada em Jaú (SP), foi ocupada por cerca de 1.000 pessoas ligadas ao MST. Na época, o movimento justificou o ato porque a fazenda estava “abandonada”.
O Poder360 entrou em contato com o Grupo Atalla por meio da Usina Central do Paraná, uma das empresas do grupo, mas não conseguiu obter um posicionamento até a publicação deste texto. O espaço segue aberto.
Eis a íntegra de Paulo Teixeira:
“O Estado brasileiro normalmente tem crédito em relação a grandes devedores de impostos e tem crédito também em relação a grandes devedores de empréstimos. O que o Estado faz? Dá inúmeras chances para o devedor pagar a sua dívida junto ao Estado, quando ele não paga suas dívidas o Estado penhora bens.
O programa de adjudicação de terras de grandes devedores é isso. O que nós estamos tentando inovar é que esses bens sejam destinados para o assentamento de famílias quando se trata de assentamentos rurais. É um programa que o Estado brasileiro sempre fez. O que a gente quer é a destinação desses bens para o assentamento de tantas famílias que estão vivendo em acampamentos, em beira de estrada, cujos filhos nascem nesses acampamentos sem nenhuma qualidade de vida.
O programa de adjudicação de grandes devedores está previsto na legislação brasileira, legítimo que a gente está querendo. O que a gente está querendo fazer é destinar esses bens para assentamentos de famílias que querem ser lavradores, mas não tem terra para essa finalidade.”
Eis a íntegra da nota do Banco do Brasil:
“O Banco do Brasil atua com as melhores práticas bancárias no processo de cobrança e regularização de créditos, priorizando o recebimento de parcelas em atraso no menor prazo possível, atuando preventivamente, de modo a evitar a inadimplência e a ocorrência de perdas, sempre na busca das melhores soluções financeiras para seus clientes. No entanto, quando o rito de cobrança não surte efeito, faz-se necessária a execução de garantias. A partir do desembaraço dos bens, é realizada a alienação, prática comum no Sistema Financeiro Nacional, seguindo rigorosamente a legislação e normativos em vigor. Neste processo, pessoas físicas, jurídicas, Governo Federal, Estaduais ou Municipais e demais entidades públicas podem adquirir estes imóveis de propriedade do BB, por valores de mercado. Nos últimos 5 anos, por exemplo, foram vendidos mais de 6 mil imóveis neste processo, sendo 234 imóveis rurais e 5,814 mil urbanos”.
Eis a íntegra da nota do Incra:
“A Fazenda São Carlos, no município de Arapongas (PR), foi adquirida em 1998 pelo Incra, por meio de processo de compra e venda (vide Decreto nº 433/1992). O assentamento Dorcelina Folador, implantado na área – que tem 756,7855 hectares –, conta com capacidade para 90 famílias de trabalhadores rurais. A criação do assentamento ocorreu no ano 2000.”