Por Marcelo Rochabrun
SÃO PAULO (Reuters) - Bastou algumas semanas de quarentenas para forçar Latam Airlines (NYSE:LTM) e Avianca Holdings a pedirem proteção da justiça contra credores, o que tornou a América Latina a principal região do mundo para a ruína financeira de uma companhia aérea. Os pedidos de recuperação judicial de ambas as companhias neste mês agora terão um efeito sobre United Airlines (NASDAQ:UAL) e Delta Air Lines (NYSE:DAL), que fizeram apostas no futuro do setor aéreo na América Latina que poderão custar bilhões a ambas.
"O setor aéreo não vai sobreviver sem ajuda do governo", disse o presidente-executivo da Latam no Brasil, Jerome Cadier, à Reuters.
A Latam sozinha representa 40% do tráfego de passageiros na América Latina e o pedido de recuperação marca mais um revés para a Airbus (PA:AIR), que tem Latam e Avianca como os principais clientes na região.
Cadier negocia há dois meses financiamento governamental, enquanto a maior parte do espaço aéreo da América Latina segue sob grandes restrições de viagens, apesar de reaberturas em outras partes do mundo.
A América Latina já era a região do mundo menos lucrativa para companhias aéreas antes da crise, por causa de volatilidade cambial, carga tributária elevada e recessão no Brasil.
Apesar disso, há muito tempo a região é vista como tendo um grande potencial, suficiente para que Delta e United investissem pesado para tirar a American Airlines (NASDAQ:AAL) do posto de maior companhia aérea dos Estados Unidos a voar para o continente.
COMPANHIA ESTRATÉGICA
A Delta comprou 20% da Latam em dezembro enquanto a United acertou uma parceria com a Avianca em 2018 que envolveu financiar interesses de negócios pessoais de seu controlador.
Três bilhões de dólares depois, ambas as companhias aéreas norte-americanas ainda não têm liberação para coordenar voos com seus parceiros. Aos preços atuais, a Delta poderia comprar a Latam quatro vezes com o dinheiro que investiu na pequena participação que adquiriu na empresa. Já a United poderia comprar a Avianca mais de 20 vezes.
Se você tivesse investido 100 dólares na Avianca no começo do ano, teria hoje 6,50 dólares. Em seu auge, a Latam chegou a ser a segunda companhia aérea do mundo em valor de mercado.
Em parte por causa do tamanho da Latam, afirmam analistas, as ações da empresa não caíram tanto após o anúncio da recuperação judicial quanto seus pares. "São especuladores que estão apostando em um pacote de ajuda", disse Cristian Araya, da corretora chilena, Vantrust Capital.
O Chile, onde milhões de pessoas coletivamente possuem 15% da Latam por meio de fundos de pensão, declarou nesta semana que a empresa é uma "companhia estratégica", mas não mencionou medidas de apoio à empresa. A Colômbia não se pronunciou sobre a Avianca.
Juntas, Latam e Avianca empregam mais de 60 mil pessoas, embora a maior parte delas esteja recebendo metade do salário ou não sendo paga.
REUNIÕES DE EMERGÊNCIA
Na segunda-feira, o conselho de administração da Latam promoveu a décima reunião de emergência desde abril para formalizar o pedido de recuperação judicial. O anúncio surpreendeu muitos e as ações da empresa acumulam queda de mais de 60% desde terça-feira.
Segundo os documentos do pedido à justiça dos Estados Unidos, a Latam não honrou pagamentos de dívida, assustando bancos e empresas de leasing de aeronaves. A empresa consumiu em abril sua linha de crédito de emergência. Acionistas rejeitaram decisões do conselho da Latam forçando a empresa a pagar dividendos para eles mesmos que a empresa não tinha condições de pagar.
Sem o pedido de recuperação, a Latam teria que pagar cerca de 200 milhões de dólares em despesas até a próxima semana. Isso representa quase um terço dos recursos totais em caixa detidos pelas subsidiárias da companhia aérea que participam do pedido.
Ao mesmo tempo, a Delta abandonou acordo anterior para comprar quatro Airbus A350 que a Latam não tinha mais interesse em ter, pagando apenas uma fração do preço das aeronaves. A Latam quer devolver imediatamente 15 aviões da Airbus e a Avianca, outros 8.
"Eu acho que o que não percebemos é que (a Latam) realmente precisa ser uma companhia aérea muito menor", disse Savanthi Syth, analista da Raymond James. Mais cedo nesta semana analistas da Raymond James ainda mantinham recomendação de compra para as ações da Latam e afirmando que a dívida da companhia era "administrável".
Cadier afirmou à Reuters que espera que a Latam encolha em até 40%, o que inclui demissões.
Em relatório em que corta a recomendação da Latam após o pedido de recuperação judicial, os analistas da Raymond James afirmaram que tinham boas notícias sobre as rivais da Latam, Gol (SA:GOLL4), Azul (SA:AZUL4) e Copa Holdings.
"Não esperamos pedidos similares (de recuperação judicial)", afirmaram os analistas.