Por Letícia Fucuchima
SÃO PAULO (Reuters) - A capacidade da indústria fornecedora de equipamentos para transmissão de energia elétrica se apresenta como o principal desafio associado aos megaleilões do segmento previstos para este e o próximo ano, avalia a Associação Brasileira da Empresas de Transmissão de Energia (Abrate).
Empresas que fabricam transformadores e reatores para projetos de transmissão de energia, como WEG (BVMF:WEGE3), Siemens e ABB, estão com as fábricas cheias e direcionando muito de sua produção para atividades concorrentes, como a geração renovável, ou para exportação.
"Na média, 70% da produção nacional (de transformadores) é para exportação. Para os 30% restantes, tem as fontes renováveis, a indústria e depois a transmissão", explica Mario Miranda, presidente da associação das transmissoras.
"Os fabricantes não dão muita preferência, eles têm menos lucro com a transmissão", explicou, citando que os elevados deságios oferecidos pelas empresas construtoras de linhas de transmissão, na disputa pelos projetos, contribuem para esse cenário.
O Brasil vai leiloar até meados de 2024 projetos de transmissão equivalentes a 56 bilhões de reais em investimentos, sendo 36 bilhões de reais em lotes já anunciados para os dois certames deste ano e mais 20 bilhões no próximo ano.
Segundo o presidente da Abrate, a capacidade da indústria de atender esses projetos não é um ponto de tanta atenção para o certame desta sexta-feira, mas principalmente para os leilões seguintes, como o de outubro, que deverá ser o maior da história.
Apenas como comparação, os nove lotes que serão disputados no leilão desta semana somam 400 megavolt-ampere (MVA) em capacidade de transformação, contra 9.840 MVA dos projetos do leilão de outubro, que inclui um linhão em corrente contínua que demandará sozinho quase 16 bilhões de reais em aportes estimados.
Miranda afirmou que a entidade tem conversado com as fabricantes para melhorar a situação.
"Aí muitos podem tomar decisão de abrir mais um turno de trabalho, contratação de mais pessoal, e em última instância até de expansão industrial", disse.
Ele lembrou ainda que, geralmente, as empresas que disputam os leilões fecham pré-contratos com seus fornecedores, a fim de evitar problemas à frente caso realmente vençam os lotes.
A associação das transmissoras vem realizando um estudo junto ao mercado para entender quais dificuldades o Brasil pode ter para absorver o elevado volume de projetos de transmissão que serão desenvolvidos ao mesmo tempo no país.
"Normalmente, nós (o setor de transmissão) investimos algo em torno de 14 bilhões de reais por ano... De repente, estamos falando em valores bastante superiores, de 40 a 50 bilhões, isso passou a nos preocupar", afirmou Miranda.
OUTROS GARGALOS
Além da capacidade industrial, a Abrate vê possíveis dificuldades de financiamento para os projetos, sobretudo no caso de emissões de debêntures de infraestrutura. Isso reflete a piora geral do mercado de crédito, com casos como o da Light (BVMF:LIGT3), que entrou em recuperação judicial e iniciou um embate com seus credores debenturistas.
"Isso (caso da Light) no mercado cria problema mesmo, cria percepção de mais risco."
Ainda entre as possíveis dificuldades para o mercado de transmissão, ele citou o enxugamento do mercado de empreiteiras após a operação Lava Jato e a necessidade de capacitação de mão de obra.
"Estamos buscando parceria com o Sistema S para treinamento e capacitação, principalmente nas regiões onde estarão os principais projetos, como Bahia e norte de Minas Gerais."
PRIMEIRO LEILÃO DE 2023
O leilão de transmissão desta sexta-feira oferecerá ao mercado nove lotes, envolvendo um total de 6,1 mil quilômetros de novas linhas de transmissão e investimentos de 15,8 bilhões de reais. Os projetos buscam reforçar a capacidade para o escoamento da eletricidade produzida principalmente na região Nordeste, onde tem crescido a geração eólica e solar.
A expectativa é de um certame com a presença massiva de grandes empresas do setor elétrico, já que os investimentos são vultosos e deverão restringir a concorrência entre aquelas empresas com maior fôlego financeiro.
Entre as elétricas que já disseram que devem disputar o certame, estão Eletrobras (BVMF:ELET3), Engie (BVMF:EGIE3), Cemig (BVMF:CMIG4), Neoenergia (BVMF:NEOE3) junto do fundo soberano de Cingapura GIC, e as transmissoras ISA Cteep, Taesa (BVMF:TAEE11) e Alupar (BVMF:ALUP11).
Empresas como CPFL (BVMF:CPFE3) e Auren Energia (BVMF:AURE3) também estavam estudando lotes e potenciais sinergias com suas operações.
Em relatório, analistas do BofA (NYSE:BAC) estimaram que o leilão deve render às empresas projetos com retorno real em torno de 7,5%, considerando um cenário de deságios na casa de 30% sobre os valores máximos de receita anual permitida (RAP) e mais eficiência de Capex.
(Por Letícia Fucuchima)