Por Nayara Figueiredo
SÃO PAULO (Reuters) - A companhia de alimentos M. Dias Branco (SA:MDIA3) acredita na possibilidade de um incremento no consumo de massas no Brasil, em detrimento do arroz, que passa por um momento de preços nunca antes vistos em meio à forte demanda, um dos impactos do coronavírus para este mercado.
"Arroz, feijão e massas são produtos tradicionalmente substitutos, principalmente porque as massas têm preços mais baixos", disse à Reuters o diretor de Relações com Investidores e Novos Negócios da M. Dias, Fábio Cefaly.
"Pode sim ter algum impacto do ponto de vista da demanda se o consumidor fizer a substituição. Não descartamos esse cenário", acrescentou ele, ressaltando que a empresa está preparada e pode atender uma demanda adicional por massas.
A M. Dias Branco é líder no mercado de massas, com cerca de 34% do "market share" da categoria. Na empresa, a área representa cerca de 20% da receita total.
Segundo Cefaly, o produto contribuiu para que o lucro da companhia saltasse em mais de 50% no segundo trimestre, com o isolamento social contra a Covid-19 também puxando a demanda pelo alimento, assim como no arroz. A companhia também é líder no mercado de biscoitos.
No arroz, produto básico na dieta do brasileiro, a valorização do dólar decorrente da pandemia tornou mais atrativas as exportações e encareceu a entrada do cereal importado, que tradicionalmente complementa a oferta local.
O indicador do arroz em casca Esalq/Senar-RS fechou em 104,58 reais por saca de 50 kg na última sexta-feira, alta de 11,23% na variação mensal e um salto de 130% ante o valor registrado no mesmo período de 2019, de 45,55 reais.
O cenário levou o Comitê-Executivo de Gestão da Câmara de Comércio Exterior (Camex) a zerar a alíquota do Imposto de Importação para o arroz em casca e beneficiado até o fim deste ano.
O presidente Jair Bolsonaro chegou a afirmar que avalizou uma decisão da Secretaria de Defesa do Consumidor (Senacon) de abrir apuração para verificar se há irregularidades no preço do arroz e outros alimentos, mas reiterou que não vai interferir no mercado a fim de reduzir o valor do insumo.
Apesar de toda a mobilização, representantes do setor ouvidos pela Reuters disseram que a tendência é de manutenção dos preços do cereal em patamar elevado. Com isso, crescem as chances de substituição do alimento por outros, como as massas.
Na hipótese de migração de parte do consumo para o macarrão, Cefaly ressaltou que a M. Dias Branco conta com capacidade operacional para atender um eventual aumento de demanda.
"Se necessário, conseguimos fazer ajustes nos turnos. Não há nenhuma dificuldade operacional", comentou.
CUSTOS VS PREÇOS
Se o câmbio aumentou os custos da indústria beneficiadora de arroz, também elevou o montante gasto pelo setor de trigo para adquirir a matéria-prima, disse Cefaly, lembrando que, no caso deste último cereal, cerca de 50% do total consumido no país é importado.
Consequentemente, isso também impacta a indústria de massas, acrescentou o executivo.
"Tradicionalmente, agora a gente deveria ver uma queda no preço do trigo, com o início da colheita nacional. É garantia que isso vai acontecer? Não é", explicou ele, ressaltando que a chegada da safra brasileira não trouxe alívio ao setor em termos de custos, dado o patamar ainda elevado do dólar.
Ele lembrou que a companhia fez dois reajustes de preços no portfólio de produtos ao longo do ano, próximos de 5% e 6%, "com muita cautela, olhando para a reposição das margens, mas também para a situação do consumidor".
Questionado sobre a possibilidade de um novo reajuste, atrelado ao aumento da demanda ou à pressão de custo, o executivo da M. Dias Branco disse que a companhia tem a obrigação de examinar a condição das margens. No entanto, se um repasse for aplicado, "seria algo muito cirúrgico".
O presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Biscoitos, Massas Alimentícias e Pães & Bolos Industrializados (Abimapi), Cláudio Zanão, afirmou que o aumento de preços ao consumidor costuma ser a última ideia da indústria devido ao impacto que pode ocasionar queda de consumo.
"Entretanto, o câmbio continua pressionando margens e podemos ter novos reajustes. Sem dúvida, a gente não nega, espero que não, mas é possível", admitiu.
(Por Nayara Figueiredo; edição de Roberto Samora)