Por Luciano Costa
SÃO PAULO (Reuters) - Os impactos do coronavírus sobre o mercado de energia no Brasil, como queda do consumo e maior inadimplência, devem reduzir a geração de caixa das empresas do setor elétrico até 2021 e podem levar algumas delas a romper limites de alavancagem acertados junto a credores, disse a Fitch Ratings nesta terça-feira.
A agência de classificação de risco projetou que a pandemia deve cortar em 5,6 bilhões de reais a geração de caixa das elétricas no período, medida pelo lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda).
Somente neste ano a queda no Ebitda das empresas do setor somaria 3,2 bilhões de reais, acrescentou a Fitch, em apresentação online sobre os efeitos da pandemia.
Essas perdas poderão levar algumas das companhias a romper níveis máximos de endividamento acertados junto a credores, os chamados "covenants", que levam em conta relação entre Ebitda e dívida líquida, disse o diretor sênior da Fitch, Mauro Storino.
O rompimento dos covenants pode levar ao vencimento antecipado de dívidas, mas Storino ressaltou que essa hipótese mais extrema não deve se concretizar, ao menos para as empresas de energia.
"Acho que 2020 é um ano completamente atípico, e no caso do setor elétrico vai haver, como falamos, alguma queda de Ebitda. Não só no setor elétrico, mas de forma geral, para todos setores, vamos estar observando várias empresas quebrando covenants", afirmou.
"Mas é um momento ímpar... as empresas negociam com o credor... quebras de covenants podem acontecer sim, mas não acreditamos que isso possa gerar pressão de liquidez para as empresas que a gente cobre, pelo menos no setor elétrico", afirmou.
Eventuais renegociações com credores, no entanto, podem elevar custos para as empresas, apontou.
Em meio à projeção de fortes impactos sobre as empresas, o governo articulou um pacote de até 16 bilhões de reais em financiamentos para as distribuidoras, a chamada Conta-Covid, que envolverá um grupo de bancos liderado pelo BNDES.
A maior parte das distribuidoras aderiu ao mecanismo de apoio, que permite o repasse dos custos de amortização dos empréstimos às tarifas nos próximos cinco anos. No total, as empresas tomarão 14,8 bilhões de reais.
"A Conta-Covid foi muito positiva para as distribuidoras, a adesão das empresas fala por si só", disse Storino.
PRESSÃO
Em geral, as elétricas Light (SA:LIGT3), Cemig (SA:CMIG4) e EDP (SA:ENBR3) Brasil devem ver as maiores retrações de Ebitda devido à pandemia em 2020, na casa de 12%, apontou a Fitch na apresentação.
Já Enel (MI:ENEI) e Energisa (SA:ENGI4) devem ter redução de 10,2%, enquanto Copel (SA:CPLE6) e Celesc (SA:CLSC4) seriam as menos impactadas, com recuos de 7,1% e 5,6%.
Em 2021, CPFL (SA:CPFE3) e Equatorial (SA:EQTL3) sofreriam os efeitos mais significativos, mas com redução menor da geração de caixa, da ordem de 8%.
A Fitch apontou ainda que Energisa e Light devem sofrer a maior pressão sobre o nível de alavancagem em 2020 e 2021, o que pode pressionar os ratings das empresas, já revisados de "estável" para "negativo" depois da pandemia.
"No momento, os 'ratings' mais pressionados de nossa carteira são Energisa e Light... a EDP também estaria com rating pressionado... diria que, em um cenário estressado, esses três ratings devem ser os mais pressionados", apontou Storino, ao responder pergunta de um analista.
REEQUILÍBRIO
Segundo a análise da Fitch, uma eventual decisão da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) de avaliar um reequilíbrio dos contratos das distribuidoras, que poderia implicar em aumento de tarifas, poderia evitar bilhões em perdas adicionais para as empresas.
As distribuidoras de energia pediram à agência que antecipasse essa análise, que leva em conta efeitos de médio prazo da pandemia sobre as empresas, ou permitisse a elas contabilizar em balanço ativos regulatórios referentes a direitos de revisão tarifária futura, mas o pleito foi negado.
O reequilíbrio evitaria "perda adicional de 9,7 bilhões de reais no Ebitda até 2021" para as elétricas, projetou a Fitch.