Por Aluisio Alves
SÃO PAULO (Reuters) - As consultas por financiamentos para compra da casa própria vêm crescendo a reboque dos sinais de melhora da economia, mas a Caixa Econômica Federal já não é um endereço óbvio para buscar empréstimos.
Com a instituição adotando sucessivos apertos nos critérios para enquadramento e se recusando por enquanto a repassar cortes da Selic, a procura por crédito imobiliário tem se espraiado para rivais, movimento que deve ganhar força nos próximos trimestres.
"Estamos encaminhando clientes para outros bancos, porque na Caixa os recursos secaram", disse a consultora imobiliária Daniele Akamine.
Consultada, a Caixa não se pronunciou sobre o assunto.
O movimento acontece simultaneamente aos primeiros sinais de reação da demanda. Segundo a Abecip, entidade do setor, o financiamento imobiliário no país em agosto foi o maior desde 2016 na base sequencial.
Executivos de banco atribuem a maior parte desse movimento à volta de potenciais tomadores, por estarem menos temerosos de perder o emprego, diante dos sinais do fim da recessão. Mas calculam que também estão atendendo de 30 a 40 por cento dos interessados que não conseguem empréstimo imobiliário na Caixa.
Um percentual maior é limitado pelo uso de critérios de aprovação em geral mais rigorosos e pela cobrança de taxas de juros mais elevadas no que na Caixa, que por ser líder na captação de poupança, tem maior fatia de recursos baratos.
Os bancos têm lançado mão de diversas facilidades para tentar aumentar esse aproveitamento. Na média, Itaú Unibanco (SA:ITUB4), Banco do Brasil (SA:BBAS3), Bradesco (SA:BBDC4) Santander Brasil (SA:SANB11) registraram um volume de 30 a 50 por cento maior de simulações de crédito habitacional no mês passado em relação a janeiro.
O Santander Brasil, que em julho ofertou taxa de juro a partir de 9,49 por cento, inicialmente por um período de 60 dias, decidiu estender a campanha até dezembro. "Percebemos que o momento está positivo", disse Fabrizio Ianelli, superintendente de crédito imobiliário no Santander Brasil.
Na verdade, desde que a Selic caiu para um dígito, todos os bancos vêm ofertando financiamento para compra da casa própria com taxas a partir de um dígito. Se a previsão do mercado de que a taxa básica caiará para a faixa de 7 por cento nos próximos meses, na prática o custo para os bancos captarem recursos no mercado ficará muito próximo do oferecido pela poupança, de 6 por cento mais TR.
Mesmo assim, para operações com prazos de 20, 30 anos, casas decimais de diferença na taxa oferecida pelos bancos são o suficiente para que uma prestação não caiba no orçamento de um candidato, que consequentemente tem a proposta recusada.
Para tentar resgatar parte desse público, alguns bancos têm elevado o montante financiável. No Itaú, o teto passou de 75 para 80 por cento. "Estamos conseguindo trazer mais gente pra dentro", disse Cristiane Magalhães, diretora de credito imobiliário do banco. "As pessoas não estão mais indo automaticamente para a Caixa."
Em outra frente, os bancos vem multiplicando facilidades para tentar agilizar o processo de aprovação que, pela demora e complexidade, acaba desanimando potenciais mutuários. Uma iniciativa nessa frente tem sido o uso crescente de canais digitais para envio de documentos.
Segundo o diretor crédito imobiliário do BB, Edson Cardoso, a redução do tempo médio de aprovação de propostas no banco caiu de 55 para 20 dias do começo do ano para cá, e isso é um dos fatores que tem ajudado o banco a elevar as concessões.
"Nosso volume liberação para crédito imobiliário em agosto foi 50 por cento maior do que em março", disse.
DESCONCENTRAÇÃO?
Líder do mercado com cerca de 70 por cento do financiamento imobiliário do país, a Caixa tem sofrido com uma combinação de fatores, incluindo escassez do FGTS. O banco estatal vem tomando uma série de medidas para tentar elevar sua rentabilidade e abastecer seus níveis de capital organicamente, já que não pode mais contar com injeções bilionárias do controlador, o governo federal, que vive crise fiscal.
Com a demora na obtenção de recursos devido à lentidão na venda de ativos como a fatia na Caixa Seguridade e o controle do braço de loterias Lotex, restou ao banco medidas como cortar o repasse de dividendos ao governo, aumentar a arrecadação com aumento das tarifas bancárias e a prática de taxas de juros mais elevadas para obter maiores margens.
Em setembro, a Caixa reduziu pela segunda vez o teto para empréstimos para imóveis usados, para no máximo metade do valor, e desistiu de assumir financiamento de outros bancos. Em julho, o banco já tinha avisado que só voltará a operar com a linha pró-cotista, a mais barata do mercado, em 2018.
Na prática, isso cortou praticamente à metade o volume mensal de desembolsos do banco, segundo intermediários do mercado imobiliário.
A Caixa é apontada por agências de classificação de risco como Fitch e Moody's como o banco mais atrasado nos preparativos para atender a regras de capital mais rigorosas contidas em Basileia III, que entra em vigor integralmente no Brasil em 2019.
Com isso, a expectativa de analistas é de que o banco tenha que desacelerar ainda mais as operações de crédito nos próximos anos, sob risco de não ter condições de ter capital suficiente para atender às exigências de capital maiores para crédito. Para evitar uma capitalização do governo, a saída é puxar o freio.
"Pelas regras atuais a Caixa ficaria bem, mas com Basileia III crescem as chances de o banco ter que receber uma capitalização", disse o chefe de instituições financeiras da agência Fitch para América Latina, Alejandro Garcia, em entrevista recente à Reuters.
Diante desse quadro, a avaliação de executivos dos demais bancos é de que eles vão gradualmente ganhar participação de mercado no financiamento imobiliário nos próximos anos, enquanto a Caixa deve se concentrar mais nos empréstimos para imóveis envolvidos em programas sociais, como o Minha Casa Minha Vida.