Investing.com – Após as notícias de que o grupo NC Farma, dono da farmacêutica EMS, propôs a união dos negócios com a também farmacêutica Hypera (BVMF:HYPE3), analistas entendem que um movimento do tipo reflete o cenário atual do setor de saúde e são diversas as frentes em sinergias que podem ser conquistadas. Uma eventual transação ainda precisaria ser aprovada pelo Conselho de Administração da empresa.
A proposta visa a aquisição de 20% das ações da Hypera ao preço de R$30 cada. Nesta terça, as ações estavam em alta de 6% às 15h58 (de Brasília), cotadas a R$27,84.
Em uma reviravolta, a ação subiu ontem após a notícia, depois de ter iniciado o pregão em forte queda, repercutindo resultados prévios negativos do trimestre, descontinuação do guidance e anúncio de medidas de otimização de capital.
Se a união das companhias ocorrer de fato, a medida poderia criar uma empresa líder no segmento na América Latina. Hoje, a EMS lidera o setor farmacêutico do país, atuando em medicamentos genéricos, de marca, sob prescrição e produtos de venda livre.
A empresa reportou receita de R$7,9 bilhões em 2023, com destaque para o segmento de genéricos e similares, além de medicamentosa de marca e prescrição. Ao todo, são produzidos mais de 82 milhões de comprimidos por mês, mas a capacidade instalada chega a 100 milhões.
A EMS entende que a união traria ganhos operacionais, financeiros e tributários para ambas as empresas, o que pode alavancar os resultados.
As eficiências poderiam garantir um “crescimento sustentável no longo prazo e um aumento no retorno para os acionistas através da distribuição de dividendos”, conforme proposta da EMS, divulgada em fato relevante.
Fusão pode beneficiar a empresa em quais frentes?
Investidores estarão atentos a possíveis sinergias e ganhos de otimização com um possível acordo, além da repercussão no órgão antitruste. No entanto, os valores potenciais de sinergias não foram apresentados pelas empresas. A estrutura de capital pode ser otimizada, com melhor aproveitamento de benefícios fiscais, vendas combinadas, diminuição de despesas diante da maior escala, ganhos em poder de negociação, potencial eliminação de projetos redundantes, além de um perfil de endividamento menor, que poderia melhorar a percepção de risco para crédito da nova empresa.
“Embora não tenhamos qualquer opinião sobre o potencial decisão antitruste, vemos os portfólios de medicamentos das empresas como amplamente complementares, sem aparente sobreposição em termos de categorias amplas”, destacou o Goldman Sachs (NYSE:GS).
O banco Goldman Sachs calcula que o valuation da estrutura da transação implica 11,5x EV/EBITDA para a Hypera, igual à avaliação da própria EMS, esta tendo crescido a um ritmo operacional sólido e com rentabilidade saudável nos últimos anos.
A transação seria de “negócios complementares com sinergias muito prováveis”, segundo o Itaú BBA, que acha que o acordo faz sentido do ponto de vista operacional. A fusão das companhias “poderá criar um player líder no segmento farmacêutico com oportunidades de sinergia que podem melhorar a rentabilidade da empresa combinada, o poder de negociação com fornecedores e clientes e o posicionamento estratégico”.
No entanto, como uma possível fusão já foi avaliada no passado, quando o valuation da Hypera era mais favorável, o Itaú BBA entende “que não é óbvio que a oferta pública seja aceita por R$ 30/ação”.
A possibilidade de criar uma companhia que seria um líder isolado no mercado de OTC e genéricos traria sinergias comerciais, de custos e despesas, e otimização da estrutura de capital e alavancagem, pontua Harold Takahashi, sócio da boutique de M&As Fortezza Partners.
“A indústria farmacêutica envolve altos tickets, o que serve como barreira de entrada para novos competidores, estimulando o crescimento orgânico das empresas com P&D proprietários ou transações de compra de marcas e patentes, como foi a prevalência de deals feitos pela própria Hypera”, afirma Takahashi, apontando ainda que anúncio de um M&A desta magnitude pode “estimular uma mudança no status quo do setor e incentivar transações que antes eram apenas ideias”
Transação reflete setor pressionado
O movimento reflete o cenário atual do setor de saúde e seria natural que houvesse movimentos de consolidação como estes, na opinião de João Daronco, analista da Suno Research.
“O mercado segue bastante machucado pela pressão nas margens das operadoras, o que prejudicou o setor como um todo. Temos visto uma retomada, mas ainda bastante tímida”, lamenta Daronco. Outras empresas já avaliaram uma possível fusão com a empresa no passado, mas a proposta foi apresentada logo após uma descontinuação do seu guidance, o que refletiria o atual momento, completa o analista.
A possível transação é uma continuidade do que o mercado percebe no setor como um todo, concorda Takahashi. “A depreciação dos preços em bolsa por um longo período permite transações que antes não eram possíveis. Embora os preços de tela não sejam os únicos direcionadores dos preços das transações, eles influenciam as negociações de M&A, especialmente nas que envolvem trocas de ações ou ações dadas como forma de pagamento”, reforça Takahashi.
Ele menciona como exemplos a fusão entre Hapvida (BVMF:HAPV3) e GNDI, a compra da Sulamérica pela Rede D'Or São Luiz (BVMF:RDOR3) e a compra do Pardini pelo Grupo Fleury (BVMF:FLRY3). Para o especialista, estas transações provavelmente não teriam ocorrido em 2019, quando as companhias tinham valuation mais elevado.
Próximos passos - e entraves - para possível fusão
A EMS propôs uma oferta pública para aquisição (OPA) de até 20% das ações, sendo que esta poderá ser lançada antes da aprovação final do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), lembra o Goldman.
“Os possíveis próximos passos do acordo incluem a assinatura de termos confidenciais por ambas as partes, bem como a EMS pretende confirmar a proposta no prazo máximo de 30 dias, seguindo os termos propostos”, detalha o banco.
O acordo pode enfrentar uma série de obstáculos até sua conclusão, pondera Takahashi. “A estratégia de fazer uma oferta não solicitada pode tanto trazer as partes à mesa de negociação quanto atrair outros compradores para o alvo. Pelo histórico do acionista de referência, Júnior, a questão de governança e a posição como minoritário na empresa resultante, serão, provavelmente, os maiores entraves”.