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Investigação aponta liquefação como causa de desastre da Samarco e não indica culpados

Publicado 29.08.2016, 22:37
© Reuters. Distrito de Bento Rodrigues, atingido por deslizamento em Mariana
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Por Marta Nogueira

NOVA LIMA, Minas Gerais (Reuters) - Investigação contratada pela Samarco e por suas controladoras, Vale (SA:VALE5) e BHP Billiton, sobre o rompimento da barragem de Fundão, confirmou nesta segunda-feira teses já publicadas por autoridades e apontou como causa a perda de estabilidade na fundação de rejeitos, em um processo conhecido como liquefação.

Relatório publicado pela Cleary Gottlieb Steen & Hamilton LLP, que realizou investigação, afirmou que a liquefação foi consequência de uma cadeia de eventos e condições, incluindo alterações feitas no projeto em anos anteriores ao rompimento.

A investigação, entretanto, não apontou culpados para aquele que é considerado o pior desastre ambiental da história do Brasil. Com o estouro da barragem, uma onda de lama matou 19 pessoas e deixou centenas de desabrigados, além de ter poluído o rio Doce, que deságua no mar, no final do ano passado.

Por meio de uma vídeo conferência, Norbert Morgenstern, chairman do painel de especialistas da Cleary Gottlieb Steen & Hamilton LLP, explicou a jornalistas que foi depositada lama em áreas não previstas na chamada ombreira esquerda da barragem e que também foi feito um recuo do eixo da ombreira no mesmo local.

Dessa forma, de acordo com a investigação, havia lama abaixo do maciço que passou por processos de alteamento, quando as paredes da estrutura são aumentadas para receber mais rejeitos.

"O papel da lama contribuiu para ser um gatilho do rompimento da ombreira esquerda", afirmou Morgenstern.

A investigação também apontou que tremores de terra ocorreram antes do rompimento da barragem.

"Com apenas um pequeno incremento adicional de carga produzido pelos abalos sísmicos, o gatilho da liquefação foi acelerado e iniciou o fluxo de rejeitos", apontou o resumo executivo da investigação.

"TESE DE DEFESA"

A divulgação feita nesta segunda-feira em Nova Lima, região metropolitana de Belo Horizonte, levantou críticas do promotor de Justiça do Ministério Público de Minas Gerais Carlos Eduardo Pinto, para quem a conclusão da investigação foi uma tese de defesa.

Pinto assistiu à apresentação das empresas em um link disponibilizado na internet. Em uma primeira análise, visto que a conclusão da investigação foi publicada na tarde desta segunda, ele afirmou que "não foi possível atestar qualquer afirmação adicional que retire as conclusões da polícia", que apontou que a Samarco ignorou sinais claros de risco de rompimento da barragem.

"Isso deve ser levado em conta como tese de defesa... eles apresentaram algumas conclusões que as autoridades já tinham chegado, mas tentaram minimizar de alguma forma", disse Pinto à Reuters, em uma entrevista por telefone.

O promotor argumentou que as empresas precisavam entregar uma investigação própria e o fizeram no mesmo dia do depoimento da presidente afastada Dilma Rousseff no Senado, e com executivos das três companhias se esquivando de perguntas.

Além disso, ressaltou o promotor, Morgenstern, da Cleary, participou do evento falando de Toronto (Canadá), e respondeu perguntas de jornalistas de forma curta e objetiva, recomendando sempre a leitura aprofundada do relatório.

O presidente da Vale, Murilo Ferreira, o presidente da Samarco, Roberto Carvalho, e o diretor comercial da BHP Billiton, Dean Dalla Valle, presentes no evento, lamentaram mais uma vez o desastre e suas consequências e saíram sem responder perguntas.

"A Samarco durante muito tempo alegou que processava boas práticas e o relatório não trouxe demonstrações de boas práticas, pelo contrário, traz alterações do projeto, que não seriam permitidas", frisou.

Os três executivos destacaram que a investigação mostra transparência e contribui para evitar novos desastres. Entretanto, nem a investigação nem os executivos apontaram ações que poderiam ter sido realizadas para evitar a tragédia.

LAUDOS TÉCNICOS

Ainda que não tenha apontado culpados, a investigação indicou que diversos acontecimentos não planejados, durante a construção e a operação da barragem, influenciaram a forma como os rejeitos foram depostos no local e contribuíram com o desastre.

Um primeiro incidente ocorreu em 2009, segundo o resumo executivo da investigação, devido a defeitos de construção no dreno de fundo. "A barragem foi tão danificada que o conceito original não poderia mais ser implementado", afirmou.

No projeto revisado, em 2010, segundo a Cleary, houve uma mudança fundamental no conceito, que introduziu um potencial de liquefação. Já em 2011 e 2012, enquanto o novo projeto estava sendo construído, alguns critérios não foram observados, permitindo o recalque de lama onde não estava previsto.

Outro incidente, segundo a investigação, aconteceu em 2012, quando uma galeria de concreto sob a ombreira esquerda da barragem "foi considerada estruturalmente deficiente e incapaz de suportar mais carga".

Dessa forma, a barragem não poderia ser mais alteada por cima dela, até que a galeria fosse preenchida com concreto e desativada.

© Reuters. Distrito de Bento Rodrigues, atingido por deslizamento em Mariana

"Para manter as operações, naquele período, o alinhamento da barragem na ombreira esquerda foi deslocado da sua posição anterior. Isso colocou o maciço diretamente em cima das lamas depositadas anteriormente", disse a Cleary, explicando que a partir daí estavam criadas todas as condições para a liquefação.

(Por Marta Nogueira; com reportagem adicional de Stephen Eisenhammer, no Rio de Janeiro)

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