Desincentivo
Temos nesta terça-feira mais alguns desincentivos à compra de ações brasileiras. O contexto atual por si só é um desincentivo, não faltaram alertas - aos que tiveram oportunidade de ler, a Carta do Verde está, como sempre, interessantíssima este mês.
Temos uma situação que combina completa indefinição dos quadros econômicos, com o maior juro real do mundo (convite à renda fixa) e um Ibovespa caro a 52 mil pontos, que reflete uma esperança de mudança na condução das políticas sem que haja qualquer indicativo firme neste sentido; pelo contrário.
Os alertas se multiplicam. Hoje o banco de investimentos BTG Pactual rebaixou a sua recomendação aos ativos brasileiros.
Agravante: estamos na iminência de alta dos juros lá fora (chamando o gringo de volta para lá), com chances reais de rebaixamento adicional da classificação de risco brasileira e com commodities muito mais baratas - o que, se não atrapalha tanto assim, está longe de ajudar.
Não bastasse...
A triste realidade da Bolsa brasileira por setores
É claro que há algumas exceções à regra, mas, grosso modo, é este o retrato da Bolsa brasileira por setores:
Siderurgia e mineração: fadadas à inversão de ciclo das commodities metálicas e incertezas chinesas - aliás, nunca se sabe nada de commodities, pois é impossível, a rigor, entender qual é o momento do ciclo; o barato vira caro rapidinho com uma queda de 30% da matéria-prima subjacente.
Petróleo: praticamente inexiste na Bolsa brasileira, à exceção de Petrobras, que nem sequer é uma empresa stricto sensu (ingerência política e escândalos de corrupção).
Setores regulados (elétrico, saneamento, concessões): regulação hoje é sinônimo de risco e de black swan à espreita.
Agrícola: segue uma lógica perversa, em que uma empresa pode fazer tudo certo e colher os resultados errados - é case de commodity com risco de black swan também.
Telecom: governança problemática e histórico de desrespeito dos minoritários - não compro quase por hipótese.
Aviação: completamente refém de variáveis que fogem ao controle da empresa, como volatilidade do câmbio e do preço dos combustíveis. Não compro certamente por hipótese.
Frigoríficos: histórico de aquisições desenfreadas e alavancagem excessiva. E risco de black swan fitossanitário.
Indústria: em meio ao maior processo de desindustrialização da história brasileira?
Imobiliário: no cerne da desaceleração de lançamentos e problemas internos de balanço das empresas
Tecnologia: salvas raríssimas exceções de ações com restrição de liquidez, praticamente inexiste na Bolsa tupiniquim Consumo e seus 25x lucros, com juros para cima e prognóstico de deterioração da renda agregada.
As 4 alternativas que lhe restam
Raríssimas exceções dentro dos setores expostos acima.
Educação, desde que você esteja disposto a pagar 30x o lucro da empresa por uma ação (caríssimo).
Bancos em um ambiente de elevação de juros.
Consumo premium, defensivo e não dependente do crédito.
A última alternativa é obviamente melhor, mas consumo não dependente de crédito ainda pode dar um caldo.
Vai ficar mais caro
A BM&F Bovespa anunciou dois ajustes na política de tarifação. Em termos financeiros, eles exercem pouco impacto imediato, embora possam influenciar mais à frente. De toda forma, servem para dar alguns recados importantes ao mercado.
Primeiro ajuste: adoção de uma taxa de transferência de custódia de 0,0067%. Não muda nada para os negócios realizados dentro da BM&F Bovespa, pois esse custo já está implícito na taxa de liquidação. Mas é novidade para as operações realizadas fora do ambiente da Bolsa (já pensando em concorrência para a depositária).
No segundo ajuste, quaisquer contas "ativas" sem movimento nos últimos 24 meses passarão a ser cobradas ao valor de R$ 6 ao mês. Contas com menos de R$ 5.000 investidos pagarão R$ 6,90/mês, e com mais de R$ 5.000 investidos pagarão R$ 7,30 ao mês. Gringos terão tratamento diferenciado, ao custo de R$ 50/mês a partir de abril/2015 e de R$ 100/mês a partir de jan/2016. Por fim, haverá uma taxa de manutenção de R$ 2.000 para os programas de Depositary Receipt.
Naquele que talvez seja o resumo mais importante da história, a partir de jan/2015, todos os serviços da depositária serão reajustados anualmente pelo IPCA.
Um incentivo para o investidor girar (ao menos vez ou outra) a sua carteira. Ainda que isso não seja necessariamente um incentivo para se investir em ações.
Agora, para o investidor de BVMF3, é bom para lembrar que os resultados da empresa vão potencialmente além dos volumes de cada dia.
Imóveis: "Ninguém está vendendo nada"
Cerca de dois anos atrás um amigo resolveu comprar um apartamento na planta. Fez um pouco de conta e achou que aguentaria as parcelas mensais e semestrais com suas aplicações mais o salário. E foi em frente. Sempre me ligava todo empolgado com a valorização do imóvel. Confesso que ficava um pouco confuso porque não entendia a animação se ele pretendia usar aquele imóvel para moradia. Mas conforme o preço foi aumentando, a estratégia do meu amigo mudou. Agora ele iria vender quando ficasse pronto.
Depois de dois anos infelizmente aconteceu...
Recomendo fortememente que o leitor do M5M acesse o texto do Márcio Fenelon sobre a realidade atual do mercado de imóveis. Está aqui,
Conheci o Márcio em visita à JHSF, empresa à qual ele era responsável pela área de Relações com Investidores. É um cara que conhece o setor imobiliário como poucos.
Em poucas palavras ele conseguiu resumir questões como a saída do aluguel, o tal bônus demográfico que vem estimulando a oferta de imóveis, o dilema do financiamento bancário e a atuação dos “flippers”, pessoa (muitas vezes corretor imobiliário) que compra imóveis geralmente no lançamento para vendê-los com lucro na entrega ou perto dela.
Aposto que de alguma forma esse texto vai te afetar.