As companhias do Novo Mercado são o que dizem ser?

Publicado 23.07.2025, 10:30

A B3 (BVMF:B3SA3) vinha conduzindo um processo de aprimoramento das regras do Novo Mercado — segmento da Bolsa de Valores de São Paulo voltado a companhias que se comprometem com elevados padrões de governança corporativa. A proposta apresentada ao mercado contemplava 25 itens distribuídos em três frentes: o Regulamento-Base, o Bloco A ("Novo Mercado Alerta") e o Bloco B ("Confiabilidade das Demonstrações Contábeis").

Surpreendentemente, a proposta foi rejeitada pelas companhias listadas no segmento, apesar de boa parte das medidas já constarem nos relatórios de sustentabilidade de muitas dessas empresas e de já serem obrigatórias em mercados mais maduros, como o da União Europeia. A adoção dessas práticas, portanto, seria não apenas coerente, mas um passo natural para quem de fato almeja a sustentabilidade corporativa.

A decisão causou frustração em entidades de referência. Em nota pública divulgada no início de julho, o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) lamentou a rejeição, afirmando que "perdeu-se uma oportunidade ímpar de fortalecer o principal segmento de listagem, historicamente associado à evolução das boas práticas de governança no Brasil, ao aumento da atratividade do mercado de capitais e à consequente diversificação de fontes de financiamento das empresas.

Historicamente, o Novo Mercado conferia um selo de qualidade às companhias que o integravam — um diferencial reputacional que sinalizava boa gestão financeira, compromisso com a transparência e responsabilidade ambiental e social. Esse prestígio, no entanto, foi abalado por escândalos recentes, como o da Americanas (BVMF:AMER3), que expôs falhas estruturais graves. A proposta de um regramento mais robusto visava justamente restaurar essa credibilidade perdida.

Entre os argumentos contrários, o mais recorrente foi o do suposto aumento de custos decorrente da adoção das novas regras. Mas classificar boas práticas como despesas é, no mínimo, um contrassenso. Governança, transparência e sustentabilidade não são custos: são investimentos em reputação, longevidade e acesso a capital. Além disso, adequar-se às novas exigências alinharia essas companhias aos critérios de mercados internacionais mais exigentes, como o europeu, ampliando sua competitividade global.

Ainda assim, a resistência prevaleceu. E por quê? Talvez porque, apesar das melhorias, a proposta ainda apresentasse falhas. Mas o ESG é um processo em constante construção, e sua evolução exige ajustes contínuos. O importante é o compromisso genuíno com o aprimoramento, sobretudo quando o processo foi transparente e amplamente discutido com o mercado.

A recusa em avançar levanta questionamentos incômodos. Após o caso Americanas, parte da confiança no Novo Mercado foi corroída. Agora, com empresas rejeitando publicamente normas mais rigorosas, as dúvidas se aprofundam: quantas das ações relatadas nos relatórios de sustentabilidade são, de fato, reais? Quantas são puro greenwashing? Existem outras demonstrações contábeis com distorções ocultas? O compromisso com o ESG é autêntico  ou apenas retórico?

No fim das contas, a proposta da B3 representava uma chance concreta de fortalecer o arcabouço institucional do mercado brasileiro. Sua rejeição não apenas desperdiça uma oportunidade histórica, como também acende um alerta: o Novo Mercado ainda é, de fato, novo? Ou já começou a envelhecer mal?

Só o tempo e o comportamento das empresas poderão responder.

Últimos comentários

Instale nossos aplicativos
Divulgação de riscos: Negociar instrumentos financeiros e/ou criptomoedas envolve riscos elevados, inclusive o risco de perder parte ou todo o valor do investimento, e pode não ser algo indicado e apropriado a todos os investidores. Os preços das criptomoedas são extremamente voláteis e podem ser afetados por fatores externos, como eventos financeiros, regulatórios ou políticos. Negociar com margem aumenta os riscos financeiros.
Antes de decidir operar e negociar instrumentos financeiros ou criptomoedas, você deve se informar completamente sobre os riscos e custos associados a operações e negociações nos mercados financeiros, considerar cuidadosamente seus objetivos de investimento, nível de experiência e apetite de risco; além disso, recomenda-se procurar orientação e conselhos profissionais quando necessário.
A Fusion Media gostaria de lembrar que os dados contidos nesse site não são necessariamente precisos ou atualizados em tempo real. Os dados e preços disponíveis no site não são necessariamente fornecidos por qualquer mercado ou bolsa de valores, mas sim por market makers e, por isso, os preços podem não ser exatos e podem diferir dos preços reais em qualquer mercado, o que significa que são inapropriados para fins de uso em negociações e operações financeiras. A Fusion Media e quaisquer outros colaboradores/partes fornecedoras de conteúdo não são responsáveis por quaisquer perdas e danos financeiros ou em negociações sofridas como resultado da utilização das informações contidas nesse site.
É proibido utilizar, armazenar, reproduzir, exibir, modificar, transmitir ou distribuir os dados contidos nesse site sem permissão explícita prévia por escrito da Fusion Media e/ou de colaboradores/partes fornecedoras de conteúdo. Todos os direitos de propriedade intelectual são reservados aos colaboradores/partes fornecedoras de conteúdo e/ou bolsas de valores que fornecem os dados contidos nesse site.
A Fusion Media pode ser compensada pelos anunciantes que aparecem no site com base na interação dos usuários do site com os anúncios publicitários ou entidades anunciantes.
A versão em inglês deste acordo é a versão principal, a qual prevalece sempre que houver alguma discrepância entre a versão em inglês e a versão em português.
© 2007-2025 - Fusion Media Limited. Todos os direitos reservados.