Quando a crise sanitária começou, em 2020, a sociedade foi pega de surpresa. Governos e empresas não sabiam como agir e o sentimento que prevalecia, em um primeiro momento, era o de perplexidade. No decorrer dos meses, porém, esses mesmos agentes se deram conta da necessidade global de ajustes na gestão das pessoas, do meio ambiente e nos controles empresariais, privados e públicos. Momento em que o conceito ASG (Ambiental, Social e Governança), que até então era visto como um tema abstrato para muitas corporações passou a ser debatido com mais atenção e seriedade.
Podemos dizer que 2021 foi relevante no sentido de que as práticas ASG começaram a passar por um processo de amadurecimento. Até porque a pandemia, que no final do ano anterior parecia estar chegando ao fim, voltou com força em março, atingido picos desesperadores nos números de contaminação e de mortes. Ou seja, ficou evidente que não é mais possível ignorar que o mundo precisa urgentemente adotar processos produtivos verdadeiramente sustentáveis.
Tal preocupação se converteu em ações para instruir empresários e a sociedade como um todo sobre o que é, de fato, o conceito ASG. Diversas corporações realizaram workshops, simpósios e outros eventos para divulgar e mostrar a importância dessa sigla para a humanidade. A Conferência do Clima da ONU (COP26) atraiu cerca de 30 companhias brasileiras ao evento para discussões ambientais, sociais e de governança. Ainda é pouco, mas o número é recorde.
Vale ressaltar que no Brasil e no mundo trabalhos estão sendo desenvolvidos para a definição de um padrão - não diria único, pois há diferenças nos ambientes de negócios e nas necessidades ambientais e sociais de cada país -, que permita avaliar com maior grau de acerto o nível de engajamento de empresas e países na aplicação de práticas ASG.
Recentemente, o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) anunciou por meio de seu blog que uma aliança global entre instituições financeiras internacionais, investidores e empresas líderes em sustentabilidade lançou uma plataforma, batizada de ESG Book, de informações de sustentabilidade corporativa que conecta investidores com empresas, fornecendo dados ASG, de forma transparente, disponível e comparável.
De acordo com a B3 (SA:B3SA3), as corporações brasileiras estão respondendo cada vez mais a essa tendência, olhando para seus impactos dentro e fora da organização. Além disso, existem fundos que investem apenas em empresas que tenham uma agenda ASG e práticas estruturadas com esse foco. Movimento esse que também se reflete no mercado de inovação e empreendedorismo. Um mapeamento realizado pelo Distrito mostra que o Brasil conta hoje com 882 startups com soluções em ASG, que já receberam volume de US$ 612,5 milhões em investimentos ao longo de 2021, com o foco voltado à categoria Ambiental liderando os aportes.
Segundo pesquisa realizada em novembro pela consultoria Betania Tanure Associados com 280 das 500 maiores empresas do país, 84% dizem adotar ações que contribuem para a preservação ambiental e 83% afirmam mitigar os impactos ambientais de sua atuação. Já o uso de tecnologias limpas e de recursos renováveis seria a estratégia adotada por 72% das companhias pesquisadas.
Os percentuais são até interessantes. Mas apesar da maior repercussão que o tema ganhou em 2021, ainda há muito a ser feito. A mesma pesquisa mostra que 62% das empresas dizem sofrer pressão do mercado por práticas ASG. Percentual considerado pequeno pelos analistas da consultoria, considerando o impacto que essas companhias geram no meio ambiente e na sociedade.
Do total pesquisado, 22% afirmaram não se sentirem pressionadas. E outro dado ainda preocupante é a percepção dessas corporações com relação à política ambiental do governo federal. 74% não acreditam que o governo brasileiro possua diretrizes eficazes para combater o desmatamento e 62% não acham que as mudanças climáticas sejam prioridade para a política brasileira.
Ora, são apenas alguns números para ilustrar a situação de momento. Como se vê há muito a ser feito. E a possibilidade da chegada de mais uma onda de contaminação pela nova variante ômicron fará com que a consciência sobre a necessidade e urgência da adoção das práticas ASG se mantenha fresca na memória do empresariado.
E 2022 terá início com a expectativa de que será um ano de muitos desafios. Eleições polarizadas, risco fiscal alto, desemprego em alta, aumento do número de pessoas em situação de extrema pobreza, crise hídrica e energética, continuidade da pandemia. Observem como a pauta ASG estará presente mais do que nunca.
É um contexto que exige bastante reflexão por parte de executivos e investidores em suas estratégias de negócios e investimentos. Mais do que nunca é a hora de investir em governança corporativa e em mitigar os problemas sociais e ambientais que, se não forem resolvidos, culminarão em novas crises, cada vez mais graves e avassaladoras.
Sendo assim, não dá pra imaginar o próximo ano sem que o tema ganhe mais relevância ainda. De acordo com a Climate Bonds Iniciative, os fundos verdes em todo o mundo alcançaram a marca dos US$ 400 bilhões neste ano, quase o dobro do recorde registrado em 2020, de US$ 270 bilhões. Segundo os dados, cerca de US$ 54 bilhões foram investidos em fundos ASG. Eles estão em alta e devem seguir essa tendência nos próximos 12 meses.
Além de maior penetração no meio corporativo, o tema começa a fazer parte das preocupações também dos municípios brasileiros. Afinal, agentes públicos e privados devem combater os efeitos do aquecimento global, do empobrecimento das pessoas, da inclusão de minorias, pois o que se espera é um mundo feito pra todos. Mesmo o consumidor tem mudado sua visão. As novas gerações se mostram mais dispostas a escolher produtos de empresas que se preocupam com impacto social e ambiental em vez de produtos de empresas que não possuem este direcionamento.
Se olharmos com atenção, 2021 foi um ano de evolução do conceito ASG no mundo. Neste contexto, o Brasil, mesmo com um pouco de atraso, não está fora deste processo. O ano que vem, sem sombra de dúvida será o da continuidade e amadurecimento dessa prática. Afinal, mais informações e novas ferramentas facilitarão o acesso do conjunto da sociedade a essa prática de sustentabilidade que veio para ficar.